Casa dos Caracóis. A fachada da loja, à beira de uma estrada em Campolide, mesmo ao pé das Twin Towers, chama a atenção de quem fica ali parado no trânsito. Nem que seja para pensar: “Que raio de sítio é este para ter uma loja de caracóis?” A resposta vem do próprio proprietário, Nuno Caetano, de 36 anos, dono de um império de caracóis que começa em Marchràa Belksiri, Marrocos, e acaba algures em Brejos de Azeitão. “É a loja que nos está a dar mais projecção a nível de imagem. O sítio não podia ser melhor. Estamos muito contentes. Aliás, tivemos a sorte de o poder comprar, por um valor que não passa pela cabeça de ninguém que trabalha em caracóis.”
Há uns anos também não passaria pela cabeça de Nuno, muito menos pela cabeça do seu pai, Francisco, de 63 anos, que começou a vender caracóis “com uma camioneta pequenina” no Algarve e em Santarém, “consoante dava”. Na altura, há 30 anos, Francisco, de Vila do Conde, também vendia batatas e cebolas para compensar a sazonalidade dos caracóis. “Fazia revenda e fazia distribuição em cafés e praças, mas só no Verão”, conta o seu filho que é agora responsável pelas dez lojas da Casa de Caracóis. “Aos poucos é que se foi dedicando só aos caracóis.”
Empresário do caracol Os bichos começaram a escassear em Portugal, de tal forma que se começaram a comprar caracóis vindos de Marrocos via Espanha. “Ainda há pouco falava sobre isso com um grande cliente de Santarém que também não sabia explicar o fenómeno. Foram escasseando em Portugal e o sabor foi ficando mais amargo e hoje em dia os que se comem vêm praticamente todos de Marrocos. Aliás até são melhores que os portugueses.”
No início, e durante 12 anos, Francisco começou por comprar caracóis ao “maior importador de Espanha”. “Aos poucos fomos eliminando todos os intermediários”, conta Nuno. “Não foi uma coisa que procurámos, foram as circunstâncias. O espanhol começou a portar-se mal e sem razão porque o meu pai era o melhor cliente. Já na altura comprava 700 mil quilos de caracóis e ele não lhe dava a devida atenção.”
Foi então que decidiu ir a Marrocos tratar ele próprio da situação. “Comecei a ir para lá de camião e montámos a empresa”, recorda. “Metemos um empresário do caracol marroquino a trabalhar connosco e construímos o armazém.”
{relacionados}
Com eles têm o “melhor comprador de caracóis” de Marrocos. “Num dia agarra no telefone e arranja 400 mil quilos para pôr em camiões todos os dias.”
A empresa foi-se expandindo de tal forma desde os anos 90 que, à Francisconde (uma abreviatura de Francisco + Vila do Conde, a terra de origem), juntou-se a Francisconde Transporte (de transporte de caracóis), a Francisconde II (empresa detentora das lojas) e a Francisconde Maroc. “Evitamos ao máximo a exportação, até porque temos muito mercado aqui”, conta Nuno. “Fazemos venda por exemplo para a Bélgica e para os Açores e temos grandes grupos como o Pingo Doce ou a Auchan.”
Caixas e baldes Voltando ao ponto de partida, à loja à beira da estrada – e agora de um arraial – em Campolide, desengane-se quem pensa que lá vai comer caracóis em mesas e cadeiras. Nem sequer ao balcão. Aqui há só take-away e tem muito por onde escolher, desde a caixa pequena de caracóis cozidos a 6 euros a um balde grande que leva 5 litros de caracóis por 38 euros. A loja foi a última a abrir, o ano passado, e só funciona metade do ano, quando há caracóis. “Mesmo assim, das dez que temos, é a que vai ficar aberta mais tempo, desde Março até Setembro”, conta Nuno.
Se está à procura de caracóis vivos, aqui pode comprá-los, nem que seja para salvá-los, se também foi daqueles a assinar a petição “Gostava de ser cozido vivo? Ele também não” da Acção Directa – Libertação Animal.
Os animais são selvagens (só um tipo de caracoletas é produzido) e têm várias proveniências, “desde Fez, à zona das montanhas, passando por Casablanca, pela cana de açúcar, até a 120 km para o interior de Marraquexe, apanhados nos pastos e nas oliveiras, nas laranjeiras”, explica Nuno.
O que influencia o sabor do caracol é a zona em que é criado e a sua alimentação. “Por norma cozinhamos o da laranjeira, que é mais carnudo.” E como um bom rei ou príncipe do império, Nuno tem outro “hobby”, como lhe costuma chamar: “Uma fábrica de inox.” Um hobby que aliás costuma conjugar com o negócio de caracóis, que vai do Sul até ao Centro – “no Norte não se vendem quase nada” – para inventar, por exemplo, máquinas em inox, como a de lavar caracóis, um ex-libris da loja de Campolide.