Tuk-tuks. Ministério Público investiga fuga ao fisco de vários milhões

Tuk-tuks. Ministério Público investiga fuga ao fisco de vários milhões


Denúncia anónima fala em manipulação de contas da principal empresa a operar em Portugal que pode ter levado a fuga de mais de 17 milhões.


São conhecidos por fazer as delícias dos turistas e por pôr em franja os nervos dos taxistas. Mas aquela que será a principal empresa a operar os chamados tuk-tuks em Portugal está a ser investigada pelo Ministério Público (MP) por suspeitas de evasão fiscal que pode ascender às dezenas de milhões de euros nos últimos cinco anos, altura em que os primeiros riquexós (assim se chamam as viaturas) chegaram ao país. A investigação, que pode vir a abranger outras empresas do ramo, partiu de uma denúncia anónima apresentada em Julho.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) confirmou ao i que o processo “corre termos no Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa e encontra-se em investigação”. Na denúncia, a que o i teve acesso, é feito um levantamento exaustivo da actividade declarada, na comunicação social e nas Finanças, sobretudo pela Tuk Tuk Lisboa – Circuitos Turísticos, Lda. E os dados não batem certo nos dois planos, fazendo suspeitar de uma fuga às responsabilidades fiscais na ordem dos vários “milhões de euros”.

Paulo Oliveira é um dos dois sócios da empresa e o presidente da Associação Nacional de Empresários de Tuk Tuk (ASTUK). É, também, segundo declarações do próprio, o pioneiro na importação destas viaturas para Portugal e da sua exploração

É fazer as contas “O tuk-tuk é auto-suficiente (…), dá para remunerar as pessoas, dá para pagar os impostos, que cada vez se avolumam mais”, dizia Paulo Oliveira à Antena 1, em Dezembro de 2012.

O negócio começou em Abril desse ano. A Tuk Tuk Lisboa arrancou com quatro viaturas na capital, cada uma com um custo de compra de cerca de 15 mil euros. Passados cinco meses, já estariam no terreno 30 tuk--tuks – cinco dos quais em Sintra e outros tantos em Cascais.

No relatório de contas que fechou no final desse ano, a empresa declarava às Finanças, de acordo com a denúncia, um volume de vendas na ordem dos 4,5 milhões de euros. O resultado líquido era, no entanto, negativo: pouco mais de 17 mil euros de prejuízo. As contas começam a complicar-se a partir daqui.

Actualmente, já há riquexós movidos a energia eléctrica. Não era o caso das viaturas da Tuk Tuk Lisboa, cujo motor funciona a gasóleo. Apesar disso, no primeiro ano, a empresa não declarou quaisquer gastos em combustível. Em 2013, segundo ano de actividade (e já com 80 viaturas), dessa rubrica passaram a constar gastos no valor de 234,17 euros. E mesmo “procurando estabelecer como 60 o número médio de viaturas a circularem” nesse ano, escreve o autor da denúncia, considerando as despesas declaradas com gasóleo, “cada viatura gastou por ano, em média, 3,90 euros de combustível”.

A extensa participação entregue nas Finanças – e que foi, por fim, reencaminhada para o Ministério Público – levanta também suspeitas sobre o volume de vendas declarado: menos de 69 mil euros. Porquê? “Se se considerar o descabido exercício de cada viatura efectuar apenas uma viagem (de 45 euros/hora) por dia, todos os dias do ano, o volume de vendas declarado” teria de ser de quase um milhão de euros.

Salários de terceiro mundo Outra eventual incongruência entre o discurso público de Paulo Oliveira e as declarações às Finanças: os salários dos trabalhadores da Tuk Tuk Lisboa. Em finais de 2012, o presidente da ASTUK afirmava que a sua empresa teria entre 20 e 30 colaboradores e que os mesmos teriam direito a 20% do valor que conseguissem obter com as viagens realizadas. “Assim, e partindo do princípio de que o relatório financeiro espelha a realidade da actividade desta empresa, então, em média, cada colaborador desta empresa terá auferido, no ano de 2012, entre 30,34 e 451 euros”, uma vez que o valor declarado em vendas efectuadas terá sido de pouco mais de 4500 euros. “Poder-se-á estar perante uma realmente escandalosa fraude fiscal que terá lesado o Estado português, bem como a Segurança Social, em milhões de euros”, conclui a denúncia.

É um valor que o documento estima em mais de 17 milhões de euros, mas que se admite poder ser em “excesso por defeito em aproximadamente 40%”, consequência da concorrência que a empresa foi começando a ter com o passar dos anos.