Divorciados. Discurso divide católicos

Divorciados. Discurso divide católicos


Papa disse que divorciados não estão excomungados. Nada de novo ou um sinal de abertura em vésperas do sínodo?


É o tema mais polémico do Sínodo da Família – que arrancou o ano passado no Vaticano – e em torno do qual recaem as maiores expectativas de mudança. Deve a Igreja mudar a sua postura em relação aos católicos divorciados e recasados e permitir tenham acesso à comunhão? O tema está longe de ser consensual e, o ano passado, o documento final da primeira parte do sínodo mostrava uma Igreja profundamente dividida.

Na audiência geral desta semana, o Papa abordou o assunto, para dizer que a Igreja “não tem as portas fechadas para ninguém”. Francisco acrescentou que deve existir, por parte dos padres, um “acolhimento fraterno e atento” em relação aos divorciados. Porque, recordou, “não foram excomungados” e a Igreja deve procurar “buscar o bem e a salvação de todas as pessoas”.

Numa altura em que a Igreja continua dividida quanto ao melhor caminho a adoptar em relação a estes católicos – a quem o catecismo veda a comunhão e a absolvição –, o discurso de Francisco veio acender o debate. Para os mais conservadores, que rejeitam a abertura dos sacramentos aos divorciados, não há nada de novo nas palavras do Papa, porque o catecismo já fala em acolhimento e nunca houve excomunhão – que é uma pena canónica – para quem se divorciou. Já os progressistas vêem nas palavras de anteontem um sinal de abertura enviado aos bispos, a pouco tempo do arranque da segunda parte do sínodo.

Afinal o que quis realmente dizer o Papa? Frei Bento Domingues, que defende a integração dos divorciados nos sacramentos, não tem dúvidas de que o discurso teve um propósito: “Criar um ambiente para mudar a atitude dos bispos e dos cardeais que ainda estão reticentes” relativamente ao tema e “favorecer que o sínodo encontre uma solução para um problema a que o catecismo, claramente, não consegue responder”.
Já os sectores da Igreja conotados com maior conservadorismo, como o Opus Dei, têm uma opinião distinta. “O Papa não anunciou nenhuma situação nova. Procurou, sim, chamar a atenção para a necessidade de melhorar o acolhimento às pessoas que estão em situações difíceis, que por vezes não são recebidas da melhor forma”, defende o porta-voz da prelatura. Pedro Gil acrescenta que o Papa já disse, “de forma muito clara”, que este acolhimento mais próximo “não passa pelo acesso à comunhão” – como numa entrevista à Rádio Vaticano em Março deste ano, em que Francisco afirmou que permitir o sacramento “não resolve nada”.

Seja como for, recorda D. Januário Torgal, bispo emérito das Forças Armadas, Francisco está a fazer as coisas de modo diferente: “O Papa quer resolver ignorâncias, noções defeituosas e preconceitos. E teve a coragem de dizer em público aquilo que habitualmente não é comunicado, especialmente em Portugal: as portas devem estar abertas a todos. D. Januário acredita que Francisco irá decidir em função do entendimento das Conferências Episcopais, mas sublinha que já fez o mais difícil: “Conseguir tirar as teias de aranha da ignorância.”

A segunda parte do Sínodo da Família está marcada para Outubro, altura em que os bispos de todo o mundo vão voltar ao Vaticano para debater as conclusões da grande reflexão convocada pelo Papa Francisco sobre a Igreja e as novas formas de família.