Império. China soma  e segue com jogo das dívidas, investimentos  e ajuda externa

Império. China soma e segue com jogo das dívidas, investimentos e ajuda externa


Os tentáculos do império financeiro de Pequim estão estendidos pelo mundo. 


Vão da compra de dívida americana aos investimentos directos nos mais variados sectores, nesse e nos países da União Europeia. E a África está a emprestar mais seis mil milhões de euros do que o Banco Mundial.

A onda de investimentos e de compra de dívida externa pela China começou com o novo milénio, quando o então primeiro--ministro Jiang Zemin anunciou uma estratégia económica “de saída”, garantindo que não se iria envolver nos assuntos internos dos Estados onde negoceia e investe. Ao longo dos anos desde essas palavras de Zemin, em 2002, o país tem mantido a promessa, investindo em sectores como a construção em países mergulhados em conflitos civis sangrentos, sem impor regras nem pressões. Quando há problemas no Sudão do Sul, no Iémen ou no Paquistão, três dos países para onde enviou verdadeiros exércitos de mão-de-obra nos últimos anos, limita-se a ir resgatar os trabalhadores quando estão em risco. E sobre questões transnacionais como o conflito na Ucrânia, que está a opor a Rússia ao Ocidente, ou a guerra civil da Síria, ainda chefiada pelo contestado Bashar al-Assad, continua a manter o silêncio – e os investimentos.

Sobre isto, a “Bloomberg” escrevia esta semana que, eventualmente, Pequim terá de enfrentar o óbvio e suspender a promessa de Zemin. Num artigo intitulado “Cinco milhões de razões pelas quais a China poderá entrar numa guerra”, a agência de notícias financeiras explicava na terça que o programa da “Nova Rota da Seda” encetado pelo presidente Xi Jinping – que vai expandir os investimentos externos globais de empresas chinesas acima dos 108 mil milhões de dólares registados em 2013 (contra menos de três mil milhões dez anos antes) – poderá ser o ponto de viragem na passividade política da China em relação ao mundo. Não se metam connosco e não nos metemos convosco, o lema que o regime comunista rendido ao capitalismo tem apregoado, poderá ser difícil de manter, tendo em conta os investimentos em infra-estruturas por toda a Ásia Central, o Índico, o Médio Oriente e a Europa previstos no programa de Xi para relançar a antiga rota da seda.

O mundo rendido Oaugúrio da “Bloomberg” é mero sintoma do crescente império financeiro chinês, que vai de uma ponta à outra do mundo. Senão, veja-se o caso europeu. Se entre 2010 e 2014, a China tinha investido quase 9 mil milhões de euros por ano nos vários Estados-membros da União Europeia (sobretudo no Reino Unido, Itália, Holanda, Portugal e Alemanha) – focando-se nos sectores da alimentação, da energia e no ramo imobiliário –, no final do ano passado, os 153 novos investimentos concretizados na UE rondavam um total de 16 mil milhões.

A estratégia tem dado cartas a vários níveis, inclusivamente uma vitória que Pequim alcançou em Janeiro deste ano. Há 11 anos que os Estados Unidos ocupavam a primeira posição na tabela de países que mais investimento directo estrangeiro atraem, lugar cimeiro do pódio que a China roubou ao arqui-rival em 2014. Segundo o último relatório da Conferência das Nações Unidas sobre Trocas e De-senvolvimento, divulgado no início deste ano, a China acolheu em 2014 cerca de 113 mil milhões de euros em investimentos, desinvestindo ela própria nos EUA – dos 205 mil milhões de euros que tinha aplicado em obras e negócios em solo norte-americano durante 2013, passou a 76 mil milhões no ano seguinte.

Um sorriso africano Também isso tem razão de ser. Neste momento há empresas chinesas a operar em pelo menos 35 dos 50 estados norte-americanos e, depois de quintuplicar os investimentos directos nos EUA entre 2008 e 2010, Pequim virou-se para a dívida externa. No site USgovinfo, o Tesouro americano informa que “governos externos detêm cerca de 46% de toda a dívida pública americana, mais de 4,5 biliões de dólares”. E de todos eles, é dito, “o maior detentor de dívida é a China, com cerca de 1,2 biliões de dólares em contas, divisas e obrigações”, cerca de 8% do total de dívida pública americana.

A grande parte do bolo de investimentos chineses, contudo, está concentrada no continente africano. Números recentes do Instituto Brookings e do Carnegie Endowment citam quase 178 mil milhões de euros em trocas comerciais da China com África em 2012, com destaque para a África do Sul, o seu maior parceiro no continente, mas também Angola – onde, revelava esta semana o jornal “Expansão”, as empresas chinesas parecem estar isentas de impostos. E se nos EUA Pequim tem balançado o investimento directo com a compra de dívida, no caso de África a multiplicação do dinheiro deu-se na ajuda externa. Em 2005 tinha emprestado ao continente 800 milhões de dólares – um valor que, entre 2009 e 2012, aumentou para 10 mil milhões, contra a média anual de 4 mil milhões de empréstimos do Banco Mundial ao continente desde 2006.