Declaração de interesses prévia: o autor deste texto coordena no Gabinete de Estudos do PS o grupo de trabalho na área da justiça não penal, desde Março deste ano. Esta tarefa permitiu-lhe ao longo dos últimos meses verificar directamente como foi intenso, participado e alargado o esforço de chegar a um conjunto de propostas, nesta como noutras áreas, que pudesse simultaneamente representar uma alternativa política e ideológica que se considera mais acertada para o país e, ao mesmo tempo, respeitar regras claras de probidade e de contenção na gestão dos recursos públicos.
Estas propostas são neste momento públicas e correspondem ao exercício mais determinante que um partido pode assumir quando se candidata a eleições: construir e apresentar as suas ideias, as suas medidas e os seus compromissos, vertidos num programa eleitoral, o que foi concluído, no caso do PS, no passado sábado com a sua votação por todas as estruturas representativas do partido.
Poder-se-á perguntar, até com alguma lógica, para que serviu este tipo de legitimação formal pelo voto de um programa eleitoral, longo e complexo, que não apenas como espectáculo incensário de um líder? No entanto, apresentou desde logo duas virtudes. A de mobilizar um largo número de militantes e de simpatizantes no sentido de conhecerem efectivamente o programa do seu partido. E a de valorizar notoriamente na actuação do partido aquilo que é a sua razão de ser: as medidas políticas e o sentido estratégico com que se apresenta a votos.
O modelo e a energia com que este processo foi assumido nos últimos meses pelo PS de António Costa levaram, aliás, a que outros partidos, desde logo a coligação que neste momento governa, tivessem de rapidamente simular o mesmo tipo de processo. Pode ser que isso conduza a uma campanha eleitoral que valorize o confronto de ideias e de propostas. E uma campanha com essa dimensão só pode positiva, porque terá condições para ultrapassar o clubismo fanático, o cinismo blasé ou a pura recusa na participação.
São todos iguais? Prometem todos o mesmo? Não. Pena é que haja tão pouca responsabilização pelo cumprimento e pelo incumprimento dos programas. Nisso, a imprensa e os jornalistas seriam decisivos – e não o são. Seria bom ir à procura dos programas eleitorais de 2011 dos partidos que assumem o governo e compará-los com a realidade de hoje. O que foi feito, o que não foi, o que foi abandonado ou pervertido e porquê. E não se bastar com uma resposta geral sobre troikas e financiamento, meio caminho andado para não se perceber nada sobre nada. Nem sobre o passado nem sobre o futuro.
Professor da Faculdade de Direito
da Universidade de Lisboa
Escreve à terça-feira