Como vê a situação na Grécia?
A Grécia está numa aventura e a Europa não fará bem se embarcar com a Grécia. Quando se empresta dinheiro a uma pessoa empresta-se com a expectativa de vir a receber, são as normas do mercado. Que haja alguma solidariedade, acho bem, mas a Europa já esteve com a Grécia porque já perdoou 50% da dívida grega. Mas quem enfrenta dificuldades tem de mostrar gestos de boa vontade. Gostava que Portugal tivesse o salário mínimo que a Grécia tem, mas seria uma irresponsabilidade. Então se não tenho condições e se o Estado não gera receitas para pagar aos seus credores como é que vai aumentar a sua despesa de uma forma inusitada? Claro que os gregos precisam, mas nós portugueses não precisamos? A Grécia está a tratar de todo este processo de uma forma totalmente infantil. Dizem que querem continuar na Europa, mas os credores têm de pagar aquilo de que têm necessidade. Querem fazer a sua política, querem aumentar o salário mínimo nacional, querem ter a reforma aos 60 anos. Em Portugal a reforma é aos 65 anos e para o ano vai para os 66 anos. Isto não cabe na cabeça de ninguém, isto é chantagem pura de quem não merece credibilidade.
Não estou de acordo com a austeridade que vivemos em Portugal, nem a forma como foi conduzida, mas o que estamos a viver na Grécia não é uma questão de autoridade é uma aventura perfeitamente inconsciente.
E tendo como exemplo a Grécia, valeu a pena termos sido tão bons alunos?
Passos Coelho deve rezar a Deus Nosso Senhor Jesus Cristo, se é que ele acredita, se não acredita reze a quem quiser, todos os dias de manhã e à noite para que a Grécia saia da Europa, porque se não sair é evidente que os portugueses vão analisar todos os problemas que enfrentaram e toda a carga fiscal que suportam enquanto os gregos não fizeram nada disso e permanecem na União Europeia. É claro que vão condenar quem tomou estas decisões. A melhor prenda política que Passos Coelho poderá ter é a Grécia não ficar na Europa.
Os portugueses reagiram bem de mais à austeridade?
Os portugueses reagiram bem melhor que os gregos porque temos uma capacidade de adaptação maior e uma capacidade de sofrimento muito mais acentuada. Mas a realidade grega também é diferente da nossa, está com uma taxa de desemprego de 25%.
Mesmo assim poderá ser difícil para os portugueses compreenderem um “perdão” na Grécia e a nós não?
Exactamente, e principalmente porque a Grécia não diz que vai corrigir, que vai implementar reformas, que vai criar mecanismos de combate à fraude apoiados pela União Europeia. A Grécia não tem condições para permanecer na zona euro, mas não precisa de sair já. É claro que isso vai ter consequências na União Europeia, mas estou convencido que o governo grego está hoje muito mais consciente dos efeitos negativos de sair da Europa porque se sai vai passar muita fome. Não podem dizer só que vão sair do euro e ponto final, vão ter de assumir os compromissos dessa decisão. E penso que o ministro das Finanças grego não é a pessoa adequada para gerir um processo desses. Tem de ser uma pessoa com mais credibilidade e flexibilidade, porque neste momento a própria Europa também não quer que a Grécia saia porque não é possível mensurar com rigor os efeitos que isso poderá ter porque pode gerar muitas complicações relacionadas com Portugal, com a Itália, com a Espanha e até com a própria França. Por isso é que, para bem dos dois lados, é preferível que haja ponderação. E mesmo que o referendo ganhe o que vai acontecer depois? Os gregos não têm dinheiro e os gregos não têm resposta para isso.