Passos Coelho contra proposta de Hollande de criar o “clube dos seis” na zona euro

Passos Coelho contra proposta de Hollande de criar o “clube dos seis” na zona euro


Hollande voltou a colocar em cima da mesa a ideia de uma Europa a duas velocidades.


François Hollande parece ter ganhado novo fôlego depois de ter estado em destaque nas negociações com a Grécia, há duas semanas. Depois de desbloqueada a questão do financiamento à Grécia, Hollande acredita que agora é hora de criar um parlamento da zona euro, com direito a orçamento próprio e com vista a “assegurar o controlo democrático”.

Num texto de homenagem a Jacques Delors, que presidiu à Comissão Europeia entre 1985 e 1995 e que celebrou ontem 90 anos, publicado no “Le Journal du Dimanche”, Hollande defende que a zona euro tem de estar na “vanguarda” institucional e recorda a qualidade da “aliança franco-alemã”, onde, afirma, “o espírito europeu tem prevalecido”. Por isso, adianta Hollande, é preciso fazer mais.“Proponho que recuperemos a ideia de Jacques Delors de um governo da zona euro e de ter um orçamento próprio.” E continua: “Partilhar uma moeda é muito mais do que querer uma convergência. É uma escolha de 19 países porque é do seu interesse”, escreve o presidente francês, lembrando que ao fim de 15 anos nenhum país quis sair do euro – se o texto tivesse sido escrito duas semanas antes, Hollande não estaria tão certo, com a saída da Grécia a parecer inevitável. “Essa escolha pede uma organização reforçada e, juntamente com os países que o decidam, uma vanguarda. França está pronta porque, como Jacques Delors nos mostrou, ela cresce sempre quando é por iniciativa da Europa.”

Trocado por miúdos, o que Hollande quer, na verdade, é uma Europa a duas velocidades. O projecto seria explicado pelo primeiro-ministro francês, Manuel Valls, aos jornalistas na manhã de ontem. O inquilino do Eliseu pretende uma vanguarda constituída pelos seis países “fundadores da UniãoEuropeia: França, Alemanha, Itália, Bélgica, Luxemburgo e Holanda”. 

E embora a proposta tenha aparecido entre parágrafos escondidos num texto de significativa dimensão assinado por Hollande, ao que parece o plano está pronto para ser posto em acção. “Nas próximas semanas, a França, através do Presidente da República, terá a ocasião de lançar iniciativas, fazer propostas concretas que alimentem esta pista, os elementos dados pelo presidente”, acrescentou Valls citado pelos meios internacionais. Este parlamento responderia – pensa-se – ao já existente Parlamento Europeu. Ainda nenhum dos países que alegadamente deveriam integrar a vanguarda da zona euro se pronunciou sobre o assunto.

Passos desconfiado O primeiro-ministro afirmou ontem que a proposta de Hollande lhe causa alguma “desconfiança”. No entanto, num primeiro momento, Passos Coelho defendeu-se afirmando que o presidente francês “não foi muito explícito”. Mas o primeiro-ministro admitiu algum receio sobre a ideia.

“Evidentemente que os países que estão em processo de convergência tendem a olhar de uma forma mais desconfiada para essas ideias, porque isso significa, no fundo, construir diversos clubes dentro do clube aos quais só se pode ascender de acordo com regras ou parâmetros que não ficaram definidos quando se entrou para o clube. São regras novas. E, portanto, os países, de um modo geral, reagem com uma certa reserva a esse tipo de ideias”, salientou.

O chefe de governo afirmou ainda que apesar de ser necessário esclarecer o que quer efectivamente Hollande, parecia que o presidente tinha proposto “uma ideia de directório europeu mais fechado, mais centrado sobre os países fundadores da Comunidade Económica Europeia, que teria, portanto, uma espécie de governo europeu, com um orçamento europeu e um parlamento europeu adequado a esses países”. Numa conferência do Fórum de Administradores de Empresas, em Lisboa, Pedro Passos Coelho afirmou também que a proposta do presidente francês tem como objectivo “levar mais longe as transformações institucionais” da zona euro e que nesse sentido é uma “proposta interessante”.

Numa altura em que a saída da Grécia continua em cima da mesa – pelo menos para a Alemanha e vários economistas internacionais – e em que a palavra solidariedade foi proferida, mais do que uma vez, pelos líderes europeus quando falavam de Atenas, importa perceber se é a solidariedade que marcará o futuro da União Europeia. Ou se se continuarão a criar grupos dentro de grupos que ditarão a outros grupos as regras que todos, equitativamente, deveriam seguir.