No cartão de cidadão não conseguiu escapar ao apelido Saldanha, mas é só mesmo aí que usa um primeiro e último nome oficiais. Em todas as outras circunstâncias da vida, é o “João Melgas”. Do pai herdou a alcunha e uns profundos olhos azuis que contrastam com a pele queimada de quem cresceu a trabalhar no campo. “Foi pena, que eu até era bom aluno.” A necessidade fez com que deixasse a escola com o sexto ano feito para ajudar os pais na lavoura, actividade que só deixou quando entrou para a Telcom. “Era um trabalho certinho, nunca o devia ter deixado, mas as mulheres…”
{relacionados}
Deixa a frase no ar, mas não se escapa a uma explicação. “Conheci aquela que veio a ser minha mulher, que insistiu para que deixasse o emprego para ajudar a sogra no minimercado da família.” O azar e a crise ditaram o fecho do estabelecimento passados dois anos e João ficou sem rumo até encontrar a ocupação que tem actualmente na câmara municipal. “As mulheres dão cabo de nós.” Apesar do discurso de lamentos sobre as particularidades do sexo feminino, aponta uma excepção que o faria até mudar de país. “Se tivesse dinheiro, ia para o Brasil viver com a Cláudia Raia. Era a mulher que me enchia os braços.” Os amigos que o acompanham no habitual copo de fim da tarde riem-se do desabafo, mas João parece levar o desejo a sério. “Pena é o Passos não nos deixar esticar muito.”
No meio de tanta conversa falta só explicar de onde vem o “Melgas”, nome pelo qual toda a gente o conhece no Eixo. “O meu pai era músico na banda filarmónica e uma noite, durante um concerto, uns copos a mais fizeram com que deixasse o trompete de lado para sacudir uma melga que o estava a incomodar.” Daí ficou o nome, que se perpetuou em si e nos seus sete irmãos. “Somos todos Melgas, mas ninguém tem tanto orgulho em sê-lo como eu.”