Os filmes de Stanley Kubrick e nós lá no meio

Os filmes de Stanley Kubrick e nós lá no meio


Depois da exposição, “New Perspectives” é o livro que mostra o cineasta como nunca o tínhamos visto.


Antes de ser livro foi exposição, mas passando para o papel a ideia continua a mesma: descodificar a linguagem, a técnica e a vontade de Stanley Kubrick (1928-1999). Talvez descodificar seja abuso de confiança. Os filmes do realizador americano continuam a ser descobertos como epifanias porque foram feitos de maneira a deixar os comuns mortais presos a um mundo que não encontram em parte nenhuma a não ser na ideia de Kubrick. Daí que descodificar seja um exagero. Serve este “New Perspectives” para nos perdermos no meio do encantatório delírio. Ou então podemos usar só a tradução literal, “novas perspectivas”. Também está certo.

Não fez tantos filmes como outros cineastas contemporâneos, mas e então? Transformou “Lolita” (1962) numa obsessão própria e, ao mesmo tempo, naturalmente óbvia, passível de acontecer em todo o lado, em qualquer parte. Vindo do mesmo tipo que fez “2001: Odisseia noEspaço” (1968) merece que nos perguntemos: “Como é que ele o fez?” E também por “Barry Lyndon” (1975) ou“De Olhos bem Fechados” (1999), até porque quantos aventureiros contam tanto como duas pessoas, uma câmara e a música perfeita no momento certo?  

Mas isto são devaneios que qualquer um que ponha os olhos no trabalho de Stanley Kubrick, de quem quer que vá por ali sem qualquer outra ambição a não ser perder o norte. Porque há os que, carregados de fascínio e admiração, vão mais longe para tentar explicar, para fazer dos filmes ensinamentos. Foi mais ou menos o que aconteceu com “Stanley Kubrick: New Perspectives” quando se passeou pelo mundo; é o mesmo que se lê nestas 260 páginas.

Esse exercício é feito por críticos e académicos, por cinéfilos que são também cientistas da matéria e que nesta demanda tiveram acesso ao arquivo de Kubrick, a material nunca antes visto e que, das duas uma, ou deu mais hipóteses para chegar mais longe ou complicou ainda mais a tarefa dos heróis que assinam o livro. Contas feitas, de uma maneira ou de outra, ganhamos nós – assim tudo bem.

A ideia de “New Perspectives” é generosa. Procura revelar mais sobre determinadas técnicas que Kubrick utilizou; os métodos de trabalho quando estava em rodagem, não só face ao que filmava mas também em relação às pessoas com quem trabalhava; a quem o influenciou e como, associando essas relações criativas ao próprio trabalho de Kubrick; aos temas que escolhia, de onde vinham e porque se transformavam em filmes; e há até uma abordagem menos cinematográfica mas nem por isso desinteressante: a crítica e os filmes de Kubrick, as técnicas de marketing usadas na promoção e o impacto das obras do realizador americano em quem as via.

Não esquecer que o caroStanley era fotojornalista e realizador de documentários. “Stanley Kubrick: New Perspectives” faz todo o sentido possível porque a cada história, a cada aula que nos dão também nos mostram as imagens que acompanham a lição. Imagens com a assinatura de Kubrick, o mundo como ele o viu e o quis mostrar. Se isto não é um privilégio, não nos lembramos agora do que possa ser.