Pequeno guia de Verão para eleitores mais distraídos


Os programas eleitorais preferem abordar esoterismos como segurança social, fiscalidade e coisas afins, que são totalmente irrelevantes quer para a decisão de voto, quer para o nosso futuro comum mais imediato.


Num momento em que os eleitores se digladiam para ver quem acaba de ler os programas eleitorais mais depressa, ávidos das novidades e do conhecimento que nem o “Borda d’Água” nem as colecções-de-capa-dura-e-letras-douradas-boas-para-pôr-na-estante carregam consigo, é mesmo assim oportuno recordar alguns dos aspectos que distinguem a coligação PSD/CDS e o PS. Até porque os programas eleitorais não os tratam directamente e preferem abordar esoterismos como segurança social, fiscalidade, políticas de emprego e coisas afins que, como toda a gente sabe, são totalmente irrelevantes quer para a decisão de voto, quer para o nosso futuro comum mais imediato.

Assim, que diferenças relevantes se encontram entre a coligação PSD/CDS e o PS? Bem, desde logo, quanto aos interesses que os sustentam. Enquanto o PS opta claramente pelos seus apoios tradicionais – os lóbis só aparentemente contraditórios da construção e das novas tecnologias –, o PSD inova e arrisca tudo com o Partido Comunista Chinês, afinal o seu verdadeiro parceiro de coligação dos últimos quatro anos. Há quem comente, aliás, que o actual CDS foi montado em três dias, entre o dia das eleições de 2011 e o momento da tomada de posse do actual governo, recorrendo aos famosos andaimes de bambu – e que ainda por lá estarão, tendo em conta a sua flexibilidade –, mas não acredito.

Outra diferença de monta diz respeito às caras jovens e novas que cada um dos principais oponentes apresenta. Enquanto os jovens do PSD/CDS, normalmente, privilegiam o dinheiro e os contactos que possam vir a obter, a curto ou a longo prazo, com a sua actividade política, e desprezam a visibilidade mediática e cívica da sua participação, com os equivalentes do PS passa-se exactamente o contrário. Dispensam o dinheiro, esse fardo do arrivismo suburbano, mas pelam-se por uma breve no “Expresso”, verdadeira mirra da existência pós-moderna e sucedâneo divino, existisse este.
Finalmente, outra diferença possível de encontrar é o tratamento que as feiras merecem por parte das candidaturas.

Como há cada vez menos feirantes, é de crer que boa parte dos vendedores que invadem noticiários em anos de eleições sejam funcionários dos partidos ou avençados para a epopeia eleitoral. Tendo em conta a situação financeira apertada do PS, esperam-se dificuldades em pagar horas extraordinárias, naperons e pares de meias, de modo a compor uma feira apresentável nas televisões. Já no PSD/CDS, esse problema não se coloca, pelo que haverá seguramente abundância de utilidades para o lar e de refrões fáceis de decorar, entoados em êxtase quando as câmaras se ligarem. 
Claro que a ida a feiras numa campanha eleitoral vale apenas 50 votos e todos sabem isso, mas não há candidato que resista a deixar-se filmar num fundo difuso entre umas meias de vidro devidamente embaladas e a embaladeira de uma Ford Transit com um avançado de lona. Nisso há que dar razão à vox populi: os políticos são todos iguais.

Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

Pequeno guia de Verão para eleitores mais distraídos


Os programas eleitorais preferem abordar esoterismos como segurança social, fiscalidade e coisas afins, que são totalmente irrelevantes quer para a decisão de voto, quer para o nosso futuro comum mais imediato.


Num momento em que os eleitores se digladiam para ver quem acaba de ler os programas eleitorais mais depressa, ávidos das novidades e do conhecimento que nem o “Borda d’Água” nem as colecções-de-capa-dura-e-letras-douradas-boas-para-pôr-na-estante carregam consigo, é mesmo assim oportuno recordar alguns dos aspectos que distinguem a coligação PSD/CDS e o PS. Até porque os programas eleitorais não os tratam directamente e preferem abordar esoterismos como segurança social, fiscalidade, políticas de emprego e coisas afins que, como toda a gente sabe, são totalmente irrelevantes quer para a decisão de voto, quer para o nosso futuro comum mais imediato.

Assim, que diferenças relevantes se encontram entre a coligação PSD/CDS e o PS? Bem, desde logo, quanto aos interesses que os sustentam. Enquanto o PS opta claramente pelos seus apoios tradicionais – os lóbis só aparentemente contraditórios da construção e das novas tecnologias –, o PSD inova e arrisca tudo com o Partido Comunista Chinês, afinal o seu verdadeiro parceiro de coligação dos últimos quatro anos. Há quem comente, aliás, que o actual CDS foi montado em três dias, entre o dia das eleições de 2011 e o momento da tomada de posse do actual governo, recorrendo aos famosos andaimes de bambu – e que ainda por lá estarão, tendo em conta a sua flexibilidade –, mas não acredito.

Outra diferença de monta diz respeito às caras jovens e novas que cada um dos principais oponentes apresenta. Enquanto os jovens do PSD/CDS, normalmente, privilegiam o dinheiro e os contactos que possam vir a obter, a curto ou a longo prazo, com a sua actividade política, e desprezam a visibilidade mediática e cívica da sua participação, com os equivalentes do PS passa-se exactamente o contrário. Dispensam o dinheiro, esse fardo do arrivismo suburbano, mas pelam-se por uma breve no “Expresso”, verdadeira mirra da existência pós-moderna e sucedâneo divino, existisse este.
Finalmente, outra diferença possível de encontrar é o tratamento que as feiras merecem por parte das candidaturas.

Como há cada vez menos feirantes, é de crer que boa parte dos vendedores que invadem noticiários em anos de eleições sejam funcionários dos partidos ou avençados para a epopeia eleitoral. Tendo em conta a situação financeira apertada do PS, esperam-se dificuldades em pagar horas extraordinárias, naperons e pares de meias, de modo a compor uma feira apresentável nas televisões. Já no PSD/CDS, esse problema não se coloca, pelo que haverá seguramente abundância de utilidades para o lar e de refrões fáceis de decorar, entoados em êxtase quando as câmaras se ligarem. 
Claro que a ida a feiras numa campanha eleitoral vale apenas 50 votos e todos sabem isso, mas não há candidato que resista a deixar-se filmar num fundo difuso entre umas meias de vidro devidamente embaladas e a embaladeira de uma Ford Transit com um avançado de lona. Nisso há que dar razão à vox populi: os políticos são todos iguais.

Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa