Os relatos são impressionantes e remetem para um fenómeno de romaria capaz de convencer o mais céptico. Uma hora e 45 à espera. Mais de cem pessoas na fila e 30 graus à sombra. Não é o consumismo típico em torno de um novo Ikea, nem a histeria à volta da abertura de uma Primark. É, “só”, o Santini do Porto.
Ponto prévio um: o Porto tem gelados deliciosos e excelentes gelatarias. Algumas são históricas, como a Neveiros, a Sincelo ou a La Copa. E tem, como meio mundo, várias Häagen-Dazs, que felizmente também se encontram nos supermercados.
Ponto prévio dois: o senhor Attilio Santini, chegado a Lisboa após a Segunda Guerra Mundial, foi provavelmente a pessoa que mais contribuiu para pôr os portugueses a gostar de gelados. Não tenho idade para me lembrar da loja no Tamariz, mas não me esqueço nunca da velhinha gelataria ao cimo Avenida Valbom, onde aprendi que se pode e deve comer gelados o ano inteiro. Os gelados que o senhor Santini simpaticamente me oferecia, como ao que consta oferecia ao pequeno Juanito, mais tarde rei de Espanha, e à generalidade das crianças, eram um ponto alto daqueles meus quase três meses de férias grandes.
A grande conquista do senhor Santini não está só na qualidade dos gelados – i più fini –, mas em ter criado uma marca não apenas do Estoril, de Cascais ou de Lisboa, mas sim do país. O segundo feito decorre de ter sido um italiano cheio de iniciativa e vontade de trabalhar a criar um produto que teve origem em Itália mas se tornou genuinamente português. Os gelados são únicos, mas o exemplo de vida é ainda mais útil e importante. Devíamos aprender com esta história.
O Santini do Porto tem pouco mais de uma semana e está sempre a abarrotar. Motiva excursões e já integra o roteiro turístico local. Peço encarecidamente desculpa aos Neveiros, à Sincelo e à Häagen-Dazs. Deixei de simplesmente poder comer gelados no Porto. Agora posso comer um Santini. Esta cidade é cosmopolita? É. Ao mesmo tempo está cada vez mais artesanal.
Escreve à quinta-feira