© Jose Sena Goulao/Lusa
A política é vida. É dialéctica que cria e se transforma sobre as circunstâncias, sendo que a verdade é a mais determinante de todas elas.
Perante a pergunta de Miguel Unamuno, romancista e filósofo espanhol, se a verdade é para ser compreendida ou vivida, anos depois Ortega y Gasset, também espanhol e filósofo, respondeu: “A verdade é para ser compreendida com a vida”.
Com esta afirmação, inaugurava todo um novo sistema filosófico em que experiente era quem “pensava com os pés” ou seja, quem tinha vida habitada, alimentada pelo eu e a sua circunstância, e para quem o mundo era tudo aquilo que fazia parte da sua vida.
Ortega pretendia dizer, que para explicar era necessário entregar-se à tarefa de compreender, sem preconceitos, de forma dinâmica, vivida no real quotidiano, e assim conseguir tocar o autentico e vislumbrar a verdade.
A política, como elemento de transformação da vida e factor de dignificação humana, deve estar sujeita aos procedimentos de aferição e de exigência de qualidade que garantam a salvaguarda de direitos e garantias dos cidadãos, a liberdade, e a consolidação do regime democrático.
Articulistas, analistas, e outros tantos distintos opinadores, deveriam ter um importante papel para a compreensão, o debate, e a interpretação do fenómeno político, mas não é assim.
Sofrem do mesmo problema da agricultura nacional, excesso de nabos e falta de tomates.
Por preguiça, natural burrice, militância partidária, ou ajoelhada subserviência, persistem nos métodos e nos erros. Preferem condicionar o que escrevem e dizem á satisfação lambida do poder, de que a uma observação isenta dos factos.
Para estes fazedores de opinião com diploma, velhos como as políticas que avaliam e cúmplices da narrativa política que nos trouxe, não só ao desastre político e económico, mas também á perda de valores e de esperança, defensores das teses da impossibilidade de outras alternativas, inventores do medo e do caos, para eles o pensamento não é uma função vital, é um incómodo.
Não desejam compreender, estão demasiado convencidos e encadeados, demasiado longe das pessoas reais, preferem a fonte privilegiada, o contacto telefónico, o roçar pelas esquinas do poder, as tertúlias de todos com todos, a sensação de que são especiais, enfim uteis, e depois espantados como asnos descobrem que a realidade é outra coisa.
Os resultados das eleições legislativas derrubaram vários mitos e fizeram mais numa semana para a experiencia política dos cidadãos que décadas de política do bloco central.
O mito do voto útil como afirmação da política exclusiva a dois partidos, a morte anunciada do BE, a aldrabice do arco da governação, a mentira das eleições para primeiro-ministro quando o que de facto se elege é um parlamento, mas principalmente a destruição do mito de um PCP só como partido de protesto incapaz de assumir responsabilidades de poder, nomeadamente com o PS, ficou definitivamente destruido.
Pois a vida, a política real, veio demonstrar que estavam enganados, ou melhor, que apesar de todos os seus esforços, não é possível, durante todo o tempo, impedir que as pessoas não adquiram experiencia e tomem partido.
Em Setembro, escrevi aqui, que após as eleições e num cenário de ingovernabilidade, o PCP podia começar a delinear um ousado projecto de recomposição do cenário político nacional e em conjunto com outras forças, projectar o futuro da esquerda interessada em criar alternativas ganhadoras e alterar o quadro parlamentar limitando o habitual entendimento do PS com a direita.
Acrescentei que uma derrota da direita não significava necessariamente a vitória do PS, que a coligação poderia ganhar as eleições, e que na contabilidade final, Sampaio da Nóvoa ia ser abandonado no mato sem cachorro.
Hoje o PCP, que passou a campanha a desafiar o PS para um acordo á esquerdo e que imediatamente após os resultados afirmou que estava preparado para assumir as suas responsabilidades, conduziu a um cenário politico, de que sairá em qualquer circunstância sempre reforçado na sua coerência e credibilidade politica.
O PS tem na sua decisão, para além de uma opção governativa, também a sua própria sobrevivência política e ideológica.
No final, iremos perceber se no PS há uma esquerda histórica e natural, ou se a tendência de direita que tem o partido refém e obrigado às alianças com o PSD e o CDS, sairá uma vez mais vencedora, para tranquilidade dos que sabem estar em perigo a sua sobrevivência e sustentabilidade.
Para mim, arrisco dizer, que a pressão, uma errada avaliação do tempo histórico e os interesses, acabarão por falar mais alto e o PS acabará por ceder à direita.
Consultor de comunicação
Escreve à quintas-feira