Catalunha. Mobilização recorde  dá novo fôlego à independência, CUP deverá ser a bóia de Mas

Catalunha. Mobilização recorde dá novo fôlego à independência, CUP deverá ser a bóia de Mas


Às 18h, participação eleitoral já ultrapassava a de 2012. Com 95% dos votos contabilizados, Junts Pel Sí liderava sem mínimo necessário de 68 deputados.


Em 2012, quando Artur Mas decidiu dissolver o parlamento catalão e convocar eleições antecipadas depois de um protesto histórico na capital da região pela secessão com Espanha, a quimera da independência não tinha ainda grandes contornos. 

O que os catalães viam como “ataques” do governo central de Mariano Rajoy e o seu PP (conservador) à língua e cultura catalãs – aliados à renegociação do pacto fiscal com as regiões autónomas que o presidente do governo catalão exige e que Rajoy continua a recusar – levou a uma mobilização de quase dois milhões de pessoas em Barcelona a 11 de Setembro, que conduziu às eleições de 25 de Novembro. 

Às 18h desse dia de 2012, 56,3% dos catalães já tinham ido votar, um número que pouco aumentou até as urnas fecharem. Três anos depois, o longo braço-de--ferro entre a Catalunha e o governo central conduziu, ontem, ao que o “El País” classificou de “participação eleitoral recorde” durante a tarde: pelas 18h locais, mais de 63% das pessoas já tinham votado nas regionais que Mas convocou para este mês (quase todas as comunidades elegeram os seus governos regionais e autarquias em Junho), numa tentativa de relançar a questão independentista após Madrid ter recorrido ao Tribunal Constitucional e conseguido bloquear o referendo de Novembro.

Incerteza A abstenção em baixa, apontava o “El País” a meio da tarde, resulta de uma mobilização maior em zonas da Catalunha que menos apoiaram os partidos pela independência há três anos. O suficiente para baralhar ainda mais as contas e tornar os resultados das eleições de ontem imprevisíveis.

De um lado está Artur Mas e o seu Convergência, aliado à Esquerda Republicana (ERC) de Oriol Junqueras, na lista “Junts pel Sí” – que, segundo as últimas sondagens antes da ida às urnas, angariava 43% das intenções de voto. A CUP, antieuropeísta, candidata-se sozinha; a única para além da “Junts Pel Sí” a defender a independência aparecia em sexto lugar (6%) nos últimos inquéritos. 

Contra essas forças, uma miríade de partidos e coligações que, apesar das diferenças, estão unidos na demanda de manter a Catalunha em Espanha. OCiudadanos, o novo movimento de centro-direita que se apresenta como alternativa nacional ao PP, surgia em segundo, com 14% das intenções – seguido de perto pelo “Cat. Sí Que Es Pot”, a lista da ICV, EUiA, Equo e o Podemos (13%) que defende o direito do povo catalão a decidir o seu futuro em referendo mas que é contra a secessão. Os socialistas do PSC e o PPcatalão vinham logo a seguir, com respectivamente 11% e 9%.

Em primeira instância, o que urgia perceber era se a “Junts Pel Sí” conseguiria ontem angariar a maioria absoluta de que precisa para avançar com as promessas de Mas – que, ao convocar as regionais para 27 de Setembro, prometeu que, se os independentistas ganharem com maioria, “a Catalunha será independente dentro de 18 meses”. Para isso, o Convergência e a ERC precisavam de garantir pelo menos 68 deputados de entre os 135 assentos.

Resultados Ao longo da contagem provisória de votos, os resultados foram-se alterando. Pelas 20h em Lisboa, e com 10% dos votos contabilizados, as sondagens à boca das urnas da TV3 catalã, da TVE e do jornal “La Vanguardia” apontavam para a vitória prevista da “Junts Pel Sí”, em rota para garantir entre 63 e 66 assentos – seguido do Ciudadanos, com entre 19 e 21 deputados eleitos, do PSC com entre 14 e 16, da “Sí Que Es Pot” com entre 12 e 14, e da CUP em quinto, com 9% dos votos (entre 11 e 13 assentos). OPPcatalão aparecia, nessa altura, em sexto lugar, com 9 assentos garantidos, antecipando-se uma queda brutal. Acabaria por ficar em quinto com 11 deputados eleitos.

Ao fecho de edição, com 95% dos votos contados, o pódio mantinha-se mas com a redistribuição dos resultados: a “Sí Que Es Pot” aparecia em quarto lugar com 11 assentos, seguida do PP, também com 11, e da CUP com 10. A movimentação apontava para 62 assentos à “Junts Pel Sí”, 25 para o Ciudadanos e 16 para os socialistas catalães. Na sede da “Junts Pel Sí”, Mas falava na vitória do “Sim” e da democracia enquanto os apoiantes gritavam “Viva o Povo!”

Reacções “Do que estamos à espera não é de saber quem será governo, como costuma acontecer em eleições; do que estamos à espera é ver se existe uma maioria independentista”, dizia um comentador na TVE meia hora depois de as urnas terem encerrado às 20h, 19h em Lisboa.

Com apenas 5% dos votos contabilizados, Francesc Homs, secretário da generalitat de Artur Mas, celebrava os resultados provisórios e a mais baixa abstenção das últimas décadas em eleições em Espanha. “Temos uma participação histórica e parece que também vamos ter uma maioria independentista. Conseguimos!” 
Ocandidato da CUP, António Baños – que poderá ser a única hipótese de Artur Mas para garantir maioria independentista no parlamento – declarou à mesma hora, sob os pedidos de cautela de muitos analistas e políticos devido à quantidade de votos ainda por contar:“Dedicado ao Estado espanhol, sem rancor:Adeus!”

Cenários De notar que o terramoto independentista, cujas réplicas continuam a fazer-se sentir na Catalunha e em Espanha quatro anos depois de a questão ter começado a ganhar real forma, teve algum impacto nas candidaturas. OUnião, que durante décadas esteve coligado com o Convergência de Artur Mas, candidatou-se pela primeira vez sozinho, podendo não alcançar qualquer assento parlamentar. É um dos mais antigos partidos da Catalunha. OCiudadanos, que só foi formado após as eleições catalãs de há três anos, entra de rompante na política da região, como contrapoder dos independentistas.

Se se confirmar a maioria absoluta dos independentistas, com ou sem a CUP, as próximas semanas serão tensas. Rajoy continua a recusar qualquer negociação com os catalães e Mas continua a prometer a secessão. Ogovernador do Banco Central Espanhol já alertou para um eventual controlo de capitais, como o que foi imposto na Grécia há alguns meses, para evitar uma fuga massiva de divisas da região mais rica de Espanha.

O que poderá mudar nos próximos meses com impacto directo na Catalunha é o governo central: em Dezembro há legislativas em Espanha e existe a possibilidade de o PSOEdestronar o PP. Se não tiverem maioria, os socialistas poderão coligar-se com o Ciudadanos, não se sabendo se aceitariam aliviar a intransigência de marca do executivo Rajoy e sentarem-se com os catalães para negociar mais autonomia em troca de uma Espanha unificada.