Mauro Paulino. “Os agressores provêm de todos os meios culturais”

Mauro Paulino. “Os agressores provêm de todos os meios culturais”


Psicólogo especialista responde a questões de violência doméstica.


O contexto religioso pode tornar as mulheres mais vulneráveis?
Esta questão levanta outras questões, nomeadamente se é o contexto religioso que torna as mulheres mais vulneráveis ou se são as mulheres mais vulneráveis que procuram um contexto religioso. Existe também um plano de violência a que podemos chamar espiritual e que ocorre sobretudo quando a religião professada pelo agressor e a vítima são diferentes, passando pelo desrespeito das crenças, interesses e gostos da vítima. Nestes casos, o risco de violência é maior. A realidade mostra--nos que, nalguns casos, a religião funciona como uma pressão grupal oculta que empurra a mulher para se manter numa relação abusiva e não envergonhar o grupo religioso divulgando a sua situação. Noutros casos, o grupo funciona como um elemento protector que procura denunciar a violência e ajudar a vítima a lidar com a sua situação.

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Quais as principais características dos agressores?
Os agressores provêm de todos os meios culturais, educacionais e socioeconómicos. Não constituem um grupo homogéneo. Alguns podem apresentar uma perturbação de personalidade ou simplesmente serem indivíduos sem qualquer patologia, mas com significativas distorções cognitivas, que banalizam a violência: baixo autocontrolo, lacunas ao nível comunicacional e ao nível da resolução de problemas e baixa auto-estima. Merece ser destacado o facto de o agressor exibir, muitas vezes, um comportamento diferente na esfera privada daquele que mostra em público. Assumem-se assim como duas pessoas diferentes: uma é a que se revela à vítima, a outra é a que se apresenta aos demais. Os agressores tendem a evidenciar insegurança, imaturidade, instabilidade e baixa auto-estima, e apresentam factores desencadeadores da passagem ao acto, tais como o alcoolismo, o ciúme, a diferença de meio cultural, a precariedade, a gravidez da companheira e o nascimento de uma criança.

E das vítimas?
Quanto às vítimas, as suas características de personalidade também têm influência no fenómeno da violência conjugal. No que concerne à personalidade das mulheres vítimas de agressão conjugal, surgem como características mais comuns a baixa pontuação na afectividade e a instabilidade emocional. São facilmente afectadas pelos sentimentos e descritas como dependentes, inseguras, introvertidas, tímidas, depressivas e ansiosas, apresentando sintomas diversos que têm a sua génese nos acontecimentos de violência vivenciados. Alguns autores falam na noção de mulheres que amam demais porque dão à figura masculina espaço para controlar as suas condutas, e apesar de reconhecerem esta obsessão como influência negativa para a sua saúde e bem-estar, são incapazes de se libertar dela. As vítimas crêem erroneamente que amor e sofrimento andam de mãos dadas e que com a força do seu amor irão poder solucionar os problemas. Tendem a estabelecer de forma inconsciente uma correlação entre os ciúmes e o amor. Por outras palavras, quanto mais ciúmes, mais amor.