O Syriza nasceu como uma força de protesto contra a degradação das condições de vida dos gregos. O Syriza nasceu e, logo, Prometeu.
Muito antes de o Syriza ter prometido, os gregos de outros tempos conheceram outro Prometeu. Em grego, Prometeu significa “premeditação”. E é verdadeiramente espantosa a semelhança entre o Syriza e Prometeu. Ambos praticam, com maestria, a arte de conceber detalhadamente os seus ardilosos planos, com a intenção de enganar os deuses do Olimpo ou os pobres eleitores sedentos de melhor vida.
Diz-se que Prometeu, muito amigo de Zeus, ajudou o deus supremo a contornar a fúria de seu pai, Cronos, que havia sido destronado pelo filho. Ele concedeu ao ser humano o poder de pensar e raciocinar e transmitiu-lhe as mais variadas competências. Mas a preferência de Prometeu pela companhia dos homens tinha deixado Zeus colérico. A raiva desta divindade cresceu ainda mais quando ele descobriu que o seu pretenso amigo o tinha traído.
Prometeu matou um boi e dividiu-o em dois bocados, embrulhados em tiras de couro. Um tinha somente gordura e ossos, enquanto a carne estava reservada para o bocado menor. Prometeu tentou oferecer a parte mínima aos deuses, mas Zeus não aceitou, pois desejava o bocado maior. Prometeu anuiu a este capricho de Zeus, mas este, ao dar-se conta de que havia sido ludibriado, enfurecido, subtraiu da raça humana o domínio do fogo. É quando Prometeu, mais uma vez desejando favorecer a humanidade, rouba o fogo do Olimpo, permitindo à raça humana dominar um elemento da natureza que lhe garantiria a supremacia sobre os demais seres vivos.
Zeus decidiu punir Prometeu, instruindo Hefesto para que o prendesse com correntes durante 30 mil anos, durante os quais ele seria diariamente picado por uma águia, a qual lhe destruiria o fígado. Como sabem, Prometeu foi libertado por Hércules e em seu lugar foi colocado um centauro, Quíron, que, sendo também imortal, cumpria os requisitos que Zeus tinha estipulado para a substituição de Prometeu em cativeiro. Ora, Quíron, que tinha sido atingido por uma flecha, sofria permanentemente de dores lancinantes e aceitou a troca, pois Zeus prometeu-lhe que o tornaria mortal e o deixaria morrer com serenidade.
O Syriza prometeu inicialmente aos humanos gregos uma série de reposições de benesses que, por um lado, pensava não ir ter de cumprir, pois acreditava que não fosse ganhar as eleições. Quando as ganhou ficou, por assim dizer, com o “fogo” nas mãos. De um lado, os restantes deuses do Olimpo actual, como Lagarde, o Banco Central Europeu, Merkel ou o semi-deus Wolfgang Schäuble, coléricos. Do lado oposto, os humanos a quem tudo havia prometido e perante quem não estava em condições de cumprir. E se bem pensou, mais ardilosamente o fez: dividiu a sua estratégia em dois momentos distintos. De um lado, uma mão- -cheia de discursos técnicos e teóricos sobre macroeconomia protagonizados por um dândi e, do outro, um conjunto de viagens de quase chantagem diplomática – do género “ajudem-me ou entrego-me nas mãos de Putin” – protagonizadas por um demagogo inteligente que sabe que, para ele e para o seu Syriza, isto é só o princípio do fim.
Prometeu foi-se, com o tempo. O Syriza ir-se-á, com o mesmo tempo. Os gregos, com o seu orgulho, justificado pelo muito que sofreram, reconhecerão que a Europa já lhes deu e dará sempre muito mais que a Rússia. Libertados das correntes de Hefesto, serão substituídos pelo Syriza, que morrerá serenamente.
Empresário. Escreve à terça-feira