Governo vermelho


Portugal está numa encruzilhada entre duas ideias para o país. Por um lado, a coligação vencedora nas eleições de domingo, que quer continuar a governar de acordo com a ortodoxia europeia. Do outro, um hipotético governo de esquerda que conciliaria a visão socialista pró-euro, mas sem austeridade, com as posições mais extremadas dos bloquistas e…


Portugal está numa encruzilhada entre duas ideias para o país. Por um lado, a coligação vencedora nas eleições de domingo, que quer continuar a governar de acordo com a ortodoxia europeia. Do outro, um hipotético governo de esquerda que conciliaria a visão socialista pró-euro, mas sem austeridade, com as posições mais extremadas dos bloquistas e comunistas. Acredito que mais quatro anos de PSD/CDS seriam menos dolorosos do que a última legislatura porque, de facto, a situação em que estamos hoje é – aos olhos dos decisores e investidores internacionais – muito melhor do que aquela que enfrentámos em 2011. Mas também estou convencido de que um governo vermelho será muito menos radical do que podemos imaginar. António Costa não é um perigoso esquerdista e é, antes pelo contrário, um conciliador de posições e personalidades. A experiência do Syriza demonstrou que entre a utopia e a realidade vai uma enorme distância e que, para que Tsipras sobrevivesse, foi preciso sacrificar Varoufakis (ou como o pragmatismo sobreviveu ao radicalismo). Finalmente, e por paradoxal que pareça, os comunistas portugueses são conservadores e institucionalistas (governam e já governaram dezenas de municípios portugueses, incluindo a Câmara de Lisboa em coligação com o PS, sem que se conhecessem quaisquer assomos revolucionários), o que significa que, enquadrados e expurgados das suas teses antieuropeias, são um parceiro válido. Depois de ter sido crucificado no domingo eleitoral, António Costa renasceu das cinzas nesta terça-feira, quando começou as suas conversas para constituir governo. Secundarizou até a figura do primeiro-ministro em funções que, embora tenha ganho as legislativas, se deixou remeter para uma posição secundária, como uma rapariga na fila à espera de vez para dançar com o “king of the prom”. Não sei como terminará esta novela e sei que Cavaco Silva jamais dará posse a um governo vermelho, mas alguma coisa está a desencravar na política portuguesa.

Escreve à sexta-feira

Governo vermelho


Portugal está numa encruzilhada entre duas ideias para o país. Por um lado, a coligação vencedora nas eleições de domingo, que quer continuar a governar de acordo com a ortodoxia europeia. Do outro, um hipotético governo de esquerda que conciliaria a visão socialista pró-euro, mas sem austeridade, com as posições mais extremadas dos bloquistas e…


Portugal está numa encruzilhada entre duas ideias para o país. Por um lado, a coligação vencedora nas eleições de domingo, que quer continuar a governar de acordo com a ortodoxia europeia. Do outro, um hipotético governo de esquerda que conciliaria a visão socialista pró-euro, mas sem austeridade, com as posições mais extremadas dos bloquistas e comunistas. Acredito que mais quatro anos de PSD/CDS seriam menos dolorosos do que a última legislatura porque, de facto, a situação em que estamos hoje é – aos olhos dos decisores e investidores internacionais – muito melhor do que aquela que enfrentámos em 2011. Mas também estou convencido de que um governo vermelho será muito menos radical do que podemos imaginar. António Costa não é um perigoso esquerdista e é, antes pelo contrário, um conciliador de posições e personalidades. A experiência do Syriza demonstrou que entre a utopia e a realidade vai uma enorme distância e que, para que Tsipras sobrevivesse, foi preciso sacrificar Varoufakis (ou como o pragmatismo sobreviveu ao radicalismo). Finalmente, e por paradoxal que pareça, os comunistas portugueses são conservadores e institucionalistas (governam e já governaram dezenas de municípios portugueses, incluindo a Câmara de Lisboa em coligação com o PS, sem que se conhecessem quaisquer assomos revolucionários), o que significa que, enquadrados e expurgados das suas teses antieuropeias, são um parceiro válido. Depois de ter sido crucificado no domingo eleitoral, António Costa renasceu das cinzas nesta terça-feira, quando começou as suas conversas para constituir governo. Secundarizou até a figura do primeiro-ministro em funções que, embora tenha ganho as legislativas, se deixou remeter para uma posição secundária, como uma rapariga na fila à espera de vez para dançar com o “king of the prom”. Não sei como terminará esta novela e sei que Cavaco Silva jamais dará posse a um governo vermelho, mas alguma coisa está a desencravar na política portuguesa.

Escreve à sexta-feira