La mirada ajena


O olhar do outro perturba. Já olhar os outros serena algumas angústias. 


Olhando para o país vizinho, o que poderemos aprender com as eleições do passado domingo?

O olhar do outro perturba. Já olhar os outros serena algumas angústias. Olhando para o país vizinho, o que poderemos aprender com as eleições do passado domingo? A fazer fé no silêncio oficial dos partidos políticos portugueses, muito pouco.

Permita-me, caro leitor, quebrar tal silêncio. Estou consciente dos habituais disclaimers em relação à impossibilidade de leituras nacionais de eleições regionais e autárquicas ou das diferenças entre os sistemas partidários (mais atomizado, com partidos regionais, mas ainda assim com os dois maiores partidos a somarem mais de 50% dos votos, no caso espanhol) e eleitoral (parlamentarizado no caso das comunidades autónomas e autarquias espanholas, sem garantia de formação de governo por parte do partido mais votado).

Comecemos pela grande vitória do Bloco de Esquerda (BE) local, conhecido no mundo como Podemos, vitória traduzida não tanto no resultado em número de votos (em que ficou atrás do PSOE) ou de mandatos, mas no extermínio da versão local do PCP, a Izquierda Unida, que quase desapareceu do mapa eleitoral. Não tenho a menor dúvida de que a eliminação pela esquerda do PCP foi um dos grandes sonhos de Francisco Louçã. Até ver, será mais provável a irrelevância futura do BE e a sua posterior desaparição, de par com um reforço da votação do PCP (resultante em grande medida do aumento da abstenção).

A marca branca do Partido Popular (PP), o Ciudadanos, teve piores resultados do que o prometido pelas sondagens, propondo um programa de centrismo liberal (um curioso ressuscitar daquilo que Adolfo Suárez quis para a UCD). Os Ciudadanos também fizeram uma vítima, contribuindo para o suicídio político de Rosa Díez e do seu tamagotchi partidário, a UPD.

À semelhança do que aconteceu nos piores momentos de Passos, o baronato do PP espanhol começa a conspirar e a preparar as candidaturas alternativas à liderança, numa tentativa de acusar o governo de Madrid pela perda das maiorias absolutas nas comunidades autónomas. Mariano Rajoy terá de fazer alguma coisa para garantir que tudo fica na mesma, fazendo um roque entre a hierarquia do partido e a composição do governo.

Regressando a Portugal, e pensando nas próximas eleições legislativas, não se espera nada de semelhante em matéria de renovação do sistema partidário. O Livre e derivados poderão ser uma marca branca do PS mas com resultados mínimos e, pelo PDR, Marinho e Pinto insiste em fazer o impossível para garantir resultados eleitorais modestos. PSD/PP e PS somam, de acordo com as sondagens, quase 75% das intenções de voto e nenhum tem perspectivas de maioria absoluta.

Não obstante, o pós-eleições em Espanha e Portugal tem um elemento comum: a política de alianças entre os partidos tradicionais e novos partidos e, no caso espanhol, a leitura nacional que será feita de tais alianças (com destaque para as coligações negativas contra o PP) a pensar nas eleições legislativas.

O prémio de maioria é bastante mais modesto no sistema eleitoral português do que no espanhol, pelo que qualquer dos dois grandes blocos políticos pode ficar a 5% da maioria absoluta, com a possibilidade de a encontrar junto dos novos partidos políticos com assento parlamentar. 

A tentação de governar em minoria, com ou sem bênção de Cavaco Silva em fim de mandato, pode contribuir para acelerar o resultado de fenómenos de transferência de votos à la PRD (da esquerda ou da direita para o novo partido e depois em direcção contrária, com desaparição do partido que permitiu a transferência), forçando uma bipartidarização com novas eleições, desta vez antecipadas.

Escreve à sexta-feira

La mirada ajena


O olhar do outro perturba. Já olhar os outros serena algumas angústias. 


Olhando para o país vizinho, o que poderemos aprender com as eleições do passado domingo?

O olhar do outro perturba. Já olhar os outros serena algumas angústias. Olhando para o país vizinho, o que poderemos aprender com as eleições do passado domingo? A fazer fé no silêncio oficial dos partidos políticos portugueses, muito pouco.

Permita-me, caro leitor, quebrar tal silêncio. Estou consciente dos habituais disclaimers em relação à impossibilidade de leituras nacionais de eleições regionais e autárquicas ou das diferenças entre os sistemas partidários (mais atomizado, com partidos regionais, mas ainda assim com os dois maiores partidos a somarem mais de 50% dos votos, no caso espanhol) e eleitoral (parlamentarizado no caso das comunidades autónomas e autarquias espanholas, sem garantia de formação de governo por parte do partido mais votado).

Comecemos pela grande vitória do Bloco de Esquerda (BE) local, conhecido no mundo como Podemos, vitória traduzida não tanto no resultado em número de votos (em que ficou atrás do PSOE) ou de mandatos, mas no extermínio da versão local do PCP, a Izquierda Unida, que quase desapareceu do mapa eleitoral. Não tenho a menor dúvida de que a eliminação pela esquerda do PCP foi um dos grandes sonhos de Francisco Louçã. Até ver, será mais provável a irrelevância futura do BE e a sua posterior desaparição, de par com um reforço da votação do PCP (resultante em grande medida do aumento da abstenção).

A marca branca do Partido Popular (PP), o Ciudadanos, teve piores resultados do que o prometido pelas sondagens, propondo um programa de centrismo liberal (um curioso ressuscitar daquilo que Adolfo Suárez quis para a UCD). Os Ciudadanos também fizeram uma vítima, contribuindo para o suicídio político de Rosa Díez e do seu tamagotchi partidário, a UPD.

À semelhança do que aconteceu nos piores momentos de Passos, o baronato do PP espanhol começa a conspirar e a preparar as candidaturas alternativas à liderança, numa tentativa de acusar o governo de Madrid pela perda das maiorias absolutas nas comunidades autónomas. Mariano Rajoy terá de fazer alguma coisa para garantir que tudo fica na mesma, fazendo um roque entre a hierarquia do partido e a composição do governo.

Regressando a Portugal, e pensando nas próximas eleições legislativas, não se espera nada de semelhante em matéria de renovação do sistema partidário. O Livre e derivados poderão ser uma marca branca do PS mas com resultados mínimos e, pelo PDR, Marinho e Pinto insiste em fazer o impossível para garantir resultados eleitorais modestos. PSD/PP e PS somam, de acordo com as sondagens, quase 75% das intenções de voto e nenhum tem perspectivas de maioria absoluta.

Não obstante, o pós-eleições em Espanha e Portugal tem um elemento comum: a política de alianças entre os partidos tradicionais e novos partidos e, no caso espanhol, a leitura nacional que será feita de tais alianças (com destaque para as coligações negativas contra o PP) a pensar nas eleições legislativas.

O prémio de maioria é bastante mais modesto no sistema eleitoral português do que no espanhol, pelo que qualquer dos dois grandes blocos políticos pode ficar a 5% da maioria absoluta, com a possibilidade de a encontrar junto dos novos partidos políticos com assento parlamentar. 

A tentação de governar em minoria, com ou sem bênção de Cavaco Silva em fim de mandato, pode contribuir para acelerar o resultado de fenómenos de transferência de votos à la PRD (da esquerda ou da direita para o novo partido e depois em direcção contrária, com desaparição do partido que permitiu a transferência), forçando uma bipartidarização com novas eleições, desta vez antecipadas.

Escreve à sexta-feira