Operação Marquês. Relação de Lisboa diz que investigação continua “de mãos vazias”

Operação Marquês. Relação de Lisboa diz que investigação continua “de mãos vazias”


Só em parte o acórdão de Rui Rangel é favorável à defesa de José Sócrates – a prisão domiciliária é para continuar. As críticas do juiz conselheiro visam, sobretudo, o procurador Rosário Teixeira e o juiz Carlos Alexandre.


Rui Rangel deu a primeira vitória judicial a José Sócrates desde que foi constituído arguido na “Operação Marquês”. Mas fez mais que isso. Numa nota, já no final do acórdão que levantou o segredo de justiça do processo para arguidos e assistentes, o juiz conselheiro do Tribunal da Relação de Lisboa recorre a uma citação do Padre António Vieira que põe em causa toda a investigação do Ministério Público: “Quem levanta muita caça e não segue nenhuma não é muito que se recolha com as mãos vazias.”

João Araújo e Pedro Delille apresentaram ontem à Relação de Lisboa (TRL) um requerimento para que o ex-primeiro-ministro fosse libertado de imediato e para que fosse posto termo ao segredo de justiça que pendeu até quinta-feira sobre o processo. 

Ganharam essa importante batalha do livre acesso aos autos de um processo colossal que já soma mais de 22 mil páginas. É um passo relevante para a preparação antecipada da defesa, caso o processo chegue a julgamento, mas que poderá retirar a Araújo e Delille resguardo para a recorrente acusação de que não existem factos no processo.
Ao mesmo tempo, a guerra da defesa – a libertação de Sócrates, essa que seria a “grande vitória” dos advogados – continua por satisfazer.

Ontem, o Tribunal da Relação de Lisboa disponibilizou o acórdão. Uma medida inédita que acontece a pedido expresso do juiz conselheiro Rui Rangel. E em grande parte do documento, de 50 páginas, Ministério Público e advogados esgrimem argumentos num braço-de-ferro sobre os prazos do inquérito, o seu início e fim. Com um elemento central nessa tarefa: a carta rogatória enviada às autoridades suíças. 

Um procedimento que leva mesmo a defesa de Sócrates a acusar o procurador Rosário Teixeira de manipular os prazos do inquérito (e do tempo de prisão, efectiva ou domiciliária que, em consequência, poderia ser aplicada ao ex-primeiro-ministro).

A este respeito, Araújo e Delille consideram que “a história da carta para a Suíça se resumiu então a um expediente para tentar ampliar o prazo de duração do inquérito e da prisão do arguido e de pretexto para a requerer e aplicar”. Os advogados recordam, de resto, que foi a pedido expresso do MP que a resposta demorou sete meses. A carta foi devolvida, diz a defesa de Sócrates, numa data escolhida pela investigação e “tendo apenas em atenção certas circunstâncias externas à investigação e ao processo” (entenda-se, as eleições autárquicas “em que, ao que parece, importava impedir que [José Sócrates] participasse”.
Quase se poderia dizer que Rui Rangel subscreveu a tese da defesa em absoluto – faltou a libertação imediata do principal arguido do processo.Medida que, ainda assim – acreditam João Araújo e Pedro Delille –, decorre directamente do fim do segredo de justiça a 15 de Abril, decidido pelo juiz conselheiro.

iniciação ao direito No acórdão, Rangel aponta o dedo a Rosário Teixeira pela forma como (não) sustenta o pedido de prorrogação do segredo de justiça e, da mesma assentada, põe em xeque Carlos Alexandre, por abrir uma “auto-estrada (…) ilegal” à investigação.

O juiz chega a questionar os métodos do MP, dizendo que “nada justifica que uma investigação que se iniciou em 2013 se tenha mantido todo o tempo em segredo” e que esse segredo seja usado como “arma de arremesso” contra um arguido vítimas de truques” dos titulares do processo. 

Mas Rangel vai mais longe e, num acórdão pesado para Rosário Teixeira e Carlos Alexandre (o único desfavorável até ao momento), levanta suspeitas sobre as mais-valias que resultarão dos longos meses (anos, na verdade) de investigação, adivinhando um processo repleto de “mãos vazias”.