Doentes com tumores nos olhos já não têm de ir ao estrangeiro

Doentes com tumores nos olhos já não têm de ir ao estrangeiro


Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra trata adultos desde 2013 e passou este Verão a operar crianças. 


João (nome fictício) foi diagnosticado pouco depois de nascer com um retinoblastoma, um cancro que lhe afectou um olho e punha em risco a visão e a vida. Em Julho, o menino de dois anos começou os tratamentos e, pela primeira vez, não foi preciso ir ao estrangeiro para ter acesso à melhor técnica disponível na medicina: quimioterapia introduzida directamente na principal artéria do globo ocular, o que implica uma cirurgia para colocar um cateter. Tudo sem comprometer a visão e para destruir apenas as células malignas, e não tecidos bons. 

Com este avanço no tratamento de tumores oculares em crianças, Portugal passa a ser praticamente auto-suficiente em operações de tumores oculares, disse ao i Joaquim Murta, director do serviço de Oftalmologia no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC). Dantes, a maioria dos doentes com tumores como o de João, mas também adultos com melanoma no olho, tinham de ir ao estrangeiro fazer tratamento. Por ano, o envio destes doentes para países como a Suíça representava uma despesa de cerca de 700 mil euros por ano para o Serviço Nacional de Saúde.
“É muito mais confortável para as famílias, bastante menos dispendioso e, além disso, podem iniciar os tratamentos mais depressa, pois não existem os pedidos de autorização para deslocação ao estrangeiro”, diz Joaquim Murta, explicando que neste tipo de casos a sobrevivência é elevada, mas é fundamental intervir antes de haver extensão para fora do globo ocular, para o nervo óptico e sistema nervoso central, ou metástases.
 
Investir em formação O CHUC começou a preparar-se para dar resposta a estes casos em 2012, conta o oftalmologista. “Mais do que infra-estruturas, era preciso formação.” Em 2013 começaram a operar adultos e foi inaugurado o Centro de Tumores Oculares em Adultos, em parceria com o serviço de Radioterapia e com o apoio da Fundação EDP. Todos os anos surgem cerca de 30 novos casos de melanoma no olho em que os doentes podiam, até aqui, precisar de cirurgia local, tendo de deslocar-se ao estrangeiro, o que deixou de acontecer. Neste período, 26 foram operados em Coimbra. Já este Verão, depois de um ano de formação nos EUA, a equipa de Joaquim Murta avançou com o Centro de Tumores Oculares em Crianças. João foi o primeiro doente e fez duas pequenas intervenções, já que o tratamento funciona como na quimioterapia geral por ciclos, mas com muitos menos efeitos secundários, explica o médico. 

Ao todo, o investimento no hospital rondou os 200 mil euros e agora a unidade vai passar a receber doentes de todos os pontos do país, mas também do sector privado, já que em Portugal mais nenhuma unidade tem esta especialização. “O nosso objectivo é candidatarmo-nos a centro de referência”, diz Joaquim Murta. Por agora, o sucesso em casos como o de João deixa a maior satisfação. Hoje, Paulo Macedo vai conhecer a nova equipa ao Centro Hospitalar de Coimbra. Para garantir a completa autonomia, diz Joaquim Murta, falta apenas ao SNS adquirir equipamento para fazer tratamento com acelerador de protões, necessário numa minoria dos tumores oculares, mas também noutros cancros. O grupo nacional que fez recomendações ao governo sobre a actual resposta em radioterapia aconselhou a criação de um centro de protões em Portugal, dado que se estima que poderia beneficiar cerca de 2500 dos cerca de 20 mil doentes que fazem radioterapia todos os anos.

O que é o retinoblastoma?

• É o tumor ocular maligno mais comum nas crianças.
• É detectado, em média, até aos dois anos de idade.
• Por ano surgem cerca de dez casos.
• Urgências adaptadas a todo o tipo de situações.
• A taxa de sobrevivência supera os 95%, mas reduz--se substancialmente quando surgem metástases.