Nos últimos quatro meses aconteceu pelo menos três vezes. Na cadeia de Santa Cruz do Bispo, vários reclusos tiveram de dormir num corredor por falta de espaço nas celas. Os guardas, denuncia o Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional (SNCGP), foram obrigados a improvisar até que fosse encontrada uma solução. “Deixou-se uma cela destrancada, onde estavam outros reclusos, para que os que dormiam no corredor pudessem ter acesso à casa de banho”, conta o presidente do SNCGP. Jorge Alves acrescenta que a situação mais recente aconteceu há menos de um mês e que os presos ficaram dois dias no corredor.
Os dados da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais (DGSP) confirmam o problema da lotação das cadeias: dos 50 estabelecimentos prisionais espalhados pelo país, só 15 não estavam sobrelotados a 31 de Dezembro. E há cadeias em que já existe o dobro dos reclusos previstos. É o caso da prisão do Porto, que tem capacidade para 686 presos, mas alberga mais de 1200. Ou de Setúbal, cujo estabelecimento prisional tem capacidade para 169 presos, mas acolhia, em Dezembro, 350. E ainda a prisão de Lisboa apresenta uma taxa de sobrelotação superior a 30%: 887 vagas são ocupadas por 1277 presos.
Mais reclusos Apesar de as cadeias estarem a rebentar pelas costuras, o número de reclusos continua a aumentar. O mais recente relatório da DGPJ, divulgado a semana passada, revela que só nos últimos quatro anos o número de presos subiu 20,6%. Em 2010 havia 11 613 reclusos, enquanto que em Dezembro de 2014 o número já ultrapassava os 14 mil (14 003). E analisando as estatísticas quinzenais mais recentes, publicadas no site da direcção-geral, verifica-se um novo aumento: em Maio havia 14 206 presos e, no mês passado, 14 272.
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A sobrelotação, diz o SNCGP, tem obrigado a que celas individuais passem a albergar vários reclusos, apesar de o Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade prever espaços individuais para os detidos. “Só em casos excepcionais é que devem existir celas partilhados, mas a única cadeia onde a lei é cumprida é Vale dos Judeus”, conta Jorge Alves.
Os guardas garantem também que o excesso de reclusos “dificulta a segurança” e a realização de procedimentos como buscas e batimento de grades. “É evidente que a sobrelotação dificulta a vigilância e torna-se muito difícil garantir a segurança. É uma sorte não morrerem mais pessoas nas cadeias”, avisa o presidente do sindicato. Outra consequência “inevitável” das prisões sobrelotadas é o aumento de conflitos. “Quanto mais pessoas, menor é o espaço individual de cada recluso, o que aumenta a conflitualidade. Com cadeias cheias, qualquer situação é suficiente para gerar um conflito”, garante o presidente do sindicato.
Os guardas queixam-se ainda de que o aumento de reclusos não tem sido acompanhado pela contratação de mais funcionários. Actualmente existem 4141 guardas prisionais e até está a decorrer um concurso para a admissão de mais 400 mas, segundo Jorge Alves, os novos elementos só deverão entrar em funções em 2017. O quadro geral das prisões previa a existência de 5217 guardas, mas foi revisto e, desde Janeiro, com a entrada em vigor do novo estatuto profissional, passou a contemplar apenas 4903 profissionais. Uma decisão da DGSP que o sindicato classifica de “irresponsável”. “Em vez de se procurar aumentar o número de guardas prisionais, até perante o crescimento do número de reclusos, optou-se por se baixar o mapa de pessoal”, critica o SNCGP.
Falhas na segurança Em algumas cadeias, as torres de vigilância são desactivadas durante a noite por falta de guardas. E há casos, como o da prisão de Setúbal, em que à hora de almoço existe apenas um único guarda na zona prisional para centenas de presos. Mesmo assim, o número de fugas baixou no ano passado. Em 2011, segundo o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), houve seis evasões, 14 em 2013, sete em 2013 e seis no ano passado.
O i conta aqui como é viver em seis das maiores prisões portuguesas. Segundo o SNCGP, há cadeias em que os reclusos só têm medicamentos e roupa de cama porque as famílias levam de casa. E na maior prisão do país, a de Lisboa, faltam detergentes de limpeza e até papel higiénico.