Francisco nos EUA. O Papa anti-consumo chegou à terra da McDonald’s

Francisco nos EUA. O Papa anti-consumo chegou à terra da McDonald’s


Depois de Cuba, os EUA. Francisco chega hoje a Washington. Será o primeiro Papa a falar ao Congresso americano e à ONU


Os serviços secretos americanos não são propriamente leigos em matéria de segurança de grandes eventos, mas a visita do Papa Francisco aos EUA, que hoje começa, requer atenção máxima. Desde logo, porque o Sumo Pontífice aterra no país ao mesmo tempo que os 170 líderes mundiais que vão participar na Assembleia-Geral da ONU. 

As autoridades americanas têm-se desdobrado em cuidados e planeamento – ontem houve um mega-simulacro em Nove Iorque que envolveu snipers, explosões e desabamentos de edifícios – para garantir a segurança do Papa nas três cidades por onde passará até domingo: Washington, Nova Iorque e Filadélfia. Nos próximos cinco dias, Francisco reúne com Obama, discursa no Congresso americano e na assembleia da ONU e preside a missas onde são esperadas mais de um milhão e meio de pessoas. Em nome da segurança, os fiéis já foram advertidos de que será proibido usar drones e paus de selfies nas celebrações. 

Para os 68 milhões de católicos que vivem nos Estados Unidos, o ponto alto da visita de Francisco será a participação no Encontro Mundial das Famílias, que acontece no fim-de-semana em Filadélfia. Mas a viagem do Papa não se esgota no encontro instituído por João Paulo II na década de 1990 e que acontece de três em três anos. Além do forte simbolismo político (ver texto secundário), a visita de Francisco terá outros impactos. A começar pelo discurso no Congresso americano, agendado para quinta-feira: é a primeira vez que um líder da Igreja Católica se apresenta no órgão máximo do poder legislativo dos EUA. O tema da imigração – numa altura em que o país se prepara para fazer alterações à legislação – deverá estar no centro do encontro. Na semana passada, o número dois do Vaticano, Pietro Parolin, confirmou que a imigração será mesmo um dos temas centrais da visita.

“Os Estados Unidos têm uma importante história de acolhimento e integração de imigrações”, recordou o cardeal numa entrevista à televisão do Vaticano. Francisco será, assim, uma espécie de representante simbólico de todos os imigrantes – legais e clandestinos – que os EUA acolhem todos os anos. “Esperamos que a visita do pontífice, que sente o problema da imigração com o coração, sirva para encontrar soluções”, acrescentou o secretário de Estado do Vaticano. 

No dia seguinte, sexta-feira, Francisco discursa perante a Assembleia-Geral da ONU. Também pela primeira vez na história, a bandeira da Santa Sé estará hasteada na sede das Nações Unidas e é esperado que a imigração volte a estar no centro da mensagem do Papa: perante os 170 líderes mundiais que participam na reunião, o Papa deverá insistir na crise de refugiados que a Europa enfrenta. Mas o tema central da “palestra” será outro: as alterações climáticas, a propósito da encíclica “Laudati si, sobre o cuidado da terra” que Francisco publicou em Junho e que é um manifesto ecologista e claramente anti-consumista.

 O secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, já classificou a presença de Francisco de “histórica”, num ano que a ONU celebra o seu 70.º aniversário e em que se prevê que os 192 Estados-membros da organização tomem decisões determinantes sobre o desenvolvimento sustentável e as mudanças climáticas. Recentemente, Ban admitiu mesmo que a participação do Papa na assembleia-geral poderá servir para “inspirar” a comunidade internacional a investir em “esforços maiores” no que diz respeito à “distribuição de recursos” e à “justiça social entre os povos” – temas centrais da encíclica.
Entre missas e visitas a escolas e a uma prisão, o texto de Francisco deverá estar bem presente na visita aos Estados Unidos. “Laudato si” declara guerra às multinacionais e tece duras críticas ao “capitalismo selvagem”.

Mensagens capazes de abanar as consciências do país que é, por excelência, o motor do consumismo e da globalização? Na entrevista à televisão do Vaticano, o secretário de Estado Parolin admitiu que o Papa “convidará” os americanos “a mudar de modelo de vida, a servirem à criação e não actuarem como devastadores da natureza”. 
Francisco chega hoje a Washington, aterrando na base militar Andrews, mas os encontros oficiais só começam amanhã. Logo pela manhã, reúne com o presidente americano, Barack Obama, na Sala Oval da Casa Branca.

Ao meio-dia, encontra-se com os bispos da Conferência Episcopal norte-americana para, em conjunto, rezarem a oração do Angelus. Da parte da tarde, Francisco preside a uma missa de canonização de Junípero Serra – um frade franciscano missionário  – na basílica do Santuário Nacional da Imaculada Conceição. Só na quinta-feira é que seguirá para Nova Iorque.