Bruno Alexandre Marques Pereirinha. O lateral-direito de 27 anos é um aventureiro por natureza. Começa no Belenenses aos oito anos, transita para o Sporting aos 15, desembarca na Grécia (Kavala) aos 22, arrisca Itália (Lazio) aos 24 e, agora, cruza o Altântico. A paragem é o Brasil, mais precisamente Paraná, onde joga o Atlético Paranaense.
Da Lazio, uma série de tão-só 23 jogos em três épocas sem qualquer título 8apenas a chegada à final da Taça de Itália em 2014). Agora, o Atlético Paranaense, treinado pelo sempre sorridente Milton Mendes, também ele lateral em Portugal, ao serviço de Louletano, Beira-Mar, Belenenses, U. Madeira, Espinho, Camacha, Câmara de Lobos e Machico, durante 13 épocas, de 1987 a 2000. Pois bem, Pereirinha. Que seja o Atlético Paranaense. É o quinto português no Brasil. Os outros contam-nos as suas peripécias.
Rogério Pipi. Avançado do Benfica emelhor marcador de sempre em finais da Taça de Portugal (15 golos). É o primeiro a jogar no Brasil, pelo Botafogo, em1947. “Em Portugal, não se enriquecia com o futebol. Eu, por exemplo, jogava no Benfica e ainda trabalhava com o Peyroteo [avançado do Sporting] no Grémio das Carnes. Só se conseguia juntar algum dinheiro quando se ganhava um título.
Em 1945, o Benfica sagrou-se campeão português e recebi 500 escudos da direcção do clube. Dois anos depois, o Botafogo ofereceu-me 40 contos de luvas e um ordenado de 5000 cruzeiros. Pedi o dobro, com o intuito de afastá-los, porque não queria sair de Lisboa. Mas eles deram-me o que pedi. Antecipei o casamento dois meses e lá fui à aventura para o Rio, com a minha mulher. Na estreia [4 de Agosto de 1947], com o Olaria, caí logo nas boas graças dos adeptos. Depois, a minha mulher engravidou e ela queria que o filho nascesse em Lisboa. Oito meses depois, voltámos a casa, mas nesse período ganhei mais do que ganhara em toda a minha vida. Deu para comprar um automóvel.”
Peres. O extremo-esquerdo treina o Peniche quando é chamado pelo Sporting para assinar pelo Vasco, onde é campeão brasileiro em 1972. “Foram os melhores anos da minha vida. Fui para o Rio ganhar 150 contos por mês para substituir o Tostão! Logo na estreia, com o Tiradentes do Piauí, marquei um golo. Tecnicamente, os brasileiros são excelentes mas eu, como também tinha boa técnica, adaptei-me. Ainda por cima, era mais rápido do que eles. Chamavam-me o ‘tamanco de ouro’. Tornei-me titular e campeão numa final com o Cruzeiro. E não foi fácil. Tínhamos o Roberto Dinamite mas havia Zico (Flamengo), Rivellino (Corinthians), Jairzinho (Botafogo), Gerson (Fluminense) e o melhor domundo no Santos (Pelé). O meu dia típico no Vasco começava muito cedo. Treinávamos logo de manhãzinha e ficava despachado às 10 horas. Depois fazia praia, em Copacabana, que ficava mesmo em frente à minha casa, na Avenida Atlântica. À tarde e à noite tinha uma vida social intensa. É a cidade mais maravilhosa do mundo.”
Paulo Madeira. Entre o Benfica e o Estrela da Amadora, o defesa-central passa os três primeiros meses de 2003 no
Fluminense. Só treina, nunca joga. "Cheguei ao Rio a 7 de Janeiro de 2003 e regressei a Lisboa no final de Março. Foram três meses inesquecíveis, num mundo à parte. Eles estavam muito avançados no plano físico, com esquemas personalizados de treino de três/quatro preparadores, mas depois era uma confusão tremenda. Ninguém sabia a hora dos jogos, por exemplo. É verdade que nunca joguei, porque o Fluminense devia dinheiro ao Estado e não podia inscrever jogadores, mas isso não deixou de enriquecer a minha experiência. Vivia em Ipanema e aluguei uma bicicleta. Um dia, roubaram-ma. Como tive vergonha, só dei conta da ocorrência uns dias mais tarde. O meu treinador, Renato Gaúcho, perguntou-me porque é que não tinha dito mais cedo, no próprio dia ou no dia seguinte. Porque assim o Romário fazia a minha bicicleta aparecer uma hora depois. Lá era assim: o Romário mandava naquilo tudo.”
Dominguez. O Vasco da Gama significa a última aventura do irrequieto esquerdino. Em 2005. Só 11 jogos, ao lado de Romário, na cidade maravilhosa. “Portugal [Benfica, Sintrense, Fafe e Sporting], Inglaterra [Birmingham e Tottenham], Alemanha [Kaiserslautern] e Qatar [Al Ahly]. No fim da carreira, fui ao Brasil para jogar pelo Vasco da Gama. Foram tempos maravilhosos na cidade maravilhosa. Fiquei na equipa do Romário, que era um génio dentro da área. Até com a
barriga ele marcava golos. Eu chamava-lhe general, ele respondia-me com portuga. Há um respeito enorme por ele. É um herói nacional. Ele, no Vasco, tinha os seus horários: nunca jogava fora do Rio de Janeiro e só ia aos treinos de conjunto de quinta-feira, mas cumpria dentro do campo, com golos. Alguns deles de cabeça. Sabes porquê? Além do jeito para o futebol, ele tinha cabeça, ou seja, sabia estar fora do campo. Quando íamos jantar em grupo ou a um aniversário de um amigo, nunca o vi a beber álcool ou a fumar e isso faz a diferença.”
Deco. Tricampeão português (FC Porto), bicampeão espanhol (Barcelona), campeão inglês (Chelsea) e agora campeão brasileiro (Fluminense). Por muitas voltas que dê, a vida de Deco acaba sempre com festa e títulos. Onze anos depois de iniciar esta colecção de troféus, Deco desagua num mar de felicidade no Rio de Janeiro. Vestido com a camisola 20 do Fluminense, a festejar o 20.º título da carreira (FC Porto-10, Barcelona-5, Chelsea-4 e Fluminense-1). “Há coisas que batem certo, não é? Uma delas é esta. Fico super feliz por isso. É uma alegria enorme ser bem sucedido nos clubes que represento. Não falo só do Fluminense, mas também do FC Porto, clube que adoro e cidade onde ainda
tenho uma casa, do Barcelona e do Chelsea, sem esquecer o Corinthians, onde me estreei no Brasileirão, em 1996.
Faz tempo…”, diz Deco, com a voz ligeiramente rouca, de tanto gritar “é campeão”, na agitada noite que viveu, ao lado
de todos os companheiros do Flu. “Tem uma coisa aí: tinha saudades de ouvir esse grito do campeão em português.
Desde os tempos do FC Porto que não escutava [2004].” A cena passa-se no Museu do Teatro, no Rio de Janeiro, onde Deco levanta a taça de campeão.