Governo. PàF e PS em pré-ruptura

Governo. PàF e PS em pré-ruptura


PS vai pôr por escrito o que considerou pouco na proposta da coligação, mas avisa que o tempo urge e que está a trabalhar num “governo alternativo”.


A segunda reunião entre a coligação Portugal à Frente e o PS voltou a ser inconclusiva, mas a situação política ficou longe de ficar como estava. “Não avançámos rigorosamente nada”, conclui Passos Coelho. O clima é agora de pré-ruptura, com acusações de falta de vontade política de parte a parte e uma proposta da coligação que o PS considerou insuficiente. António Costa vai deixar a sua posição por escrito, e dar “mais uma oportunidade” à coligação, mas também frisa que está a trabalhar num “governo alternativo”.

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O tom do líder socialista é radicalmente diferente do que utilizou no final das rondas negociais à esquerda e onde tem preferido concentrar-se nas matérias convergentes e não na divergências. Com a coligação, António Costa assumiu que nas duas horas de reunião com a PàF, na sede do PS, teve “oportunidade de esmiuçar o documento [Facilitador de um compromisso apresentado pela PàF] e sinalizar as divergências ou enunciar 17 ou 18 medidas que, a título exemplificativo, não constavam no documento  e que o PS considera imprescindíveis”.

Aos jornalistas, Costa disse que o que fez foi uma contraproposta, mas o líder da coligação, Pedro Passos Coelho saiu com outra ideia. “Esperámos que o PS pudesse apresentar uma contraproposta, o que não aconteceu. A reunião acabou de forma absolutamente inconclusiva, sem que ficássemos com percepção do que o PS pretende”. 

Quanto ao documento apresentado há dois dias ao PS, foi Paulo Portas que o defendeu dizendo que “permitiria que  os portugueses tivessem a certeza que vão ter estabilidade política, que a credibilidade não ficaria afectada e que havia condições de recuperação da economia”. “A posição do PS é legítima, mas tem de dizer o que é suficiente”, desafiou Portas.

Pode ainda haver mais uma oportunidade para isso, já que Costa prometeu evitar um documento escrito com a resposta ao documento para que “a coligação tenha mais uma oportunidade de ponderar se está em condições de criar melhores condições de estabilidade do que as que tem hoje”. Entre as medidas que o PS quer ver inscritas num acordo com a coligação está redução das taxas moderadoras, o combate à pobreza infantil, a reposição dos salários da função pública, a redução do  IVA da restauração, as alterações aos escalões do IRS e também a educação para adultos. E desafiou a coligação, a quem pediu “humildade”: “É preciso que perceba que estamos num novo quadro parlamentar”.

Governo alternativo O socialista mantém que “não contribuirá para uma maioria negativa” e que tem dito à coligação que o PS “não é um partido de obstrução. Ninguém contará connosco para fazer oposição pela negativa sem que haja uma alternativa”. Mas é aqui que Costa acena com as negociações – que já vão mesmo em trabalho técnico – com PCP e BE. 

Ao mesmo tempo que garante que não aprovará moções de rejeição sem um “governo alternativo”, também diz que o PS tem “trabalhado para que esse governo alternativo seja possível e possa existir”. E remata a frase atirando para a coligação “o esforço que lhe cabe fazer para criar condições de governabilidade”. 

Ou seja, a  coligação não fez (ainda) cedências suficientes – “não podemos olhar para as medidas do programa do PS com um conjunto de bolas de Natal para enfeitar a árvore de Natal da coligação” – mas à espreita está uma maioria de esquerda, com António Costa a garantir que não contribuirá “para um pântano, essa não é a posição de um partido responsável como o PS”.

Já Passos desconfia da “vontade política” do PS que “até hoje pôs-se numa posição passiva” e conserva a “expectativa legítima” de ser “chamado a formar governo” pelo Presidente.

António Costa avisa que o tempo urge e que espera que a situação possa ficar clarificada esta semana já que prevê que o Presidente da República inicie os contactos formais para a formação do governo na próxima semana. Cavaco Silva só o fará depois de publicados os resultados finais das eleições legislativas, o que deverá acontecer hoje. 

Pelo meio, o líder do PS vai a Bruxelas, já amanhã, para a reunião da família socialista europeia de preparação do Conselho Europeu. Ontem, Costa começou a dar sinais além fronteiras. A um par de horas da reunião com a PàF, falou a duas agências de notícias internacionais, para  acalmar receios com um governo de esquerda, sobretudo nos mercados e entre parceiros europeus. À Reuters e à France Press, o líder socialista insistiu que “PCP e BE disseram claramente ao PS que a saída do euro e a renegociação da dívida não estão em cima da mesa das negociações”. E à agência francesa ainda acrescentou:“A Europa pode ficar descansada. O PS não é o Syriza”. 

Mas as afirmações foram mais longe, com o socialista a falar de um acordo à esquerda como um facto consumado mesmo antes de entrar na reunião do final do dia. “Nós não vamos abrir uma nova crise mas, pelo contrário, contribuir para estabilizar a zona euro com uma política económica que reforce o crescimento, o emprego e que dê respostas à crise social em Portugal”. Sobre esse cenário ainda disse, à Reuters, que “há todos os motivos para se encarar, não só com tranquilidade, mas com esperança, uma mudança política que se venha a concretizar em Portugal” e que isso “criará certamente melhores condições para a estabilidade política”. E de forma taxativa concluiu estar  em “melhores condições do que a direita para assegurar a formação de um governo que seja estável para os próximos quatro anos”. A reunião com a PàF acabou por ter esta introdução.