Atentados jihadistas. Um dia de matança, centenas de vítimas em cinco países

Atentados jihadistas. Um dia de matança, centenas de vítimas em cinco países


Estado Islâmico reivindicou ataques em Kobane e contra mesquita xiita no Koweit. Onda de ataques começou na noite de quinta-feira no Iraque.


Os atentados de Janeiro em Paris, contra a redacção do satírico “Charlie Hebdo” e contra um supermercado judaico, ainda estão vivos na memória de França e da Europa. Depois desses ataques, que fizeram 17 mortos e vários feridos em Paris, França reforçou a vigilância antiterrorismo, concentrando-se sobretudo nos jovens que partem para o Iraque e para a Síria a fim de se juntarem à jihad do autoproclamado Estado Islâmico (ISIS na sigla em inglês). Mas nada fez prever o ataque de ontem de manhã, aparentemente falhado mas que resultou num morto, a cerca de 40 quilómetros de Lyon.

As pequenas explosões ouvidas pelas 10 horas locais numa fábrica da empresa americana Air Products, em Saint-Quentin-Fallavier, fizeram soar os alarmes e pouco depois era noticiada a descoberta de um corpo decapitado. França e Espanha elevaram de imediato o alerta de terrorismo para o nível mais alto. O corpo pertence a um empresário local e a sua cabeça foi encontrada pendurada nos portões da fábrica, com inscrições em árabe. 

Testemunhas no local descreveram ter visto dois homens com uma bandeira do ISIS a invadir o edifício. Um dos suspeitos foi detido, sendo mais tarde identificado como funcionário do homem decapitado. Chama-se Yassin Sahli, vive em Lyon, tem 35 anos e foi monitorizado entre 2006 e 2008 pelos serviços secretos franceses por “radicalização” e “ligações ao movimento salafista”, disse o ministro do Interior, Bernard Cazeneuve. Um caso que lembra o dos irmãos Kouachi, os principais suspeitos dos atentados de Paris no início deste ano, abatidos depois de uma perseguição de várias horas – também eles vigiados pela secreta francesa anos antes e que mesmo assim levaram a cabo a matança de 7 de Janeiro.

“Não temos dúvidas de que o ataque pretendia fazer explodir a fábrica”, declarou François Hollande, o presidente francês, numa conferência de imprensa. “Tem todas as marcas de um atentado terrorista”, garantiu. A polícia francesa abriu uma investigação ao caso. E pouco depois de ter sido noticiado, um outro atentado contra uma estância turística da Tunísia fazia manchete em todo o mundo.

Infiltrados O dia era de praia e dezenas de turistas banhavam-se em frente ao hotel da cadeia espanhola RIU, na estância de Porto el-Kantaoui, em Sousse, quando começaram a ouvir-se explosões. Em poucos minutos, os funcionários desse e de um outro hotel, o Imperial Marhaba, gritavam aos veraneantes que corressem. “Um homem abriu fogo com uma kalashnikov sobre os turistas e os tunisinos na praia”, descreveu um dos funcionários. “Era um jovem de calções, como se fosse turista.”

Pelo menos 28 pessoas morreram e 39 ficaram feridas, num balanço que poderá ser superior. Uma hora depois do ataque, o porta-voz do ministro tunisino do Interior confirmava que um dos suspeitos foi abatido pela polícia e um segundo conseguiu fugir. Como Hollande, também Mohamed Ali Aroui falou num “atentado terrorista”. 

“Estávamos na praia, os meus filhos estavam no mar e eu tinha acabado de sair da água”, contou pelo telefone à rádio RTE Elizabeth O’Brien, oriunda de Dublin. “Era por volta do meio-dia quando ouvimos o que achámos serem explosões, vi um balão de ar quente rebentar e pensei que era fogo-de-artifício, mas depois percebi que era um tiroteio. Corri para o mar para agarrar os meus filhos e fugimos para o hotel, com os empregados e seguranças a gritarem ‘Corram, corram!’ Estamos neste momento presos no quarto.” Como O’Brien, dezenas de turistas barricaram-se nos quartos com camas e cadeiras a travar as portas até as coisas acalmarem.

Este ataque acontece três meses depois de um grupo de homens armados ter invadido o Museu do Bardo, em Tunes, a capital tunisina, e matado a tiro 37 pessoas, incluindo turistas britânicos, irlandeses, alemães e belgas. Mais tarde seria desvendado que eram filiados na Al-Qaeda para o Magrebe islâmico, mas no caso do ataque de ontem as suspeitas recaem sobre o ISIS. 

Onda de atentados Ainda assim, até ao fecho desta edição, apenas o atentado contra uma mesquita xiita na Cidade do Koweit, ocorrido depois do de Lyon e antes do ataque em Sousse, foi reivindicado pelo grupo jihadista, deixando no ar a hipótese de os acontecimentos dessas 24 horas em várias partes do mundo não terem sido coordenados pelo grupo jihadista. Pelo menos 25 pessoas morreram e mais de 200 ficaram feridas entre os mais de dois mil muçulmanos que participavam nas orações da manhã, em pleno Ramadão, nessa mesquita. Estes três ataques seguem-se a vários outros atentados no Iraque e no enclave sírio-curdo de Kobane, na fronteira com a Turquia, todos ocorridos entre a noite de quinta e ontem.

Depois de terem sido destronados pelos peshmerga (combatentes curdos) em Janeiro, os militantes do ISIS disfarçaram-se de refugiados e de membros das Unidades de Protecção do Povo curdas e voltaram ao ataque em Kobane. Na quinta-feira à tarde, mais de 50 civis morreram em duas ofensivas distintas, mas ao longo do dia de ontem foram surgindo notícias sobre o “pior massacre” até agora ocorrido no enclave curdo, com mais de 150 mortos. 

No Iraque, a onda de atentados começou ao início da madrugada de sexta--feira, com um bombista suicida a fazer–se explodir numa base militar da província de Anbar, causando pelo menos 14 mortos, ao que se seguiu o disparo de rockets contra vários edifícios de Heet, na mesma província. Horas depois, um carro armadilhado era detonado no centro de Bagdade e outra bomba matava dezenas de pessoas em Mahmudiyah, 20 quilómetros a sul da capital.