E se Passos quiser que as presidenciais se lixem?


Dentro de 11 anos, o actual primeiro-ministro pode aspirar a sentar-se em Belém. Até lhe pode dar jeito que o próximo Presidente não seja do mesmo campo político.


Quem se colocar no lugar de Pedro Passos Coelho assumindo que este pretende ter futuro político chegará facilmente à conclusão de que as eleições presidenciais não são propriamente uma prioridade pessoal. Pode mesmo concluir que não interessam nada e que até era melhor mandá-las lixar--se, desvalorizando-as o mais possível. Aliás, é rigorosamente isso que Passos tem feito, com a sua frieza analítica habitual. 

Partindo do pressuposto de que qualquer Presidente da República, uma vez eleito, vê o seu mandato renovado ao fim de cinco anos, Passos pode alimentar legitimamente a expectativa de ascender à chefia do Estado em 2026, dado estar posta de parte qualquer candidatura sua nas próximas presidenciais. 

Passos vive de e para a política e, mesmo que não ganhe as legislativas deste ano e que tenha de ter uma vida profissional simultânea durante um tempo, é muito natural que não desligue totalmente e que a sua imagem recupere depois de um período de ocaso. Foi, de resto, o que sucedeu com Cavaco, que ele tenta imitar em muitos campos. E, tal como sucedeu com este, para Passos pode ser mais fácil ser eleito a seguir a alguém com quem não esteja politicamente conotado, como Sampaio da Nóvoa ou Maria de Belém. Portanto, a eleição para chefe de Estado de uma figura de esquerda não é um problema. Até pode ajudar.

Na estrita óptica do interesse de Passos Coelho enquanto líder do PSD, torna-se óbvio que as legislativas são a sua verdadeira e única prioridade, até porque, se não as ganhar, boa parte das decisões quanto a presidenciais deixarão de estar na sua mão.

Mas se for renomeado primeiro-ministro e mantiver a tutela do PSD, a questão também não se torna essencial. Desde logo porque, como Passos já fez saber, nenhum dos putativos candidatos sociais–democratas o entusiasma especialmente. Gostaria que fosse Nogueira (uma escolha muito sensata e lúcida, diga-se). Deu-se ao luxo de o proclamar, até porque sabia de antemão que Nogueira não está disponível. Sobretudo, Passos não gostaria nada que fosse Marcelo, como ficou claro na sua moção ao último congresso. Logo por azar, é o célebre professor que está claramente à frente em todas as sondagens.

Obviamente que Passos vai ter de meter as mãos na massa da campanha presidencial se permanecer na liderança do governo e/ou do partido depois das legislativas. Mas também é evidente que não lhe cabe muito mais do que cumprir serviços mínimos, desde logo porque as candidaturas partem, em primeiro lugar, de uma motivação pessoal, à qual os partidos aderem ou não. Percebe-se nitidamente que da parte da oligarquia actual do PSD Rui Rio tem alguma preferência. Por outro lado, não é despiciendo interna e externamente o suporte que Rio já recebeu de Balsemão, que há muito tempo riscou Marcelo da sua agenda. É claro que há também, na mesma área, Santana e Barroso. O ex-presidente da Comissão Europeia ainda espreita e pode ter uma palavra a dizer, em função da evolução da conjuntura. Venha quem vier nesta área, o melhor é não contar muito com a bicicleta de Passos para o ajudar, quer este ganhe ou perca as legislativas. Pedro Passos Coelho – ou Pedro Passos, como gosta de se identificar – ainda tem objectivos políticos a cumprir futuramente. E já se viu que ele é persistente.

Primeiras-damas: mudam-se os tempos e as realidades
A família sofreu nas últimas décadas profundas evoluções, conhecendo novos modelos. Com mais ou menos resistências, a verdade é que as coisas mudaram. Um sinal inequívoco dessa circunstância consiste no facto de, entre candidatos a Presidente da República declarados ou presumíveis, não haver sinal nem interesse dos media e da opinião pública pela existência de caras--metades. Ora, se há função onde essa metade conta é a Presidência da República.

Manuela Eanes, Maria Barroso (uma grande senhora da vida política e cultural que ontem nos deixou e cuja memória temos a obrigação de perpetuar colectivamente), Maria José Ritta e Maria Cavaco Silva tiveram, todas elas, um papel relevante em Belém, além de terem vida própria. Veremos o que o futuro nos reserva numa época em que, por exemplo, uma situação como a de Sá Carneiro e Snu Abecassis não passaria de nota de rodapé nos jornais. O facto, porém, é que há e haverá no papel de primeira-dama uma relevância objectiva no futuro. Neste campo, a verdadeira novidade seria termos uma mulher casada na chefia do Estado e ver que lugar ficaria reservado ao seu companheiro.

Jornalista
Director da Newshold
Escreve à quarta-feira 

E se Passos quiser que as presidenciais se lixem?


Dentro de 11 anos, o actual primeiro-ministro pode aspirar a sentar-se em Belém. Até lhe pode dar jeito que o próximo Presidente não seja do mesmo campo político.


Quem se colocar no lugar de Pedro Passos Coelho assumindo que este pretende ter futuro político chegará facilmente à conclusão de que as eleições presidenciais não são propriamente uma prioridade pessoal. Pode mesmo concluir que não interessam nada e que até era melhor mandá-las lixar--se, desvalorizando-as o mais possível. Aliás, é rigorosamente isso que Passos tem feito, com a sua frieza analítica habitual. 

Partindo do pressuposto de que qualquer Presidente da República, uma vez eleito, vê o seu mandato renovado ao fim de cinco anos, Passos pode alimentar legitimamente a expectativa de ascender à chefia do Estado em 2026, dado estar posta de parte qualquer candidatura sua nas próximas presidenciais. 

Passos vive de e para a política e, mesmo que não ganhe as legislativas deste ano e que tenha de ter uma vida profissional simultânea durante um tempo, é muito natural que não desligue totalmente e que a sua imagem recupere depois de um período de ocaso. Foi, de resto, o que sucedeu com Cavaco, que ele tenta imitar em muitos campos. E, tal como sucedeu com este, para Passos pode ser mais fácil ser eleito a seguir a alguém com quem não esteja politicamente conotado, como Sampaio da Nóvoa ou Maria de Belém. Portanto, a eleição para chefe de Estado de uma figura de esquerda não é um problema. Até pode ajudar.

Na estrita óptica do interesse de Passos Coelho enquanto líder do PSD, torna-se óbvio que as legislativas são a sua verdadeira e única prioridade, até porque, se não as ganhar, boa parte das decisões quanto a presidenciais deixarão de estar na sua mão.

Mas se for renomeado primeiro-ministro e mantiver a tutela do PSD, a questão também não se torna essencial. Desde logo porque, como Passos já fez saber, nenhum dos putativos candidatos sociais–democratas o entusiasma especialmente. Gostaria que fosse Nogueira (uma escolha muito sensata e lúcida, diga-se). Deu-se ao luxo de o proclamar, até porque sabia de antemão que Nogueira não está disponível. Sobretudo, Passos não gostaria nada que fosse Marcelo, como ficou claro na sua moção ao último congresso. Logo por azar, é o célebre professor que está claramente à frente em todas as sondagens.

Obviamente que Passos vai ter de meter as mãos na massa da campanha presidencial se permanecer na liderança do governo e/ou do partido depois das legislativas. Mas também é evidente que não lhe cabe muito mais do que cumprir serviços mínimos, desde logo porque as candidaturas partem, em primeiro lugar, de uma motivação pessoal, à qual os partidos aderem ou não. Percebe-se nitidamente que da parte da oligarquia actual do PSD Rui Rio tem alguma preferência. Por outro lado, não é despiciendo interna e externamente o suporte que Rio já recebeu de Balsemão, que há muito tempo riscou Marcelo da sua agenda. É claro que há também, na mesma área, Santana e Barroso. O ex-presidente da Comissão Europeia ainda espreita e pode ter uma palavra a dizer, em função da evolução da conjuntura. Venha quem vier nesta área, o melhor é não contar muito com a bicicleta de Passos para o ajudar, quer este ganhe ou perca as legislativas. Pedro Passos Coelho – ou Pedro Passos, como gosta de se identificar – ainda tem objectivos políticos a cumprir futuramente. E já se viu que ele é persistente.

Primeiras-damas: mudam-se os tempos e as realidades
A família sofreu nas últimas décadas profundas evoluções, conhecendo novos modelos. Com mais ou menos resistências, a verdade é que as coisas mudaram. Um sinal inequívoco dessa circunstância consiste no facto de, entre candidatos a Presidente da República declarados ou presumíveis, não haver sinal nem interesse dos media e da opinião pública pela existência de caras--metades. Ora, se há função onde essa metade conta é a Presidência da República.

Manuela Eanes, Maria Barroso (uma grande senhora da vida política e cultural que ontem nos deixou e cuja memória temos a obrigação de perpetuar colectivamente), Maria José Ritta e Maria Cavaco Silva tiveram, todas elas, um papel relevante em Belém, além de terem vida própria. Veremos o que o futuro nos reserva numa época em que, por exemplo, uma situação como a de Sá Carneiro e Snu Abecassis não passaria de nota de rodapé nos jornais. O facto, porém, é que há e haverá no papel de primeira-dama uma relevância objectiva no futuro. Neste campo, a verdadeira novidade seria termos uma mulher casada na chefia do Estado e ver que lugar ficaria reservado ao seu companheiro.

Jornalista
Director da Newshold
Escreve à quarta-feira