Refugiados: falar claro


Impõe-se falar claro: não o fazer pode ser catastrófico para a democracia!


© Yannis Kolesidis/EPA

A situação dos refugiados não pode deixar de merecer uma eficaz e imediata resposta humanitária por parte dos países europeus e, porventura, de todos quantos nos acostumámos designar por comunidade internacional.

Sendo imperativa e urgente, uma resposta humanitária não pode, contudo, pretender mais do que resolver circunstancialmente a situação específica e desesperada das pessoas que sofrem e necessitam de acolhimento urgente.

Por isso, convém – em nome dos mesmos valores e princípios que viabilizarão a resposta humanitária – não iludir também os antecedentes dos países que originaram os recentes êxodos e as responsabilidades que nelas tiveram muitos políticos europeus e mundiais.

E isso é uma discussão política!

Ou seja, importa não deixar que se pense que a ajuda humanitária, por natureza circunstancial, resolve as questões que originaram as crises e fará esquecer as responsabilidades de todos quantos – na melhor das hipóteses ingenuamente – ajudaram a provocá-las.

Se assim não acontecer, chegará o momento em que mesmo os mais bem–intencionados cidadãos, dispostos agora a apoiar os refugiados, não saberão mais o que fazer, tolhidos e confusos.

Qualquer fagulha pode, na verdade, alterar a posição da opinião pública europeia, criando-se então uma situação política propiciadora de derivas políticas inimagináveis.

É, por isso, cada vez mais evidente a importância de equacionar e abordar com clareza questões políticas cuja solução muitos, até agora, preferiram escamotear e substituir apenas por tardias, mesmo que imperiosas, opções humanitárias.

Será, então, realmente difícil, para os cidadãos de países em que o desemprego, os despejos e a necessidade de emigrar se mantêm devido à crise económica, compreender como o poder político e económico europeu, que antes não encontrou soluções para resolver a sua situação, consegue agora apoiar os refugiados.

Que reacção terão os que regrediram socialmente devido às medidas das “troikas” quando assistirem à aparente facilidade com que, afinal, os problemas dos refugiados parecem poder ser resolvidos por aqueles que lhes impuseram tais políticas e os seus resultados?

Empobrecidos e mais sacrificados do que nunca, a prazo, encararão os refugiados – apontados então como únicos culpados – como aqueles que lhes querem usurpar o pouco que ainda têm.

Os que provocaram as crises económicas internas e as catástrofes políticas externas não terão, como sempre, escrúpulos em aproveitar tais preconceitos.

Muitos dos cidadãos nacionais poderão, na verdade, deixar-se manipular pela demagogia dos que antes promoveram e vampirizaram tais situações, mas se apresentarão, depois, como seus defensores intransigentes, se os problemas se agravarem. 

As forças democráticas, devido à sua estrutural e coerente posição humanista, passarão a ser acusadas de ignóbeis apoiantes dos detestados refugiados e, por isso, as únicas causadoras de todos os males: os passados, os presentes e os futuros.

O resultado parece óbvio e perigoso.

Só a coragem e a lucidez na discussão das políticas que explicam a crise económica europeia – que, não por acaso, foi causada pelos mesmos que promoveram as políticas internacionais que originaram as catástrofes humanas e a vaga de refugiados – pode evitar uma deriva antidemocrática e racista na Europa. 

Sem prescindir da máxima e mais urgente solidariedade, impõe-se, pois, falar claro: não o fazer pode ser catastrófico para a democracia! 

Jurista
Escreve à terça-feira 

Refugiados: falar claro


Impõe-se falar claro: não o fazer pode ser catastrófico para a democracia!


© Yannis Kolesidis/EPA

A situação dos refugiados não pode deixar de merecer uma eficaz e imediata resposta humanitária por parte dos países europeus e, porventura, de todos quantos nos acostumámos designar por comunidade internacional.

Sendo imperativa e urgente, uma resposta humanitária não pode, contudo, pretender mais do que resolver circunstancialmente a situação específica e desesperada das pessoas que sofrem e necessitam de acolhimento urgente.

Por isso, convém – em nome dos mesmos valores e princípios que viabilizarão a resposta humanitária – não iludir também os antecedentes dos países que originaram os recentes êxodos e as responsabilidades que nelas tiveram muitos políticos europeus e mundiais.

E isso é uma discussão política!

Ou seja, importa não deixar que se pense que a ajuda humanitária, por natureza circunstancial, resolve as questões que originaram as crises e fará esquecer as responsabilidades de todos quantos – na melhor das hipóteses ingenuamente – ajudaram a provocá-las.

Se assim não acontecer, chegará o momento em que mesmo os mais bem–intencionados cidadãos, dispostos agora a apoiar os refugiados, não saberão mais o que fazer, tolhidos e confusos.

Qualquer fagulha pode, na verdade, alterar a posição da opinião pública europeia, criando-se então uma situação política propiciadora de derivas políticas inimagináveis.

É, por isso, cada vez mais evidente a importância de equacionar e abordar com clareza questões políticas cuja solução muitos, até agora, preferiram escamotear e substituir apenas por tardias, mesmo que imperiosas, opções humanitárias.

Será, então, realmente difícil, para os cidadãos de países em que o desemprego, os despejos e a necessidade de emigrar se mantêm devido à crise económica, compreender como o poder político e económico europeu, que antes não encontrou soluções para resolver a sua situação, consegue agora apoiar os refugiados.

Que reacção terão os que regrediram socialmente devido às medidas das “troikas” quando assistirem à aparente facilidade com que, afinal, os problemas dos refugiados parecem poder ser resolvidos por aqueles que lhes impuseram tais políticas e os seus resultados?

Empobrecidos e mais sacrificados do que nunca, a prazo, encararão os refugiados – apontados então como únicos culpados – como aqueles que lhes querem usurpar o pouco que ainda têm.

Os que provocaram as crises económicas internas e as catástrofes políticas externas não terão, como sempre, escrúpulos em aproveitar tais preconceitos.

Muitos dos cidadãos nacionais poderão, na verdade, deixar-se manipular pela demagogia dos que antes promoveram e vampirizaram tais situações, mas se apresentarão, depois, como seus defensores intransigentes, se os problemas se agravarem. 

As forças democráticas, devido à sua estrutural e coerente posição humanista, passarão a ser acusadas de ignóbeis apoiantes dos detestados refugiados e, por isso, as únicas causadoras de todos os males: os passados, os presentes e os futuros.

O resultado parece óbvio e perigoso.

Só a coragem e a lucidez na discussão das políticas que explicam a crise económica europeia – que, não por acaso, foi causada pelos mesmos que promoveram as políticas internacionais que originaram as catástrofes humanas e a vaga de refugiados – pode evitar uma deriva antidemocrática e racista na Europa. 

Sem prescindir da máxima e mais urgente solidariedade, impõe-se, pois, falar claro: não o fazer pode ser catastrófico para a democracia! 

Jurista
Escreve à terça-feira