Jorge Gonçalves. O nome soa-nos familiar, o bigode transporta-nos para o passado. Seja adepto do Sporting ou não, Jorge Gonçalves é uma figura dos anos 80, sobejamente conhecido. Pelo bigode. E também pelo estilo. Afinal, é ele quem tenta contrariar o domínio do Benfica através das famosas unhas do leão.
A expressão é do próprio presidente e inclui uma série de jogadores com cartel. O primeiro é o holandês Frank Rijkaard. Seguem-se Rodolfo Rodríguez (guarda-redes uruguaio), Tony Sealy (avançado inglês), Carlos Manuel e muitos mais.
O reinado do presidente Jorge Gonçalves começa então a 24 de Junho de 1988, nas mais concorrridas eleições do Sporting. Antes, muito antes, já está em campanha e até apresenta o avançado sueco Eskilsson, no intervalo de um jogo no 25 de Abril, em Penafiel, para o campeonato.
Pormenor: Jorge Gonçalves aparece vestido à Sporting. Uma semana depois, eis Rijkaard apresentado pelo Sporting à comunicação social.
"Esta é a primeira unha do meu leão", reafirma, peremptório, Jorge Gonçalves. Desvenda que o negócio só é possível devido à intervenção da multinacional Ecofiance, que paga ao Ajax os 284.700 contos que falta. Rijkaard treina com os novos companheiros uma e duas vezes mas nunca chega a jogar.
O Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol alega o fecho do período de inscrições e Rijkaard é emprestado ao Saragoça, antes de arrepiar caminho para o Milan, onde ganha tudo e mais alguma coisa (voltaria a Alvalade, com a camisola do Ajax, para o jogo de apresentação em 1994).
Jorge Gonçalves e o slogan da vitória nas eleições mais concorridas de sempre em Alvalade (1988)
Para fazer esquecer o desastroso quarto lugar de 87-88, Jorge Gonçalves promeve outra limpeza de balneário.
Desta vez, chegam a Alvalade nomes conceituados do futebol como Rodolfo Rodríguez, o temperamental guarda-redes uruguaio, Carlos Manuel, dispensado do Benfica para os suíços do Sion, Ricardo Rocha, central da selecção brasileira, Silas, outro titular do Brasil, e Eskilsson, avançado sueco, sem esquecer o "motor" Douglas. Esse mesmo, o das meias descaídas.
Nas primeiras onze jornadas, o Sporting do uruguaio Pedro Rocha, contratado por Jorge Gonçalves depois de Manuel José ter sido vetado por dirigentes e um abaixo-assinado com seis mil assinaturas, regista cinco empates e seis vitórias.
Em Guimarães, a 6 de Novembro, os leões caem com um golo de Silvinho, ex-Sporting. Três dias depois, vem a eliminação na Taça UEFA, aos pés da Real Sociedad de Arconada e Bakero.
Sem bom futebol para ver, as preocupações do Sporting viram-se para a "pala" do Estádio José Alvalade. Cai? Não cai? A polémica enrola a imprensa portuguesa durante meses a fio e há quem sugira que se pussesse em cima dela para ver o efeito. Meu dito, meu feito. E, afinal, está tudo bem, embora a citada pala precise de umas obras (Sousa Cintra encarregar-se-ia disso, no ano seguinte).
Entretanto, Pedro Rocha já se mudara para o Uruguai e Jorge Gonçalves opta pela contratação de… Manuel José. Sim, o proscrito por sócios e dirigentes! Com ele à frente da equipa, nada muda.
No final da época, as eleições presidenciais de 24 de Junho de 1989 elegem Sousa Cintra como presidente: 40 898 votos contra 16 063 de António Simões, 6 522 de Jorge Gonçalves e 109 de Miguel Catela. Depois de tomar posse, Sousa Cintra atirou-se à federação portuguesa ("demita-se!") e ao Benfica ("Tenham vergonha"), este último por causa da transferência do leão Fernando Mendes.
Na última entrevista, dada a Paulo Cintrão da TSF, em Junho deste ano, Jorge Gonçalves reagiria ao atrevimento de Bruno de Carvalho na arte de roubar o treinador tricampeão Jorge Jesus ao Benfica.
"Isto é futebol. O Bruno de Carvalho achou que agora havia uma hipótese de ir buscar o Jesus e seria a única vez que ele ou outro o conseguiria, e arriscou. Caí-lhe em cima o "Carmo e a Trindade". Agora veremos o que irá acontecer."
E Jesus? "Sou amigo e encontro-o todos os anos em Angola e a quem, como sportinguista, sempre disse que estaria melhor no Sporting". E o Sporting? "Tem um ADN complicado, que passa pela oposição e pela intriga. Quem quer que seja que esteja no clube, é criticado. Estamos num país livre e democrático, mas o futebol é algo de muito complicado, e é um negócio para os mais espertos. O Sporting não tem sido tão esperto como os outros. A oposição interna é uma das coisas que mata o clube."