Neste nosso rectângulo à beira-mar instalado, de geografia simpática e gente amena, existe uma reduzida mas voraz espécie denominada “politólogos”, também conhecidos por “temos connosco o já habitual comentador de política”. São os DO, donos da opinião.
Dizem todos o mesmo, mudando só de tom e de aparência que, como todos sabemos, iludem.
No fim, a intenção é que se cumpra a máxima de Don Fabrizio, para estes efeitos adaptada: é preciso idealizar diferenças de opinião para que tudo se fique pela mesma opinião.
Todos se citam e recomendam com grande admiração e respeito. É com enlevo que assistimos aos “politólogos” da direita velha elogiarem e promoverem generosamente uns carequinhas e umas tias especialistas da parte esquerda do universo.
São os DOE, donos da opinião de esquerda. Procuram um lugar ao sol, são flexíveis e deslocam-se para onde a lei da física determinar.
A direita de lustre não os corrompe de gulodices pela sua reconhecida experiência sindical, gestão autárquica ou entrega cívica a uma qualquer causa, nem pela sua marcante militância numa organização partidária.
Também não o faz por relevante produção teórica e intelectual ou performance cultural, e muito menos por conhecerem o mundo do trabalho, o tal que se propõem salvar e guiar a partir da Versalhes. Não, nada disso.
A resposta é bastante pueril. É mesmo por necessidade. Estão a cumprir um papel, é para isso que lhes pagam avença. Sem eles, o guião ficava coxo e incompleto, é uma exigência desta comédia de enganos de uma democracia simulada e amputada.
São extras, figurantes no papel de ajudar a compor um cenário de ilusão de uma democracia plural, e colaboram para a formação dos personagens principais, os políticos e as políticas do bloco central.
Nunca se interrogam se tanto elogio e concordância não significarão a plena evidência de uma abordagem desadequada dos fenómenos políticos, impedindo assim o debate e a observação do essencial?
A opinião de esquerda está ferida de credibilidade e capacidade mobilizadora quando, por apatia ou oportunismo, permite que o acessório substitua o principal no discurso político e não é capaz de ousar ser mais desafio que interpretação, mais transformação que retórica.
Uma opinião só assume voz própria se provoca incómodo e questiona o cortejo. De contrário, não é opinião, é um coro afinado a interpretar escalas musicais.
Uma opinião de esquerda ou é transgressora, desobediente e de ruptura, ou é pingente para passear vaidades, e então não é de esquerda nem é opinião. É folheto de cartomante.
Somos bons a julgar as ideias dos outros, mas não devemos esquecer que corremos o risco de ser ignorantes e ceder ao preconceito e à falta de rigor ao omitir a nossa opinião.
Muita da opinião a circular pelos nossos meios de comunicação está cheia de disparates e desonestidades intelectuais, de forma assumida, como muleta e ferramenta de trabalho para sustentar e dar uma aparência de tese onde só existem textos com omissões conscientes e mentiras propositadas.
Os “intelectuais públicos” que, com frequência, ocupam as páginas de opinião dos jornais e os tempos de antena das televisões e rádios sabem de antemão que dificilmente serão confrontados. Contam para isso com a apatia do leitor, a falta de exigência e de referências, e as teias de cumplicidade entre políticos e a imprensa que protegem e impõem os seus.
Um homem completa-se, expõe-se e agiganta-se na sua opinião; ela é um facho de esperança com que incendeia a terra.
A opinião é reveladora do pensamento e antecipa a acção. Um homem, um voto. Um voto, uma opinião, gesto e pensamento que transportam consigo a ideia da esperança, e hoje é necessário ter coragem para ter esperança.
Estamos perante tempos difíceis e circunstâncias complexas pela existência de uma crise tripla: uma crise económica, com terríveis consequências sociais, uma crise de liderança política e de credibilidade nas instituições democráticas, e uma crise de valores e falta de referências éticas e morais.
Em Outubro vamos ter oportunidade de influenciar o destino político do nosso país e das nossas famílias, exercendo o nosso direito de opinião. Tenho para mim que, neste momento, os portugueses na sua maioria já tomaram a sua decisão.
As campanhas vão ser para assegurar posições, ganhar indecisos e abstencionistas, e vão dividir-se entre as ameaças do apocalipse e as promessas de pão e mel.
Seja na expressão escrita ou na forma do voto, a nossa opinião conta porque para o poder o nosso desinteresse interessa.
Sem a afirmação da nossa opinião, não contamos. Homens e mulheres, quando votam sem medo e preconceitos, transformam os seus filhos em homens e mulheres livres. Em homens e mulheres com opinião.
Consultor de comunicação
Escreve às quintas-feiras