Manchester. Schweinsteiger segue os passos de Trautmann

Manchester. Schweinsteiger segue os passos de Trautmann


O primeiro alemão do United joga mal e é criticado, tal e qual como o primeiro alemão do City.


O Manchester United ganha 3-1 ao San Jose Earthquakes nos EUA, para o Torneio da Guiness. E? No final do jogo, Louis van Gaal dá uma no cravo e outra na ferredura no reforço Bastian Schweisteiger. "Ele não jogou bem. No primeiro jogo [vitória por 1-0 frente ao América], esteve bem. Agora, não, mas é normal quando apenas tem uma semana de treino." O alemão, o primeiro de sempre no United, encaixa e nada mais. É a vida. Dura. Sempre dura. Sobretudo com alemães em Manchester.

Em Manchester? Mas o Schweinsteiger não é o primeiro do United? É, mas há ainda o City. E aí o primeiro é Bert Trautmann. No tempo em que o amadorismo dita leis. Contratado a custo zero a 7 de Outubro de 1949, Trautmann foi lançado às feras no mês seguinte. A expressão encaixa na perfeição porque Trautmann era um ex-prisioneiro alemão dos ingleses na 2.a Guerra Mundial e estávamos em 1949, apenas quatro anos depois do fim da dita cuja.

Agricultor em Bremen, Trautmann alista-se nos nazis como operador de rádio. Mas não se dá bem e transfere-se para Spandau, onde se torna pára-quedista. Nesta função arriscada, o jovem alemão é capturado três vezes pelas tropas inimigas. Depois dos russos e da Resistência Francesa, dois soldados norte-americanos apanham-no escondido num celeiro e pedem-lhe que saia de mãos no ar. Trautmann, a temer pela vida, foge, ganha avanço sobre os inimigos e salta uma vedação que o afasta dos perseguidores. Por azar, rebola até aos pés de um soldado inglês que o “cumprimenta": “Olá, Fritz, vai uma chávena de chá?”

Interrogado duas vezes, Trautmann é feito prisioneiro em Ostend, na Bélgica, até ser transferido para Essex, onde o
catalogam como prisioneiro C (ou seja, nazi). Depressa passa a B (não-nazi), o que lhe vale a ida para um campo de concentração em Ashton-in-Makerfield. Lá, exibe-se como médio nos jogos de futebol organizados entre prisioneiros. Num deles, lesiona-se na perna direita e troca de posição com o guarda-redes Gunther Luhr. As exibições de Bernd Trautmann (Bert, porque os ingleses não conseguem pronunciar correctamente Bernd) são de tal forma espantosas que é contratado pelo St Helens (3.ª Divisão) em 1948, quando sai da prisão.

Menos de um ano depois, é contratado pelo Manchester City para substituir o carismático Frank Swift. À chegada, o capitão Eric Westwood, um veterano da Normandia (2.ª Guerra Mundial), faz uma declaração pública: “Neste balneário não há guerra.” Não chega e os adeptos do Manchester City assinam mesmo uma petição com 20 mil assinaturas a exigir a saída de Trautmann do plantel. Só a comunidade judaica de Manchester ajuda o pobre Trautmann, que sofre dez golos nos primeiros dois jogos (3-0 e 7-0).

Em Janeiro de 1950, com o Fulham, em Londres, onde mora a nata dos jornalistas ingleses,Trautmann dá um recital de grandes defesas e sai aplaudido do estádio. A partir daí, Bert faz-se à estrada. Que é como quem diz: 545 jogos pelo clube até 1964 e ganha a Taça de Inglaterra em 1956. Diz ele, sem falsas modéstias. "O Peter Murphy, do Birmingham, atingiu-me acidentalmente e quase fiquei inconsciente mas continuei em campo. Dizem que ainda fiz duas defesas, só que não me lembro de nada. Via tudo a preto e branco e deve ter sido o meu subconsciente a parar esses remates. Conclusão: Trautmann tem o pescoço muito danificado. "Se soubesse, pedia para sair. Sou louco mas não estúpido." Trautmann, grande.