Quatro a cinco chávenas de café por dia é o suficiente para boa parte dos problemas não parecerem assim tão dramáticos. A receita é de investigadores da Universidade de Coimbra que lideraram um estudo internacional que agora traz uma nova esperança para a prevenção e tratamento da depressão. A investigação, publicada ontem na revista científica “Proceedings of the National Academy of Sciences” (PNAS), conclui que o consumo de cafeína é eficaz tanto a prevenir como a tratar a doença que mais custos socioeconómicos tem no mundo ocidental.
Uma equipa de 14 investigadores coordenada pelo português Rodrigo Cunha realizou um conjunto de análises e experiências em ratinhos para avaliar em que medida a cafeína interfere na depressão. Os cientistas, oriundos, além de Portugal, da Alemanha, Brasil e Estados Unidos, começaram por sujeitar dois grupos de ratinhos a situações de stresse crónico imprevisível. Simplificando, deixaram os ratinhos ao frio, com fome ou com sede durante vários períodos ao longo de três semanas.
O primeiro grupo consumia cafeína diariamente e o outro não. No final da experiência, a equipa constatou que os animais que consumiram doses equivalentes a quatro a cinco chávenas de café por dia em humanos apresentavam menos sintomas em relação ao outro grupo, apesar de todas dificuldades que atravessaram. Sem cafeína, conta o investigador, as cobaias manifestaram as cinco alterações comportamentais típicas da depressão: imobilidade (deixaram de reagir), ansiedade, anedonia (perda de prazer), menos interacções sociais e deterioração da memória.
A equipa dedicou-se depois a identificar o alvo molecular responsável pelas mudanças no comportamento, tendo concluído que os receptores A2A para a adenosina (que detectam a presença de adenosina, uma molécula que sinaliza perigo no cérebro) são os promotores de todo o processo. O passo seguinte consistiu em medicar os ratinhos deprimidos com istradefilina – um novo fármaco da família da cafeína que começou recentemente a ser usado em doentes de Parkinson. E em apenas três semanas de tratamento, o medicamento foi capaz de inverter os efeitos provocados pela exposição inicial a stresse crónico imprevisível e os animais recuperam para níveis semelhantes aos do grupo de controlo (constituído por ratinhos saudáveis).
A dúvida, agora, é saber quando este fármaco poderá estar no mercado. Antes disso, ressalva Rodrigo Cunha, é necessário fazer um ensaio clínico: “A transposição para a prática clínica pode ser bastante rápida, assim haja vontade da indústria farmacêutica, porque estamos perante um fármaco seguro, já utilizado nos Estados Unidos e no Japão para o tratamento da doença de Parkinson.” O estudo foi financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), Departamento de Defesa dos EUA e The Brain & Behavior Research Foundation (NARSAD).