Bagão Félix. “Governo de gestão não implica 2.º resgate no curto prazo”

Bagão Félix. “Governo de gestão não implica 2.º resgate no curto prazo”


Conselheiro de Estado explica que a situação tem de ser percepcionada pelos investidores como “temporária”.


Bagão Félix acredita que um governo de gestão até Abril não colocará o país numa situação de fragilidade tal que empurre Portugal para um novo resgate. Em declarações ao i, o conselheiro de Estado admite que “se a situação for entendida como transitória” pelos mercados e pelos investidores, o facto de um governo estar sem um Orçamento aprovado e a governar em duodécimos (em regime provisório) não irá atirar o país para a bancarrota nem fazer disparar os juros da dívida pública. 

O ex-ministro da Segurança Social e do Trabalho de Durão Barroso, e das Finanças no governo de Santana Lopes, lembra que Maria Luís Albuquerque, ministra das Finanças, garantiu que Portugal tem uma almofada financeira (15 milhões de euros)para fazer face a qualquer evolução negativa nos mercados. A garantia foi dada quando os juros da dívida subiram em força em Maio, na sequência da incerteza e do risco de incumprimentos da Grécia. 

Além disso, sublinha Bagão Félix, a política de incentivos do Banco Central Europeu, que veio permitir o alívio das taxas de juro associadas às obrigações dos países periféricos, “é uma aliada que antes não havia [antes das crises da dívidas soberanas], na medida em que o BCEaguenta o preço do dinheiro, por assim dizer”, clarifica o ex-ministro. 

Segundo avançou ontem o i, Cavaco Silva dará posse a Passos Coelho e manterá o líder do PSD à frente do Executivo, mesmo que o seu programa de governo seja rejeitado pela esquerda parlamentar que somou a maioria de mandatos nas legislativas de dia 4. Isto, independentemente de António Costa apresentar uma solução de governo “estável e consistente”, como pediu o Presidente da República. Bagão Félix lembra que esta é sempre uma decisão que cabe exclusivamente ao Presidente, que é quem deve avaliar as condições de cada partido para formar governo, mas não deixa de sublinhar que a solução “governo de gestão” gera sempre desconfiança nos mercados e pode afastar, mesmo que temporariamente, os investidores, já que há falta de confiança para investir. 

Também na edição de ontem o “Diário de Notícias” adiantava que “Cavaco só dará posse a Costa depois de Passos cair”. O Presidente, que ainda antes das eleições admitiu já ter estudado todos os cenários, saiu a terreiro para, em comunicado, “reafirmar que as decisões que vier a tomar transmiti-las-á directamente aos portugueses ou através do chefe da sua Casa Civil”. 

Constitucionalistas ouvidos pelo i lembram o perfil “instituicionalista” e “formalista” de Cavaco. Aliás, há mesmo quem recorde que Cavaco, sensível às questões económicas, é “avesso a governos de gestão”. Mas são poucos os que acreditam que Cavaco vá nomear um governo de sua iniciativa, cujo preceito, embora menos favorável, continue previsto na Constituição. 

Ao i, Jorge Miranda é categórico. “Não acredito que o Presidente da República mantenha um governo de gestão”. O constitucionalista explica que face à queda do governo que Cavaco vier a dar posse, o Presidente tem duas hipóteses, já que está impedido de disssolver a Assembleia da República:“Ou nomeia um governo da sua iniciativa –  o que não me choca – ou repete o processo e ouve os partidos para daquele quadro parlamentar sair um novo governo”. 

Também Paulo Rangel admite a possibilidade constitucional de Cavaco nomear um governo de iniciativa presidencial. Mas o eurodeputado, também constitucionalista, lembra que Cavaco, na sua comunicação ao país depois das eleições, afastou esta possibilidade, ao afirmar que “nos termos da Constituição, o Presidente não se pode substituir aos partidos no processo de formação do Governo e eu não o farei”. Para Rangel, se o governo que for indigitado por Cavaco cair, o mais “natural” é que Cavaco convide António Costa, como líder do segundo partido mais votado, a formar governo, sobretudo se tiver o apoio do PCP e do BE.