Em geral, os portugueses acham-se colectivamente insignificantes por acharem que o país é pequeno. E assim tentam explicar a efectiva irrelevância de Portugal no contexto internacional.
Através dessa “técnica” conseguem (ou conseguimos) justificar uma vasta panóplia de fatalidades. Para os políticos, este álibi é um maná. Ouve-se diariamente que não fazemos isto porque a União Europeia não deixa ou que fomos forçados a cortar naquilo porque é uma norma da comunidade.
Um dos argumentos repetidos em refrão tem a ver com a alegada dimensão do país e a sua localização periférica.
Em bom rigor, esta tendência até tem antecedentes históricos, avultando entre muitos o sinistro Ultimato do tenebroso aliado britânico. Até Salazar invocava a “guerra que nos é imposta do exterior” para explicar o conflito colonial em que o país se atolou. Era a forma encontrada para negar a real existência de líderes naturais de Angola, Moçambique, Guiné e Cabo Verde.
Na ladainha quotidiana dos governos mais recentes houve sempre alegações que nos remetem a uma dimensão de pigmeu de uma Europa que impõe ditames e obrigações para rectificar normas, mudar ou transpor leis, mesmo que elas retirem direitos sociais a velhos e crianças por causa do santíssimo equilíbrio orçamental. E, claro, nem é preciso falar do que fomos obrigados a vender a interesses externos pelo preço da uva mijona, fazendo com que perdêssemos os dividendos de empresas sadias em troca de capital financeiro e não de investimento produtivo. Com essa fábula chegou dinheiro, perdemos empregos e os lucros foram para fora do país, amortizando o capital num ápice. A própria dívida pública que a receita das vendas supostamente iria atenuar não fez outra coisa a não ser crescer. Ora, talvez tudo isto não tenha de ser sempre assim.
Vejamos. Portugal não é pequeno dentro da União Europeia (a comunidade mais próspera do mundo). Objectivamente, é o décimo primeiro em termos de população. Está enquadrado num grupo de cinco Estados que andam pelos dez milhões de habitantes. São eles a Grécia (esse país-problema), a Bélgica, a República Checa e a Hungria, embora seja o que mais população está a perder.
Um pouco abaixo deste grupo há a riquíssima e influente Suécia. Daí para cima, só temos dois países médios e de importância bem diferente do ponto de vista económico, mas ambos fundamentais nas suas zonas. Trata-se da Holanda, com 16 milhões de habitantes, e da Roménia, com 21 milhões. Mais populosas e importantes, encontramos nações de grande dimensão demográfica e económica. Polónia (em crescimento rápido), Espanha, Itália, Reino Unido, França e Alemanha variam entre os 38 e os 82 milhões de habitantes e ocupam os tops do ranking em muitas áreas. No entanto, atrás de nós estão nada menos do que 17 Estados.
Portugal, com as fronteiras mais antigas da Europa, tem, entretanto, atributos únicos. É o caso de uma diáspora de milhões de pessoas que é proporcionalmente maior que a de qualquer outro país europeu. Através dela existe um potencial de influência disseminado pelo mundo e constituído por várias gerações que, em regra, estão bem adaptadas e são reconhecidas.
O nosso país tem uma das maiores e mais ricas zonas económicas exclusivas do mundo, que integra a Madeira e os Açores e resulta de uma costa continental gigantesca. É um espaço imenso capaz de gerar uma colossal economia do mar que não existe por ausência de uma política integrada e nacional. Tudo isto é-lhe proporcionado por uma posição geoestratégica atlântica única que foi durante séculos a base da sua afirmação mundial. Hoje em dia há uns arrufos, umas exposições, umas conferências e umas proclamações eleitorais sobre esse potencial, mas não passa de bolota de boca.
Outro grande recurso é a circunstância de o português ser a sexta língua nacional mais falada no mundo, e logo em países emergentes de grande influência regional e até mundial. Com base no idioma e em relações históricas formou–se a CPLP, uma organização que, além da dimensão cultural e política, se prevê que dentro de alguns anos produza 20% do petróleo mundial.
Apesar desses trunfos e da projecção que lhe dão universalmente o turismo e o futebol, Portugal não tem uma influência correspondente ao seu potencial. Colectivamente, não conseguimos ou não sabemos impor os nossos trunfos. Os governos sucedem-se, mas nada muda substancialmente.
Para contrariar esta tendência permanente precisamos de definir uma verdadeira política externa e deixarmos de vez a via dos negócios estrangeiros ou da mera diplomacia. Não temos de ser macios, mercantilistas e subservientes em relação a tudo e todos. Pelo contrário, temos de definir e impor os nossos interesses e projectos, fazendo ouvir claramente a nossa voz. Neste tempo pré–eleitoral, talvez não fosse pior reflectir–se um pouco sobre esta relevante matéria. Em vez de andarem a falar de coisas vagas ou venderem banha da cobra, os nossos políticos fariam melhor em concentrar-se na forma de aproveitar efectivamente o nosso potencial. E nada melhor do que o dia 10 de Junho para começar de vez essa tarefa ciclópica.
Jornalista
Director da Newshold