Poder, podemos


Em Portugal, sem Podemos e sem Ciudadanos, a elite de esquerda acha péssimo o sistema eleitoral inglês – porque permitiu eleger um governo conservador com apenas 36 por cento dos votos.


Três semanas depois das eleições locais espanholas, a generalidade dos municípios e das regiões não têm ainda maioria estabilizada e muito menos governo constituído. Os que criticam o sistema eleitoral inglês – pensado para garantir um módico de estabilidade e favorecer executivos de um só partido –, estão a adorar, é claro, o caos instalado em Espanha.

Em Portugal, com ou sem populismo, com ou sem apelo aos sentimentos mais básicos, as candidaturas autárquicas independentes não são uma novidade. Em Espanha, até Maio de 2015, o panorama não era muito diferente. O entusiasmo local com o Podemos e com o Ciudadanos – em ambos os casos, sem qualquer vínculo de proximidade que não fosse o resultante da expressão do voto de “protesto” – veio desalojar os partidos tradicionais, derrotar os candidatos tradicionais (talvez a única parte benigna da história) e promover a incerteza política a um estado permanente e duradouro. 

Lá como cá, os partidos não perceberam nada do que se passou. E a verdade é que perto de 2 mil municípios espanhóis – com Madrid, Barcelona, Sevilha e Valência à cabeça – estão destinados a ter governos de coligação e a viver numa guerrilha diária. Na maior parte dos casos, esses acordos não estão fechados e esses governos não estão sequer garantidos. Com os “novos” partidos a exigirem aos “velhos” coisas tão supostamente regeneradoras como a realização de primárias internas, são raros os municípios a disporem de um mínimo de estabilidade para quatro anos de mandato. 

Tudo isto ao mesmo tempo que a namorada do líder do Podemos é constituída arguida em virtude do alegado favorecimento do pai e do irmão no pequeno ayuntamiento em que exercia funções. Coincidência das coincidências, a “relação” que mantinha com Pablo Iglesias oficialmente terminara nas vésperas da conclusão da investigação. 

Em Portugal, sem Podemos e sem Ciudadanos, a elite de esquerda acha péssimo o sistema eleitoral inglês – porque permitiu eleger um governo conservador com apenas 36 por cento dos votos – e fica maravilhada com o facto de as pequenas minorias dos novos partidos espanhóis (a verdade é que não ganharam qualquer autarquia relevante) ser suficiente para lhes permitir partilhar municípios com PP e PSOE. O poder corrompe? Sim. Pelos vistos, mesmo antes de se lá chegar.

Escreve à quinta-feira

Poder, podemos


Em Portugal, sem Podemos e sem Ciudadanos, a elite de esquerda acha péssimo o sistema eleitoral inglês – porque permitiu eleger um governo conservador com apenas 36 por cento dos votos.


Três semanas depois das eleições locais espanholas, a generalidade dos municípios e das regiões não têm ainda maioria estabilizada e muito menos governo constituído. Os que criticam o sistema eleitoral inglês – pensado para garantir um módico de estabilidade e favorecer executivos de um só partido –, estão a adorar, é claro, o caos instalado em Espanha.

Em Portugal, com ou sem populismo, com ou sem apelo aos sentimentos mais básicos, as candidaturas autárquicas independentes não são uma novidade. Em Espanha, até Maio de 2015, o panorama não era muito diferente. O entusiasmo local com o Podemos e com o Ciudadanos – em ambos os casos, sem qualquer vínculo de proximidade que não fosse o resultante da expressão do voto de “protesto” – veio desalojar os partidos tradicionais, derrotar os candidatos tradicionais (talvez a única parte benigna da história) e promover a incerteza política a um estado permanente e duradouro. 

Lá como cá, os partidos não perceberam nada do que se passou. E a verdade é que perto de 2 mil municípios espanhóis – com Madrid, Barcelona, Sevilha e Valência à cabeça – estão destinados a ter governos de coligação e a viver numa guerrilha diária. Na maior parte dos casos, esses acordos não estão fechados e esses governos não estão sequer garantidos. Com os “novos” partidos a exigirem aos “velhos” coisas tão supostamente regeneradoras como a realização de primárias internas, são raros os municípios a disporem de um mínimo de estabilidade para quatro anos de mandato. 

Tudo isto ao mesmo tempo que a namorada do líder do Podemos é constituída arguida em virtude do alegado favorecimento do pai e do irmão no pequeno ayuntamiento em que exercia funções. Coincidência das coincidências, a “relação” que mantinha com Pablo Iglesias oficialmente terminara nas vésperas da conclusão da investigação. 

Em Portugal, sem Podemos e sem Ciudadanos, a elite de esquerda acha péssimo o sistema eleitoral inglês – porque permitiu eleger um governo conservador com apenas 36 por cento dos votos – e fica maravilhada com o facto de as pequenas minorias dos novos partidos espanhóis (a verdade é que não ganharam qualquer autarquia relevante) ser suficiente para lhes permitir partilhar municípios com PP e PSOE. O poder corrompe? Sim. Pelos vistos, mesmo antes de se lá chegar.

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