Que a esquerda tem um conceito estranho sobre a democracia, já todos nós sabíamos. Que o PS fizesse parte desta esquerda e desse ânimo a este mesmo conceito, é para mim a grande novidade.
António Costa adoptou o estilo de Jerónimo de Sousa e do PCP: após cada derrota eleitoral, há que convencer o eleitorado e a militância de que qualquer derrota é sempre uma vitória. Quando o maior partido da oposição tenta fazer isto aos olhos de um milhão e 700 mil eleitores que votaram no punho erguido, acentua a sua perda e o delírio por onde entrou na última semana de campanha eleitoral.
Costa teve pouco mais do que o voto fiel do PS. Quem pedia há uma semana atrás uma maioria absoluta (cerca de mais 12% dos votos que obteve) e se depara com a dura realidade de que o seu principal adversário, a coligação PSD/CDS, obteve mais de dois milhões e cem mil votos (até à data), nunca pode ter ganho nenhuma eleição ou atingido qualquer objectivo a que se propunha.
O PS é um partido historicamente de poder, de compromisso, de garante do sistema democrático em Portugal. Deverá sem dúvida continuar a sê-lo. E quando Passos Coelho apela a entendimentos urgentes em nome de um país, em nome dos portugueses, é porque tem a noção de que é urgente a união de todos nos quatro anos de recuperação económica que aí vêm.
Qualquer português o percebe. Qualquer português o quer. Cada um deles quer um governo sem sobressaltos, que garanta que os próximos quatro anos serão de reposição total dos salários e pensões que ainda se mantêm cortados, que garanta que seja possível subir o ordenado mínimo num acordo na concertação social, que garanta o apoio à economia necessário para crescermos a um ritmo de 2% ao ano e cuja consequência mor seja a do decréscimo do desemprego em percentagens menores mas permanentes. Caso nada disto acontecesse, nem Bloco nem o PCP quereriam ir para o governo. Sabem eles que estes quatro anos serão únicos, que quem governar com rigor ficará sempre com o país do seu lado, porque serão o país e o povo os beneficiários directos dos quatro anos de recuperação.
Como é que o PS não percebe esta equação tão simples? É tudo tão claro, dr. António Costa. Bloco de Esquerda e PCP optaram pela tese de que o partido que ganha claramente uma eleição não poderá governar. E porquê? Porque não tem maioria absoluta. Os segundos são os primeiros e os primeiros são os últimos. E é esta a forma como estes dois partidos (também eles coligações de vários outros), que juntos tiveram metade dos votos da coligação, respeitam o voto do povo.
Está para chegar o dia em que esta esquerda construa alguma coisa em Portugal. Esta esquerda só serve para derrubar. É a bola de bowling da política portuguesa. Quem lançar esta bola sobre a política portuguesa, com o intuito de derrubar, ficará para sempre com a impressão digital na mesma e na memória do nosso povo.
Muitas vezes, quando o balanço é muito, a fúria é maior e a velocidade é o grande objectivo, o lançador da bola escorrega na própria pista. Que o Bloco e o PCP o possam fazer, ainda admito, está no seu ADN, mas que o PS caia na mesma tentação, isso já será mais complicado.
António Costa terá a responsabilidade de se comprometer com o país ao viabilizar um governo de coligação por quatro anos. Costa deverá lutar para que ninguém pise as suas linhas vermelhas, mas não poderá pensar que quem ganha uma eleição (a coligação) deve governar com o programa do outro (PS). Depois, Costa poderá perder em paz as eleições presidenciais, tirar o tapete ao candidato que inventou nas costas do Partido Socialista (Sampaio da Nóvoa) e dar lugar a uma nova geração no seu partido. Aquilo que Seguro queria fazer e não o deixaram.
Um PS preso ao passado é um PS sem qualquer ambição de futuro. Vamos ver se Costa percebe tudo isto. Conviria ainda perceber que a política não se deve tornar uma profissão. Se o dr. Costa fosse um homem livre e com uma profissão, talvez não se amarrasse ao poder como, pelos vistos, continua a fazer. O PS merecia isso.
Deputado do PSD
Escreve à sexta-feira