Lembro-me de ser pequenina e ir com os meus pais votar. E lembro-me de isso ser uma excitação. Encontrar lugar para estacionar o carro, entrar no edifício, procurar a sala certa, esperar na fila – sim, na altura havia grandes filas na maioria dos actos eleitorais – e depois entrar.De mão dada, com a minha mãe ou o meu pai.
Ouvir o seu nome completo e depois acompanhá-los até ao recanto onde marcavam o seu voto. Isto enquanto eu tentava manter o bom comportamento que a situação – que eu encarava com solenidade – exigia, mas ao mesmo tempo dando pequenos pulos, na tentativa de ver onde punham a cruz. Um esforço vão porque, na verdade, em casa dos meus pais, o voto nunca foi propriamente secreto. Fui várias vezes votar com eles, enquanto aguardava pela minha vez.
Quando finalmente fiz 18 anos e pude votar, foi uma festa. Lembro-me de que foram umas autárquicas, em 1997. E, mais uma vez, fui votar com os meus pais. Mas finalmente podia fazer uma cruz. A minha cruz. A tal pela qual cresci a ouvir dizer que os meus pais tinham lutado. A tal cruz que cresci a viver como se fosse um acontecimento familiar. Almoçávamos, no tradicional almoço de domingo, e depois lá íamos votar.
Os anos passaram, a mesa de voto deixou de ser a mesma para todos os elementos da família e o voto deixou de ser um acontecimento familiar. Mas nem por isso deixei de o encarar como um acontecimento. Perdi a conta ao número de vezes em que fui olhada de lado porque saí mais cedo da praia para ir votar. Ou que fui às urnas depois de uma noitada que roubou horas à cama. Ou até doente.
Nunca deixei de votar e não consigo imaginar o que é isso de não votar. Não censuro as opções dos outros, mesmo quando não as entendo. Mas eu sempre encarei o voto como um direito e um dever do qual quero usufruir e cumprir. Mesmo quando dou por mim a questionar se o meu voto muda alguma coisa.