Estava tudo combinado entre caravanas PàF e PS para não se encontrarem. “Fosse assim na Segurança Social!”, gracejava um membro do núcleo duro da coligação, a postos na Rua de Santa Catarina, na Baixa do Porto. O PS estava a concentrar-se uns metros mais atrás, na Praça da Batalha, e António Costa só desceria quando Passos Coelho e Paulo Portas já estivessem longe da vista. A arte desta guerra é evitar confrontos directos, ainda que não se evitem provocações. E comparações.
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“Eles têm autocarros de Vila Real”, reclamava-se no PS, que neste campeonato ficou a muitos apertos da coligação (é a medida possível para uma arruada). De Vila Real não havia sinal visível a olho nu, o mesmo não se podendo dizer de Viana do Castelo, com o PSD de Arcos de Valdevez a ostentar um cartaz gigante a meio de Santa Catarina. Marco António Costa, o homem forte do PSD a norte, estava com o sorriso rasgado da “mobilização cumprida”. Ao i disse mesmo ter a impressão de ter ali uma “arruada maior do que há quatro anos”.
Pedro e Paulo eram aguardados por uma multidão. “Abram alas!” O grito de um membro da organização anunciava a chegada do Passat escuro, de vidros fumados e letras na matrícula a passear ironia: “PS”. Saíram – “é a loucura”, atirava um apoiante para a acompanhante – e no braço do banco do carro ficaram as pastilhas para a garganta esforçada nestas duas semanas. António Costa anda a sofrer do mesmo.
Nesta descida tradicional, a voz pouca falta faz. O “contacto com a população” inscrito no programa das festas reduz-se ao arrastar de quem é apanhado pela frente. A turba dos partidos é que compõe o quadro, o resto é paisagem e, por vezes, pouco animada, apanhada pela procissão eleitoral no seu café de fim de tarde. “’Tá tudo bem na vida, tudo bem na vida…” Na síntese da ironia de um portuense, encostado à parede.
Passos e Portas vão alinhados, outras vezes nem por isso. Chegar a eles é tarefa quase sempre inglória, até para a “militante desde a jota” que só se queria queixar da “falta de educação” dos actuais jotinhas do partido. Ainda conseguiu dizer qualquer coisa a Passos, depois de retirada (e mais uma e outra vez) pelo cordão humano (e encorpado) que ladeia a parada. Há outro depois desse: é a bolha dos líderes e respectivos séquitos. Jorge Moreira da Silva, António Carlos Monteiro, Nuno Melo, Pedro Mota Soares, Luís Montenegro. Todos numa coligação de selfies que o telemóvel de Nuno Melo ia registando sem parar já quase à chegada à Praça D. João I, onde havia palco montado para o comício.
A população, para os tais contactos, fica de fora. Há gritos de “Passos, amigo, o povo está contigo”, mas nem todos. Houve uma tensão maior na arruada PàF, quando comparada com a do PS. “Ladrão”, “aldrabão”, ou as duas juntas pontuadas com um “filho da puta” são coisas que se ouvem à passagem da coligação e os atiradores não passam (nem que tentem) sequer o primeiro cordão de segurança.
No círculo de António Costa, a entrada vai sendo consentida, mas as abordagens são, por regra, pacíficas. A turba também foi menor, ainda que tenha sido uma das arruadas mais fortes da campanha socialista. Ao lado de Costa ia Rosa Mota (que ainda não perdeu uma no distrito do Porto), FranciscoAssis, Manuel Pizarro e o cabeça-de-lista Alexandre Quintanilha. Também lá estava o homem da T-shirt cor-de-rosa (sim, o homem) que meia hora antes tinha recebido a dupla Passos/Portas com insultos não tão rosa assim. Era do PS local e lá estava, já de blusão azul escuro apertado, a colar-se ao séquito do candidato.
Por mais que se evitem as rixas de um cruzamento político em clima eleitoral acalorado, elas acabam por se encontrar à esquina. Foi isso mesmo que aconteceu à passagem de um autocarro panorâmico engalanado pela PàF. Os socialistas não resistiram e, com as sondagens a pesarem na cabeça, não contiveram os “chulos”, “ladrões” e “ceguinhos”. E outras combinações tão coloridas como irreproduzíveis. Mas disto também não passou.
No meio do insano tropel eleitoral acabam por coligar-se as palavras de ordem. “Vi-tó-ri-a, vi-tó-ri-a”, “ma-io-ri-a, ma-io-ri-a”. Primeiro na PàF, depois no sentido (político) contrário. Costa é levantado em ombros para acenar à multidão, uns escassos metros à frente do sítio onde Passos, minutos antes, galgara um banco entre dois vasos, bem perto da loja de noivas. Casam-se também no apontar de dedo à “instabilidade” que pode vir de um resultado pouco claro. Hoje, no Chiado, o cruzamento repete-se. É a estratégia final em modo copy-paste e com o mesmo alvo: os indecisos. Segunda-feira se verá se os casamentos ficam por aqui.