Sete momentos para perceber  como o PS está a preparar as eleições

Sete momentos para perceber como o PS está a preparar as eleições


Alinhar, juntar, prometer, unir, abrir e atacar. António Costa fez isto tudo na Convenção onde aprovou o seu programa eleitoral. E recuou ao exemplo de um líder vitorioso… saltando outro: Sócrates.


Quase parecia um congresso, mas com intervenções sectoriais, organizadas com independentes e não apenas entregues a militantes ou à disputa político-partidária. Nos corredores não houve o reboliço das listas para concorrer a órgãos nacionais do partido, mas nem por isso a agitação deixa de passar pelas veias de um partido que tem a ambição de ser o próximo (em apenas cinco meses) no poder. Todos os que sobem ao palco, todos aqueles com que o líder perder dois minutos de conversa lateral, tornam-se candidatos a constarem na lista de deputados do PS, ou ainda entram directamente para outra lista que mais agitação provoca: a dos ministeriáveis. É assim um partido à beira do poder.

01. Alinhar o discurso de contraponto ao do rival “instável”
“Alternativa de confiança”, garante o slogan de António Costa repetido à exaustão nos dois dias de Convenção Nacional do PS. “Alternativa”  – “o PS não é a mesma coisa que a direita”, disse Ferro Rodrigues” – não bastava a um partido que tem opositores a colarem-lhe os rótulos de “despesista” e “financeiramente irresponsável” mesmo à porta das eleições. A “confiança” aparece para compor o quadro e tentar distanciar o partido da ideia de “instabilidade” que o PS cola à coligação. “Temos de parar com estes quatro anos de sobressalto na vida da classe média, em que ninguém sabe o salário que vai ter, as pensões e os impostos que tem de pagar. É preciso parar com esta política”, reclamou no seu discurso de encerramento dos trabalhos.

02. Juntar um inimigo em Belém, também conhecido por “o outro”
A campanha vai correr em duplo carril. Há legislativas, mas presidenciais logo a seguir. E na Convenção, os socialistas até tiveram sentado na primeira fila o candidato presidencial (quase certo do partido) António Sampaio da Nóvoa. No púlpito, por cada vez que a palavra “Presidente” ouo nome “Cavaco Silva” eram pronunciados, a sala levantava-se em assobios. E foram muitas, com Manuel Alegre a ter papel especial nesta matéria. Debateu-se com ele em duas eleições presidenciais e foi ao Coliseu dos Recreios pedir para o PS “falar socialista”, em vez de “tecnocratês”, mas também atirar: “Temos de governar pelas pessoas, os direitos sociais, o combate à desigualdade e a defesa da Constituição contra a qual a direita governou, com a bênção de Cavaco Silva”. O Presidente alvo dos socialistas até num vídeo de campanha, colado à acção do executivo que, dita a voz off, “como diz o outro: nunca se engana e raramente tem dúvidas”

03.  Claro, uma mão cheia de promessas
“O emprego [a prioridade das prioridades do PS] não cresce sem aumento da procura interna e isso não acontece sem mais rendimentos”. Nesta frase de António Costa está o resumo do seu plano de recuperação económica e também a justificação para medidas que ultrapassam a coligação na devolução de rendimentos. No seu programa eleitoral, o PS promete baixar mais impostos e mais depressa do que PSD e CDS, devolve poder de compra (retira cortes salariais na função pública mais rápido) e desce contribuições para a Segurança Social. Este último ponto acabou por lhe valer uma mancha na foto final da Convenção. Oseu programa eleitoral não foi aprovado unanimemente, Rosário Gama (dirigente do PS e presidente da Associação de Pensionistas e Reformados) votou contra por temer os riscos que uma descida da TSU dos trabalhadores possa trazer para a sustentabilidade da Segurança Social. Houve também sete abstenções. 

04. Criar imagem de unidade
“Somos contra o pensamento único no PS. Muito obrigado pelo teu voto contra”. A frase é de Costa, dirigida a Rosário Gama, até porque aquele voto contra não era uma novidade e a imagem de união é essencial nesta altura do campeonato. Foi por isso que Costa chamoua intervirem na Convenção Helena Roseta (ex-militante do PS), Maria de Belém (ex-presidente do partido na era de António José Seguro) e Francisco Assis (que também apoiou Seguro e no último congresso abandonou os trabalhos irritado com a esquerdização do partido). E até Pedro Nuno Santos, deputado e dirigente menos alinhado com alguma medidas (como a da TSU) foi colocado a moderar um painel de debate e não deixou de notar isso: “Normalmente procuram moderar-me, desta vez convidam-me para moderar”.
 
05. Dose de independentes
Faz parte do período eleitoral: compor o quadro partidário com um punhado de independentes que se envolveram na elaboração dos programas eleitorais. Costa tinha para mostrar o grupo de economistas que desenhou o cenário macroeconómico do PS, mas também outros da área da saúde (João Correia, Adalberto Campos Ferreira e Marta Temido) ou professores universitários (João Pedro Vieira António Sousa Pereira, Miguel Cabrita, João Costa, Miguel Caldeira Cabral).

06. Explorar adversários descontentes
O cabeça de cartaz do primeiro dia da Convenção do PS foi o fundador do PSD António Capucho. Distante (e há um ano expulso) do partido onde militou desde a fundação, Capucho levantou a sala ao declarar apoio ao PS nas legislativas e a dizer que Costa “merece” a sua “confiança no plano pessoal e político”. Já tinha apoiado Francisco Assis nas europeias, resta agora saber se haverá passo seguinte (ver entrevista ao lado).
 
07. Apagar o passado vitorioso que incomoda
No fim dos trabalhos, Costa lembrou o que na mesma sala o PS fez há 20 anos: o Estados Gerais para conquistar o poder em 1995 por AntónioGuterres. Pelo meio houve outro líder socialista a conquistar o poder (e com maioria absoluta, coisa que Costa também quer), mas o actual líder do PS não lhe tocou no nome: José Sócrates. Escapou por horas a que a alteração das medidas de coação de Sócrates, detido desde Novembro, caísse em cima da Convenção. A prisão já tinha caído em cima da sua eleição como secretário-geral e do congresso que se seguiu. Já estava de saída do Coliseu quando foi confrontado com a notícia: “Decisões judiciárias, não comento”.