E depois do referendo?


É difícil de acreditar que o referendo grego venha ajudar a encontrar uma solução duradoura.


© Armando Babani/EPA

Em Agosto de 2012 publiquei o meu livro “O Fim do Euro em Portugal?” (Editora Actual, grupo Almedina), em que previa o colapso da moeda única até final desse ano. Em Janeiro desse ano tinha recebido a informação, por um jornalista, de que se preparava a saída da Grécia e acreditava que isso provocaria um efeito dominó que desintegraria o euro.

Nessa altura digladiavam-se duas teses, a da perna gangrenada, defendida pelo ministro das Finanças alemão, segundo a qual cortar a perna (a Grécia) curaria o resto do corpo, e a do dominó, que veio a ser escolhida por Angela Merkel no Outono daquele ano.

Em Abril de 2014 publiquei uma segunda edição do meu livro, actualizada e aumentada, em que a única coisa que tive de corrigir foi a data da previsão do fim do euro. Se voltasse a revê-lo hoje, as questões principais teriam a ver com actualização dos acontecimentos entretanto ocorridos e não com as análises nele contidas.

Com as últimas piruetas do Syriza, chegámos outra vez muito perto da saída da Grécia do euro, embora tenha de reconhecer que o risco de o efeito dominó se materializar não me parece tão imediato como há três anos. No entanto, continuo a afirmar a vulnerabilidade estrutural do euro e a insuficiência das reformas que se têm vindo a realizar e a preparar, pelo que o risco de contágio a prazo permanece.

Apesar de Portugal passar a ser o elo mais fraco após a eventual saída da Grécia, parece-me que os riscos maiores se concentram em países grandes, sobretudo Itália. A questão crucial é que, se Portugal pode ser ajudado, a Itália é demasiado grande e um auxílio a este país tornar-se-á política e financeiramente proibitiva.

Voltando à Grécia, as sondagens sobre o referendo dão um empate técnico, pelo que me parece útil considerar três cenários: 1. vitória do “sim” com eleições posteriores; 2. a vitória do “sim” sem eleições; 3. a vitória do “não”.

Caso haja eleições após a vitória do “sim”, é de admitir que os gregos desistam de votar em quem não percebeu as prioridades do eleitorado. É evidente que os eleitores querem acabar com a austeridade e permanecer no euro, mas é também claro que para eles o segundo objectivo é muito mais importante que o primeiro.

Neste caso haveria condição de acalmar a situação actual, que a irresponsabilidade do Syriza conseguiu criar no pico da estação do turismo, uma das maiores fontes de receita do país. Há notícias de paralisação de importações devido à dificuldade de fazer pagamentos, que ameaçam parar a produção. Espera-se que, nesta hipótese, os parceiros europeus venham a ser mais generosos com os novos interlocutores helénicos, para evitar o ressurgimento do Syriza. Será sempre um caminho muito difícil e o FMI veio – finalmente – reconhecer que terá de incluir um perdão de dívida.

Alguns poderão pensar que haver vitória do “sim” e não haver eleições em seguida não fará sentido, mas o governo grego já foi tão contraditório que mesmo isto parece possível. Seria uma combinação terrível, até porque poderia estar associada a uma maior intransigência dos parceiros europeus, prolongando-se os psicodramas diários.

No caso de vitória do “não”, o governo grego deve achar-se mais legitimado para prosseguir a sua política irrealista, de exigir mais do que os trunfos que tem na mão justificariam. Com o seu delírio negocial é mais que provável a dificuldade de chegar a acordo.

Como os negociadores europeus não são robôs, mas pessoas com as suas fraquezas humanas, é bem possível (ainda que altamente indesejável) que um desastre ocorresse e a Grécia acabasse por sair do euro de forma caótica. 
Aliás, neste momento as coisas estão muito negras. É altamente improvável que os bancos possam abrir na próxima semana e a curto prazo pode tornar-se inevitável criar uma moeda paralela ao euro.

Economista
Escreve ao sábado

E depois do referendo?


É difícil de acreditar que o referendo grego venha ajudar a encontrar uma solução duradoura.


© Armando Babani/EPA

Em Agosto de 2012 publiquei o meu livro “O Fim do Euro em Portugal?” (Editora Actual, grupo Almedina), em que previa o colapso da moeda única até final desse ano. Em Janeiro desse ano tinha recebido a informação, por um jornalista, de que se preparava a saída da Grécia e acreditava que isso provocaria um efeito dominó que desintegraria o euro.

Nessa altura digladiavam-se duas teses, a da perna gangrenada, defendida pelo ministro das Finanças alemão, segundo a qual cortar a perna (a Grécia) curaria o resto do corpo, e a do dominó, que veio a ser escolhida por Angela Merkel no Outono daquele ano.

Em Abril de 2014 publiquei uma segunda edição do meu livro, actualizada e aumentada, em que a única coisa que tive de corrigir foi a data da previsão do fim do euro. Se voltasse a revê-lo hoje, as questões principais teriam a ver com actualização dos acontecimentos entretanto ocorridos e não com as análises nele contidas.

Com as últimas piruetas do Syriza, chegámos outra vez muito perto da saída da Grécia do euro, embora tenha de reconhecer que o risco de o efeito dominó se materializar não me parece tão imediato como há três anos. No entanto, continuo a afirmar a vulnerabilidade estrutural do euro e a insuficiência das reformas que se têm vindo a realizar e a preparar, pelo que o risco de contágio a prazo permanece.

Apesar de Portugal passar a ser o elo mais fraco após a eventual saída da Grécia, parece-me que os riscos maiores se concentram em países grandes, sobretudo Itália. A questão crucial é que, se Portugal pode ser ajudado, a Itália é demasiado grande e um auxílio a este país tornar-se-á política e financeiramente proibitiva.

Voltando à Grécia, as sondagens sobre o referendo dão um empate técnico, pelo que me parece útil considerar três cenários: 1. vitória do “sim” com eleições posteriores; 2. a vitória do “sim” sem eleições; 3. a vitória do “não”.

Caso haja eleições após a vitória do “sim”, é de admitir que os gregos desistam de votar em quem não percebeu as prioridades do eleitorado. É evidente que os eleitores querem acabar com a austeridade e permanecer no euro, mas é também claro que para eles o segundo objectivo é muito mais importante que o primeiro.

Neste caso haveria condição de acalmar a situação actual, que a irresponsabilidade do Syriza conseguiu criar no pico da estação do turismo, uma das maiores fontes de receita do país. Há notícias de paralisação de importações devido à dificuldade de fazer pagamentos, que ameaçam parar a produção. Espera-se que, nesta hipótese, os parceiros europeus venham a ser mais generosos com os novos interlocutores helénicos, para evitar o ressurgimento do Syriza. Será sempre um caminho muito difícil e o FMI veio – finalmente – reconhecer que terá de incluir um perdão de dívida.

Alguns poderão pensar que haver vitória do “sim” e não haver eleições em seguida não fará sentido, mas o governo grego já foi tão contraditório que mesmo isto parece possível. Seria uma combinação terrível, até porque poderia estar associada a uma maior intransigência dos parceiros europeus, prolongando-se os psicodramas diários.

No caso de vitória do “não”, o governo grego deve achar-se mais legitimado para prosseguir a sua política irrealista, de exigir mais do que os trunfos que tem na mão justificariam. Com o seu delírio negocial é mais que provável a dificuldade de chegar a acordo.

Como os negociadores europeus não são robôs, mas pessoas com as suas fraquezas humanas, é bem possível (ainda que altamente indesejável) que um desastre ocorresse e a Grécia acabasse por sair do euro de forma caótica. 
Aliás, neste momento as coisas estão muito negras. É altamente improvável que os bancos possam abrir na próxima semana e a curto prazo pode tornar-se inevitável criar uma moeda paralela ao euro.

Economista
Escreve ao sábado