O Ali Babá chinês tem do seu lado 40 burocratas, mas até quando?

O Ali Babá chinês tem do seu lado 40 burocratas, mas até quando?


Criou o maior gigante do comércio online e tornou-se o homem mais rico da China, e também a sua maior estrela. O seu conglomerado, Alibaba, representa 80% do negócio online do país e continua a crescer e diversificar a sua actividade.


Deste lado do mundo está difícil ler o futuro, não porque, como sempre, vem escrito em letras pequeninas no fundo do contrato, mas porque de há uns anos a esta parte já vem menos em inglês que em chinês. Enquanto andávamos encantados com gurus do design tecnológico como Steve Jobs, no horizonte uma pequena figura lançava uma longa sombra a partir do mais novo império do sol nascente.

Ninguém veio do nada como Jack Ma. O homem mais rico da China não começou do zero, começou em terreno negativo. A fraca figura, que se terá devido a problemas de malnutrição na infância, esconde um titã. É fundador do grupo Alibaba, um conglomerado que revolucionou o comércio da mais populosa nação do mundo. A facturação do seu negócio de retalho online resulta no equivalente à actividade combinada do eBay, do PayPal e da Amazon. Não falta muito para que a sua plataforma cruze o limiar do milhar de milhões de utilizadores registados. Aos seus accionistas, Ma oferece a possibilidade de partilharem os lucros. Nada mais.

Quem manda é ele, que conta com um pequeno grupo de pessoas da sua máxima confiança para levar por diante a revolução do capitalismo digital. Com 15 anos de existência, a empresa é hoje não apenas a principal protagonista na furiosa modernização do comércio mundial como na emergência da economia chinesa, que começa a morder os calcanhares da norte-americana. Quando foi idealizada, o fenómeno do e-commerce na China era um sonho extravagante e difícil de partilhar com alguém. Mas Ma teve não só a visão como a capacidade de a traduzir para um pequeno conjunto de investidores – qualquer deles com uma experiência praticamente nula da internet –, juntando menos de 45 mil euros e lançando o Alibaba.

A simples noção de que um homem sem dinheiro, sem contactos nem uma educação no estrangeiro podia vir a tornar-se o grande entrepreneur chinês era uma hipótese mirabolante. Mas naquele país, onde o mais fácil é um sólido plano de negócios tropeçar na imensa cadeia de burocratas do Partido Comunista, Ma fez do seu sonho um colosso que continua sem encontrar um tecto que o impeça de reclamar as alturas e deixar na sua sombra os competidores estrangeiros. De acordo com a “Forbes”, a sua fortuna pessoal é superior a 21 mil milhões de euros. O grupo que controla vale centenas de milhões e mantém uma estreita relação com o governo chinês sem se deixar absorver. No fundo, o pacto que Ma soube negociar com o Diabo passou por convencê-lo de que a melhor estratégia era não interferir muito. Numa entrevista ao “60 Minutos”, explica como o enorme sucesso do Alibaba na criação de milhões de empregos e de um poderoso fôlego na economia do país é um dos elementos de maior estabilização para a China, o que interessa aos seus líderes, que livra de chatices.

O receio de muitos analistas é que um dia o prémio seja demasiado tentador e os burocratas não consigam resistir à tentação de reclamar o maior de todos os tesouros. Por agora, no entanto, a história de Jack Ma é um prenúncio de que o sonho americano pode vir a ser contrafeito pelos chineses, e quem sabe até dar-se melhor num país que tem um mercado interno que de qualquer pequena empresa permite fazer um gigante mundial.

O visionário que Ma é não se limitou a vender mais e melhor que ninguém, não colheu apenas mas tem vindo a cultivar a economia do seu país, tendo lançado uma linha de microcrédito – que não vai muito além dos 7 mil euros para cada negócio –, e usa as informações do historial destas pequenas empresas para avaliar o seu risco, o que leva a que apenas 0,9% dos seus empréstimos não tenham tido retorno. Mas mais importante é o estímulo, a forma como Ma se tornou o capitalista por excelência, dando as condições para que quem tenha uma ideia a ponha em prática recorrendo aos canais do Alibaba. Isto fez de Ma uma superestrela, um dos homens mais influentes do país. Não é difícil consultar o evangelho que vai sendo escrito por estes dias com as inúmeras citações que os seus empregados e admiradores vão recolhendo das suas aparições públicas.

O pequeno homem que nasceu há 50 anos em Hangzhou não parece ter no seu carácter nenhum outro traço genial para lá da sua inabalável perseverança. Hoje conta com a cumplicidade do governo que tem adaptado as leis de modo a dificultar a vida a qualquer concorrente que tente conquistar espaço no mercado chinês. Todos os dias o seu site serve de intermediário a mais de 33 milhões de transacções, e sem ser certo onde este Ali Babá poderá chegar, ao contrário do que acontece nas “Mil e Uma Noites”, nesta história não é impossível que os ladrões lhe fiquem com o tesouro.