A Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) acusou nesta terça-feira o governo de chantagear as autarquias para pagarem as comparticipações nacionais de obras financiadas pelos novos fundos comunitários e da responsabilidade do poder central, admitindo queixar-se a Bruxelas.
Segundo o presidente da ANMP, Manuel Machado, há organismos da administração central que, "por ordem do governo", estão a “procurar chantagear os municípios" para que as comparticipações nacionais de determinadas obras financiadas pelo novo quadro de fundos comunitários, o Portugal 2020, que são da responsabilidade do poder central, sejam pagas pelas autarquias.
"Essa responsabilidade, que é decorrente do dono da obra, que tem que ser a administração central, não é transferível para o poder municipal", disse Manuel Machado, que falava aos jornalistas na vila alentejana de Ourique, no distrito de Beja, após uma reunião do conselho directivo da ANMP.
Segundo o também presidente socialista da Câmara de Coimbra, "trata-se de uma situação extremamente grave, que põe em causa as obrigações internacionais também do Estado português", porque "cada Estado Membro, perante as regras comunitárias, é obrigado a alocar, no mínimo, 5% do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) aos municípios".
No entanto, "o que está a acontecer é que a escrita, a contabilidade está a ser criativa e está a ser desvirtuada a parceria Portugal 2020", lamentou, declarando: "Não admitimos ser chantageados, que esteja a ser empreendida uma operação de pesca à linha, que desvirtua as regras instituídas e que ofendem a dignidade e a autonomia do poder local".
Manuel Machado apelou ao Governo para "que se corrija o caminho e a trajectória" para "evitar" que a situação "se consolide e dê erro grave", que "pode obrigar" a ANMP "a apresentar uma queixa em Bruxelas contra esta conduta do Estado português", o que "bloquearia a aplicação dos programas operacionais dos fundos comunitários".
Manuel Machado adiantou que a ANMP convocou para o dia 30 deste mês, na sua sede, em Coimbra, uma reunião com todas as comunidades intermunicipais e os membros da associação nas comissões de acompanhamento dos programas operacionais do Portugal 2020 para analisar a situação e, se não houver outra solução, "tomar providencias acrescidas", como apresentar queixa em Bruxelas, o que gostaria de evitar.
Segundo Manuel Machado, as autoridades de gestão dos programas operacionais do Portugal 2020 "têm desencadeado processos de mapeamento, através dos quais os organismos da administração central estão a descarregar obras, acções, operações da responsabilidade da administração central para os programas que têm de ser obrigatoriamente alocados aos municípios".
A situação "está a acontecer na generalidade do território nacional", disse, explicando que o que "está acordado é que sempre que o Estado, seja o poder central ou o poder local, considera que uma determinada obra é importante e há acordo, se ela for da responsabilidade da administração central o programa, a dotação respectiva deve ser reforçada nesse valor".
Segundo Manuel Machado, a ANMP começa na quarta-feira a primeira ronda de reuniões com os partidos políticos para apresentar as conclusões do seu último congresso e "outros documentos importantes" e para os alertar para a "gravidade" dos problemas que hoje denunciou.
Manuel Machado falou também de algumas conclusões do relatório preliminar do estudo de Monitorização da Evolução das Despesas dos Municípios realizado pela Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho.
"O estudo confirma o que temos vindo a dizer. A dívida pública, que tanto tem atormentado os portugueses e estragado a vida a muitos, é da responsabilidade da administração local em apenas 2%, da administração regional em 3% e da administração central em 95%", disse.
Por outro lado, referiu, as transferências do Orçamento do Estado para as autarquias "têm vindo a diminuir", mas, "mesmo assim, os municípios portugueses têm sabido dar o seu contributo responsável para vencer a crise".
Lusa