Faltava um dia e 23 horas para terminar o prazo. A campanha de crowdfunding – recolha de donativos – para recuperar o maior dos 35 painéis seiscentistas da Igreja de São Cristóvão, na Mouraria, só terminava amanhã, mas conseguiu os 5 mil euros necessários antes do tempo. Ontem à tarde, um mecenas doou os 350 euros que faltavam para completar o fundo, lançado em Junho. No total, 131 pessoas contribuíram para o restauro e em troca vão poder assistir ao vivo aos trabalhos de recuperação.
A supertela de 2,6 por 4,75 metros, que retrata a “Última Ceia”, da autoria de Bento Coelho da Silveira, está assim a salvo, depois de ter sido encontrada há um ano, rasgada e em avançado estado de degradação, dentro de um buraco atrás do altar da igreja. Mas o restauro só vai arrancar em Setembro, depois de estar concluída a recuperação de uma outra tela seiscentista, que já está em marcha.
O restauro do painel, que os técnicos ainda não desvendaram se representa São Francisco de Assis ou Santo António, vai custar 10 mil euros e está a ser feito no âmbito da iniciativa Restauro ao Vivo, em que turistas e lisboetas são convidados a interagir com os restauradores, entre as 10h e as 18h.
A Igreja de São Cristóvão, no coração da Mouraria e das poucas que resistiram ao terramoto de 1755, é uma das mais valiosas de Lisboa e encontra-se bastante degradada. Nas paredes, revestidas a talha dourada, e no altar-mor existem 35 telas da autoria do pintor régio Bento Coelho da Silveira, datados do final do século xvii.
O padre responsável pela paróquia, Edgar Clara, criou um projecto de marketing cultural – Arte por São Cristóvão – para tentar angariar os 1,2 milhões de euros necessários para recuperar a igreja. Desde que o projecto arrancou, há pouco mais de três meses, já angariou cerca de 25 mil euros. Cinco mil foram conseguidos em quatro noites de fado e a Liberty Seguros apoiou a causa com outros 5 mil. A restante verba tem sido obtida através de visitas guiadas e da venda de objectos e biscoitos.
Resolvido o problema das telas, fica por solucionar a segunda maior preocupação: conseguir um telhado novo para a igreja, uma vez que o actual está degradado e deixa entrar água. O padre Edgar Clara tem estado a reunir verbas para a obra, vendendo as futuras telhas a mecenas. Há 7 mil à venda, cada uma por 20 euros. É certo que os compradores não podem levá-las para casa – vão fazer parte do telhado novo –, mas são convidados a assiná-las e numerá-las com um marcador. O telhado novo custa 140 mil euros e a venda de telhas já rendeu cerca de 5 mil. Terminado o crowdfunding, a grande aposta da paróquia passa agora por conseguir o patrocínio de bancos e empresas – que terão o seu nome nas telas recuperadas.