Os novos dês


Quatro décadas depois dos três dês do período pós-revolucionário – democratização, descolonização e desenvolvimento – exige-se uma nova trilogia. O desemprego é o mais emergente.


Se o pós-25 de Abril inaugurava os três dês da época – democratização, descolonização e desenvolvimento –, o nosso tempo, quarto décadas volvidas, exige uma nova trilogia. É inequívoco que aqueles objectivos pós-revolucionários se cumpriram. A democracia é uma realidade e, mesmo com todas as suas deficiências e perversidades, funciona. A descolonização foi feita. E o país de 2015, em termos de desenvolvimento económico e social global, não se compara com o país dos anos 70.

No entanto, novos dês nos aguardam. O mais emergente é sem dúvida o desemprego. O desemprego que visita um em cada três dos portugueses com menos de 30 anos. Que levou quase três centenas de milhar à emigração forçada nos últimos tempos. Que anula esperanças, famílias, vidas. 

Com a manutenção das taxas de desemprego da legislatura que agora finda, nada se pode reclamar de sucesso, pelo que controlar e reduzir energicamente o desemprego, em especial o desemprego jovem e o subemprego bem como o desemprego intermitente, é efectivamente o mais premente. O desemprego resulta em boa parte – mas não exclusivamente – da retracção económica, pelo que fomentar a actividade económica e intervir na formação adaptada às necessidades da economia são duas faces da mesma moeda.

Outro dos dês do nosso tempo é a desigualdade. Portugal consegue a proeza de, sendo tão coeso noutros domínios, ser extraordinariamente desigual em termos económicos e sociais. Nesta terra os remediados são ricos e os pobres são paupérrimos. Os ricos a sério, esses vivem noutra galáxia.

Claro que quatro décadas de democracia e desenvolvimento atenuaram algumas dimensões da desigualdade, garantindo um acesso, pelo menos potencial, a prestações e serviços públicos antes inacessíveis. Mas às desigualdades históricas nunca abolidas, que permitem a existência de milhares de trabalhadores efectivamente pobres, juntam-se ainda “novas” desigualdades, em que a desigualdade de género ou a desigualdade em função de regimes laborais e da sua maior ou menor precariedade, para apontar apenas duas, continuam a marcar pontos. E a marcar quotidianos.

Um terceiro dê pode valer para desempenho. O défice de desempenho de que sofremos. Em sentido geral, pensando na necessidade de se ser, do ponto de vista económico, colectivo e cívico, cada vez mais educado, mais exigente, mais profissional, mais ambicioso. De saber planear, programar, corrigir, investir. Exigir mais de nós, dos outros, do Estado, com proporção e critério.

Desemprego, desigualdade, desempenho: uma agenda aparentemente simples, mas que seguramente ainda levará algumas décadas a completar.

Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Escreve à terça-feira 

Os novos dês


Quatro décadas depois dos três dês do período pós-revolucionário – democratização, descolonização e desenvolvimento – exige-se uma nova trilogia. O desemprego é o mais emergente.


Se o pós-25 de Abril inaugurava os três dês da época – democratização, descolonização e desenvolvimento –, o nosso tempo, quarto décadas volvidas, exige uma nova trilogia. É inequívoco que aqueles objectivos pós-revolucionários se cumpriram. A democracia é uma realidade e, mesmo com todas as suas deficiências e perversidades, funciona. A descolonização foi feita. E o país de 2015, em termos de desenvolvimento económico e social global, não se compara com o país dos anos 70.

No entanto, novos dês nos aguardam. O mais emergente é sem dúvida o desemprego. O desemprego que visita um em cada três dos portugueses com menos de 30 anos. Que levou quase três centenas de milhar à emigração forçada nos últimos tempos. Que anula esperanças, famílias, vidas. 

Com a manutenção das taxas de desemprego da legislatura que agora finda, nada se pode reclamar de sucesso, pelo que controlar e reduzir energicamente o desemprego, em especial o desemprego jovem e o subemprego bem como o desemprego intermitente, é efectivamente o mais premente. O desemprego resulta em boa parte – mas não exclusivamente – da retracção económica, pelo que fomentar a actividade económica e intervir na formação adaptada às necessidades da economia são duas faces da mesma moeda.

Outro dos dês do nosso tempo é a desigualdade. Portugal consegue a proeza de, sendo tão coeso noutros domínios, ser extraordinariamente desigual em termos económicos e sociais. Nesta terra os remediados são ricos e os pobres são paupérrimos. Os ricos a sério, esses vivem noutra galáxia.

Claro que quatro décadas de democracia e desenvolvimento atenuaram algumas dimensões da desigualdade, garantindo um acesso, pelo menos potencial, a prestações e serviços públicos antes inacessíveis. Mas às desigualdades históricas nunca abolidas, que permitem a existência de milhares de trabalhadores efectivamente pobres, juntam-se ainda “novas” desigualdades, em que a desigualdade de género ou a desigualdade em função de regimes laborais e da sua maior ou menor precariedade, para apontar apenas duas, continuam a marcar pontos. E a marcar quotidianos.

Um terceiro dê pode valer para desempenho. O défice de desempenho de que sofremos. Em sentido geral, pensando na necessidade de se ser, do ponto de vista económico, colectivo e cívico, cada vez mais educado, mais exigente, mais profissional, mais ambicioso. De saber planear, programar, corrigir, investir. Exigir mais de nós, dos outros, do Estado, com proporção e critério.

Desemprego, desigualdade, desempenho: uma agenda aparentemente simples, mas que seguramente ainda levará algumas décadas a completar.

Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Escreve à terça-feira