Foi o inevitável, Blatter


Era o segredo mais mal escondido do futebol. 


© Ennio Leanza/EPA

A FIFA tinha uma estrutura forte mas deficiente. Havia hábitos demasiado enraizados mas viciados. O prédio construído por Joseph Blatter durante 17 anos estava a definhar e seria apenas uma questão de tempo até chegar o fim, precipitado no momento em que os EUA decidiram meter o nariz num desporto que não os envolve tanto como basquetebol, futebol americano ou basebol mas que era uma guerra destinada a ser travada.

{relacionados}

Blatter foi vítima da sua ambição, da sua rotina. Pode vir agora dizer que sempre travou uma guerra pela limitação de mandatos mas nem depois de garantir que não se recandidataria mais, conseguiu fugir à tentação de prolongar o estatuto de poder. E com ele, todos os que aproveitaram essa posição ao longo dos últimos mandatos.

O suíço aguentou um golpe. Aguentou dois. Aguentou três. E manteve-se de pé. Mas durante a última semana, as vagas de assalto enfraqueceram-no e à própria FIFA. Não o suficiente para perder o apoio de 133 dos 206 votos válidos nas eleições de sexta-feira, mas para tornar o peso sobre os ombros insustentável. Pode vir agora com um discurso à Nixon, garantindo que sempre procurou o melhor para a FIFA e que não há nada que goste mais do que o futebol, mas o discurso chega demasiado tarde. A FIFA perdeu o respeito do mundo e a culpa principal é de Blatter. E foi essa perda de respeito – arrastada até patrocinadores e federações importantes (veja-se a postura de Platini) – que serviu de gota que fez transbordar um copo cheio de água fétida de onde ninguém queria beber.

Hoje é um dia histórico mas a tempestade ainda vai durar antes de chegar a bonança. A demissão até pode ter sido estratégica, numa tentativa de evitar que muitos outros escândalos viessem a lume, mas a investigação vai continuar. Os culpados vão continuar a aparecer e Blatter não pode sentir que vai ser apenas mais uma vítima no meio deste processo. Para o futebol mundial, para a FIFA enquanto conceito, os próximos tempos serão difíceis. Haverá muita coisa a ser posta em causa e não é garantido que o “sangue novo” garanta uma melhoria imediata. Vai ser difícil, muito difícil, e será necessário existir um verdadeiro consenso que não se construa à base do dinheiro por baixo da mesa mas sim da confiança, respeito e interesses colectivos comuns. É esse o desafio.