É tempo de Bienal em Vila Nova de Cerveira, que vai na 18.a edição. A vila aperalta-se para receber quem a demanda por altura da bienal internacional de arte, a mais antiga do país, e o movimento de visitantes não se faz esperar. Há cada vez mais espaços para acolher as exposições, e de pintura a escultura, passando por tantas outras formas de expressão artística, somos surpreendidos a cada passo. Cerveira pode gabar-se de nos encantar.
A encantadora Cerveira, toda debruçada sobre o espelho das águas do rio, sob a mirada austera dos cumes graníticos da serra da Gávea, que lhe guarda as costas, espreguiça-se na acolhedora frente ribeirinha – onde arvoredo e poisos vários convidam ao passeio –, encravada na grande Rota da Travessia da Ribeira do Minho. Rio que faz fronteira com Espanha e por aqui se deixa deslizar, em frente a Goian, o povoado da outra banda, até se perder no mar um pouco mais adiante, em Caminha. Rio de águas mansas e cristalinas a reflectirem a verdura que lhe emoldura as margens, que verde é o tom que enfeita o Minho. E a Galiza também.
Num dos vídeos em exposição contava-se a saga dos contrabandistas que atravessavam o rio Minho – misto de tragédia e heroísmo que a mitologia local consagrou –, tidos por aristocratas do banditismo. Praticavam crimes contra o Estado que a crença salazarista incensava. Fuga aos impostos era mais que roubo, era lesa-pátria. Até a PIDE os perseguia: dava-lhes essa honra!
Hoje, a evasão fiscal é uma bagatela. Ora não é que o Tribunal de Contas acusou o desvio de dinheiros do IVA para comprar carros da Factura da Sorte? O Ministério das Finanças desmentiu, mas fica a dúvida. E honra, nenhuma! Esta maioria não se enxerga… O dueto que Passos e Portas encenaram para apresentar o requentado programa eleitoral foi uma cena pífia: apostados em se assumirem como os salvadores da pátria, não conseguiram ir além de um discurso passadista eivado de espantalhos e ameaças de catástrofe. Mas Passos conseguiu, ele que não é tão sabido como Portas, arrancar umas tiradas espectaculosas: “Estamos hoje a lutar mais por Abril e pela liberdade do que tantos outros”, e ainda, “Nestes quatro anos fomos nós a defender o Estado social do socialismo.” Pois então! Não se enxergam mesmo! PAF!!
Em Cerveira, respira-se arte. Quem lá vai não dá o seu tempo por perdido. Portugal tem mais vida para além das querelas partidárias, e o povo cada vez tem menos paciência para os dislates dos mandantes. Ignora-os olimpicamente. O que é perigoso.
No Minho verde é o tom, variados os matizes. Quem por estas bandas se afoita, deleita o olhar e lava a alma. Por entre o ramalhar do arvoredo há pássaros à desfilada, há o rumorejar de rios e ribeiros, há cidades, vilas e aldeias que nos fazem sonhar. Há o verde acinzentado dos montes mais ao pé, respaldado pelo azul arroxeado das serras que se perfilam no horizonte e cuja cor se afina ao entardecer. Este belo país que tão avergoado tem sido por quem, mais do que às nossas gentes, ao estrangeiro se verga. E os ditames dos bens de capital vai cultuando, sem cuidar do interesse maior que é o bem comum.
Por quem perdeu o sentido da honra!
Gestora
Escreve quinzenalmente ao sábado