Botulismo. Marca de alheiras contaminadas vendia sem certificação

Botulismo. Marca de alheiras contaminadas vendia sem certificação


Sector teme contágio gerado pela confusão com nome da empresa – Origem Transmontana – e os consumidores estão desconfiados. Luís Portugal afirma ao i que está em contacto com as entidades e que está aguardar o resultado das análises para apurar “toda a verdade”.  


“Quem vai sofrer com isto é a nossa Angelina.” Atira um dos empregados da Manteigaria Silva, a propósito da notícia dos três casos de botulismo registados este mês no país. É que no foco da contaminação está a marca Origem Transmontana que pode e já está a causar confusão entre os clientes. 

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Angelina é a marca de alheiras de Trás-os-Montes que a Manteigaria vende. Nada tem a ver com a empresa do ex-concorrente do Masterchef, Luís Portugal, que afirma estar a aguardar pelo resultado das análises para apurar toda a verdade. 

Na Manteigaria Silva, a preocupação com o impacto que a confusão de nomes possa provocar em todo o sector de produtos da região existe. “Isto vai levar muita gente ao engano. Confunde-se uma região inteira com o nome dessa empresa, que é de pequena dimensão”, teme José Branco, dono da única Manteigaria das 24 que outrora existiram em Lisboa. José conta-nos que a notícia da contaminação já levou uma cliente, “a dona Mariana”, a perguntar se vendia alheiras transmontanas. “É preciso distinguir o trigo do joio. Uma coisa é o nome da marca, outra coisa é uma região inteira e a riqueza gastronómica que a representa”, avisa José Branco, sublinhando que a situação tem de ser bem explicada. Se assim não for, antevê, “a região pode sair desvalorizada”.

Esmeralda Rocha, à espera de ser aviada, entra na conversa: “Os meus sogros, que são transmontanos, viram as notícias e ficaram preocupados . Ficaram a pensar que todo o fumeiro de Trás-os-Montes estava contaminado. Expliquei-lhes e ficaram a perceber. Mas e o resto do país?”, questiona. “As pessoas, sobretudo as mais velhas, precisam de ser elucidadas.” 

José Branco assegura que nunca vendeu produtos daquela marca e “agora muito menos”. Explica que a sua “experiência de balcão e a sua própria intuição” levaram-no a torcer o nariz em relação à qualidade dos produtos, até porque se trata de uma empresa sem certificação. “Sabemos que a nódoa pode cair em qualquer pano, mas a probabilidade de acontecer uma coisa destas a produtos certificados é muito menor.” José dá-nos até um exemplo: “Esta semana não vamos ter morcela de Braga porque foi detectada qualquer coisa nas análises que fazem ao sangue, antes da produção. As empresas certificadas dão-nos mais garantias de qualidade, porque têm de ter as análises em dia.” 

Na charcutaria e garrafeira Manuel Tavares, também no coração da baixa lisboeta,  já houve clientes confusos que quiseram ter a certeza que não estavam a comprar produtos contaminados. Na maioria dos casos, explica uma das empregadas, são pessoas mais velhas. A resposta é a mesma: não vendem nem nunca venderam. São fiéis às alheiras de Mirandela, da marca Eurofumeiro. A tradição conta muito para estas lojas com mais de 150 anos. “E veja, na nossa montra não há espaço para mais marcas.” 

Nas grandes superfícies comerciais que o i visitou também não há rasto de alheiras ou queijos da marca Origem Transmontana. No Pingo Doce, da rua 1.o de Dezembro, o responsável da loja garantiu-nos que nunca aquele estabelecimento vendeu produtos da marca, mas não pode dar as mesmas garantias em relação a outras lojas do grupo. Uma coisa é certa, “se por ventura alguma loja vendesse esses produtos, a esta hora já tinham retirado tudo do mercado, porque a informação da DGS já nos chegou na semana passada”. 

Impacto na indústria Entretanto, a notícia dos três casos de botulismo já está a ter impacto no sector, tendo sido já canceladas encomendas de várias toneladas da conhecida alheira de Mirandela. Além disso, choveram telefonemas de clientes junto dos produtores que reclamam medidas urgentes para dissociar os produtos regionais da marca ligada a casos de botulismo.

Os maiores produtores destes enchidos, numa indústria que movimenta 30 milhões de euros por ano só no concelho de Mirandela e que emprega cerca de 600 trabalhadores, temem que os consumidores deixem de comprar alheira transmontana devido ao equívoco que o nome comercial da marca pode criar.  

Américo Pereira, presidente  da Câmara Municipal de Vinhais disse ao i que a indústria do fumeiro  tem cerca de 25 unidades licenciadas, cerca de 80 produtores de porcos licenciados e mais de 350 postos de trabalho directos só naquele concelho.