Portugal é saudade. A dos que ficaram e a dos que cada vez mais partem para outros destinos em busca de melhores condições de vida. Temos a maior taxa de emigração da União Europeia, mas também muitos casos de pessoas que a nostalgia traria de volta já amanhã. Os que pensam mais com a razão do que com o coração afirmam que o seu caminho só voltará a passar pelo nosso país a longo prazo.
Carlos Domingos pensa com o coração. Aos 29 anos trocou Portugal pela Polónia, em Dezembro do ano passado. Tinha acabado o estágio profissional e as ofertas que recebia eram “muito limitadas”, tanto no salário como na duração: “Muitas empresas ainda acham que estão a fazer um favor quando contratam alguém”, justifica. Os primeiros dias em Cracóvia foram difíceis. Havia muito para tratar e pouco tempo para o fazer. A chegada a poucos dias do Natal também não facilitou os planos. Mas, apesar dos contratempos iniciais, o analista financeiro não se deixou abater: “A melhor forma de preparação para este país é comprar o casaco mais quente que haja na loja, porque aqui faz mesmo muito frio”, brinca.
Há quem tenha escolhido paragens mais quentes. Eduardo Saraiva, de 34 anos, é gestor de bases de dados no centro de investigação em saúde no Caxito, perto de Luanda. Há dois anos saiu de Portugal em busca de oportunidades: “Falaram-me deste projecto e fiquei interessado quando soube o que se almejava aqui e como poderia ajudar no de-senvolvimento.” A adaptação foi mais fácil que a de Carlos. Não existia o problema da língua e a boa recepção por parte dos colegas de trabalho ajudou em tudo:“Estava à espera de uma adaptação mais difícil. Nunca me senti sozinho ou desamparado.”
Fazer amigos parece assim ser o truque para um bom entrosamento. “Tive a felicidade de conhecer pessoas na mesma situação, o que é muito bom porque leva a que haja uma ajuda mútua”, conta Carlos, acrescentando que o facto de existir uma grande comunidade de portugueses na Polónia também tornou as coisas mais fáceis. Mas criar amizade com os polacos é a melhor forma de conhecer a cultura, a comida, as tradições e tudo aquilo por que passaram ao longo da sua história:“A partir daí começa-se a ver o país de uma forma completamente diferente.”
A vontade de regressar a Portugal é comum a ambos mas a sorte sorri a apenas um deles. Eduardo regressa no mês que vem: “A razão principal é o meu sobrinho nascer no final de Agosto”, afirma. Em termos laborais, já tem duas propostas em Portugal e no Caxito as condições para passar a pasta estão criadas. Carlos, natural de Manteigas, na serra da Estrela, além de ter deixado cá as pessoas mais importantes da sua vida, tem saudades do seu vale glaciar, das feijocas e dos “churrascos com os amigos de sempre”.
Mas voltar a Portugal implica também abandonar a vida que se construiu no estrangeiro. “Sinto-me um pouco triste porque sei que há pessoas aqui de Angola que não vou voltar a ver e das quais me tornei amigo”, confessa Eduardo: “Mas está na altura de seguir o meu caminho.” Carlos quer que a sua vez de regressar chegue o mais brevemente possível, apesar de saber que na Polónia está a viver uma experiência que o irá “acompanhar para toda a vida”. Ainda vê Portugal sem um projecto sólido para si próprio: “O que sei é o rumo que quero dar à minha carreira e, se o pudesse fazer no meu país, voltaria já amanhã.”
A outra face da moeda Também foram as condições laborais que levaram Igor Pinéu a abandonar Portugal com destino à Suécia há um ano e meio. “Foram essencialmente os salários extremamente baixos”, confessa. Aos 28 anos, o ortoprotésico sabe que encontraria oportunidades de trabalho na área, mas o “ordenado ao final do mês não permitiria começar uma vida independente” tão cedo quanto gostaria. Cedo percebeu que lá fora encontraria uma margem de progressão que em Portugal lhe seria vedada:“Tentei encontrar um sítio onde me sentisse valorizado. Fui para Espanha e depois vim para a Suécia. Conhecer outras culturas também me fascina e isso ajudou.”
Filipa Sousa Baptista tem 37 anos e saiu de Portugal há mais de 15, quando ainda nem se falava de crise. Quando terminou a faculdade abandonou o país pela vontade de “conhecer outros locais, falar outras línguas e ter contacto com outras culturas”. Outra das fortes razões que levaram Filipa, empregada numa unidade hoteleira, a deixar tudo para trás e partir à aventura foi a determinação de “ter uma experiência profissional no estrangeiro”. E por lá ficou. Passou por quatro países até escolher Espanha – e San Sebastián – para viver, em Setembro do ano passado.
Ao contrário de Carlos e Eduardo, Igor e Filipa querem adiar um eventual regresso. “Já não me imagino a viver aí nem quando estiver na reforma! Adoro Portugal mas sinto-me estrangeira no meu próprio país”, desabafa Filipa. Já Igor pensa ficar em Nyköping, cidade que o acolhe, para “crescer pessoal, profissional e academicamente”, até porque “as condições de trabalho são excelentes e o governo paga para que se estude”. Ofim da aventura sueca não vai ditar o regresso ao país que o viu nascer: “Ainda gostava de ter uma experiência fora da Europa”, explica.
A adaptação de ambos aos países de acolhimento não foi difícil. Igor assume que teve de lidar com choques culturais mas considera-os “coisas pequenas”. Na Suécia tem “de espirrar para o braço e não para a mão, pois isso é uma falta de educação” e as mulheres ficam incrédulas quando lhes conta que em Portugal pagam menos que os homens para entrar numa discoteca: “Entendem isso como um machismo tremendo.” Já Filipa conta que encontrou em todos os países pelos quais passou algo de que gosta e que a faz “sentir-se em casa”: das paisagens irlandesas à pontualidade suíça, passando pela gastronomia francesa e pelo estilo de vida espanhol.
A saudade de quem deixaram entra na equação. “Tenho muita sorte com as pessoas que tenho na minha vida. Tenho saudades de todos”, afirma Igor. Mas tem uma explicação romântica para justificar a forma como lida com a ausência: “Sou daqueles que trazem o sol, a praia e as chouriças e não se esquecem que estão sempre a uma viagem de casa.” Filipa alinha pela mesma teoria: “Do que mais sinto falta é sem dúvida da minha família e dos meus bons amigos.” Mas, tirando não pensar em regressar, confessa que já não faz muitos planos: “Aceito o que a vida me oferece”, remata.