Tenho para mim claro que o relacionamento da Justiça com a Comunicação Social não apresenta especificidade devido ao facto de estarmos perante casos de corrupção. Essa relação é o que é independentemente de estarmos perante processos de corrupção, ou de qualquer outro crime.
A pedra de toque para classificar o tipo de relação Justiça – Comunicação Social entre a inexistência de relação ou a existência de um concubinato, por vezes amantíssimo, por vezes violento, é outra e bem distinta.
O que transforma um processo judicial em mais ou menos mediático não é o facto de estarmos perante casos de obtenção ilícita de vantagem, de corrupção, ou de branqueamento de capitais, para utilizar 3 dos mais graves crimes “patrimoniais” do sistema.
Isso o demonstra a estatística de tais tipos de criminalidade e o conhecimento pelos Jornalistas dos processos judiciais penais em que tais tipos de crime eram objecto da investigação ou do julgamento. Recorrendo aos dados estatísticos mais recentes sobre corrupção de 2007 a 2013, (2) fica demonstrado:
Nesse período entraram na Polícia Judiciária, para inquérito, 2589 processos, cuja classificação estatística era a de crimes de corrupção… foram objecto de julgamento criminal (findos em 1.a instância) 370 processos com essa classificação… foram objecto de condenação em 1ª instância 444 Arguidos… foram decididos pelos tribunais superiores 187 processos… Pergunte-se: quantos desses processos foram do conhecimento geral da população? Por quantos se interessou a comunicação social?
Mais: quantos Advogados, Procuradores e Juízes de todos os graus da jurisdição, têm ideia de que nos referidos 7 anos houve 444 condenados pela prática de crimes de corrupção, alguns deles por crimes de corrupção desportiva e de corrupção militar?
Ao invés, nesses 7 anos a Comunicação Social interessou-se por centos de outros casos criminais, em que o que estava em causa não eram obtenções ilícitas de vantagem, nem peculatos, nem branqueamento, nem corrupção… eram homicídios, ofensas à integridade física, sequestros, abusos sexuais, tráficos de droga, fraudes fiscais, burlas, etc. Mas também alguns casos em que um dos tipos penais em questão era o da corrupção. Adiante se verá porquê…
E por fim casos em que não havendo em cima da mesa qualquer acusação por corrupção, alguma comunicação social divulgou os casos como se de corrupção fossem, apesar de o não serem e de saber que o não eram.
Demonstrado fica, portanto, que um caso ser ou não de corrupção é totalmente irrelevante no plano da sua mediaticidade. Os ingredientes para tal mediaticidade encontrar-se-ão na próxima semana.
1 Extraído de Apresentação feita nas “Jornadas sobre Corrupção – Justiça, Comunicação Social e Aspectos Processuais”, Figueira da Foz, 20.06.2015.
2 Boletim Estatístico Temático n.º 32, Dez. 2014, DGPJ.
Advogado
Escreve à sexta-feira