Inquérito. Trabalhar ainda é coisa para adultos, concluem as empresas portuguesas

Inquérito. Trabalhar ainda é coisa para adultos, concluem as empresas portuguesas


Adequar o ensino português às necessidades das empresas é o principal objectivo. Mas e os jovens?


Para 47 empresas em Portugal, os alunos que frequentam o secundário não estão preparados para dar o salto rumo ao mercado laboral. Cerca de 70% consideram que os jovens têm currículos desajustados e que o seu conhecimento se encontra desalinhado; 80% acham também que os candidatos a um lugar na empresa estão mal preparados para as funções. Oestudo foi feito pelo Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável (BCSD), com a cooperação do HayGroup, tendo o objectivo de entender “de que forma está o ensino português adequado às necessidades de recrutamento das empresas”.

Mas será que os jovens portugueses olham para o mundo dos adultos como um bicho papão? Será que já têm guardado num qualquer documento word do seu computador um currículo pronto a ser enviado às empresas? Diogo Duarte, de 17 anos, aluno do 12.o ano do curso de Ciências e Tecnologias da Escola Eça de Queirós nos Olivais, responde a estas perguntas sem rodeios: “Sinto-me motivado para trabalhar e começar a ser autónomo no plano financeiro.”

No entanto, falta-lhe “bagagem suficiente” para mergulhar de imediato numa carreira profissional. E precisa ainda de ajuda de profissionais “experientes”. Tirando isso está convencido que ainda tem tempo para construir um currículo capaz de impressionar. É por isso que ainda não investiu muito tempo a pensar nesses assuntos. Por enquanto, o mundo dos adultos está distante e as únicas ligações ao mercado de trabalho são as “conversas informais” que vai tendo com o pai. O objectivo, contudo, é começar em breve a “procurar soluções para colmatar esse défice de conhecimento”.

Do outro lado do Tejo, no Barreiro, Madalena Santos, de 17 anos, está perto de terminar o curso de Línguas e Humanidades na Escola de Santo André e tem como meta ingressar numa licenciatura em Comunicação Social.

“Sinceramente não me sinto pronta para trabalhar. Sei que o mercado de trabalho está difícil, mas não tenho muito conhecimento de como funciona esse universo”, admite. A falta de conhecimento resulta da ideia de que ainda não é o momento para se debruçar sobre a carreira profissional. Falta-lhe saber o que quer fazer no futuro. E, tal como Diogo, Madalena ainda não tem um currículo feito, mas acredita que Portugal oferece boas condições de trabalho, mesmo que as primeiras oportunidades estejam no estrangeiro. Sair do país poderá ser uma das estratégias, mas nada a impede igualmente de se candidatar a uma vaga nas cinco áreas profissionais que a BCSD Portugal identificou como as que terão mais falta de mão-de-obra até 2020 (ver texto ao lado).Mas para isso terá de desistir da sua primeira opção.
Em Coimbra estuda uma futura psicóloga forense. Mafalda VilaNova está a terminar o 11.o ano no curso de Línguas e Humanidades da Escola Secundária da Lousã, e pretende tirar uma licenciatura em Psicologia e um mestrado em Psicologia Forense. Já aprendeu que o pragmatismo é a melhor resposta para as hesitações:“Acho que o ensino secundário não nos prepara para o mercado de trabalho.” Para Mafalda, essa falha no sistema de ensino vai “obrigá--la” a prosseguir estudos numa universidade ou num politécnico. Sem currículo, já começou a reunir actividades extracurriculares, como o voluntariado, que, “apesar de não estar directamente relacionado com a área, é sempre uma mais-valia”, acrescenta convictamente.

O desencanto por parte do sector empresarial no inquérito ontem divulgado coincide em parte com o conhecimento que Mafalda tem sobre o mercado de trabalho, mas deixa claro que “o ensino secundário deveria ter uma componente mais prática e não tão teórica”. Contrariamente às convicções desta aluna da Lousã, as conclusões do inquérito dão conta da “grande falta de oportunidades e do elevado número de licenciados com necessidade de trabalhar no estrangeiro”. Madalena não recusa uma oferta de emprego no seu país, desde que tenham para lhe oferecer as condições mínimas para se estrear no mundo dos adultos.

Quando questionados sobre a possibilidade de virem a tornar-se bons líderes – a competência comportamental visada como a mais escassa para os profissionais que participaram no questionário da BCSDPortugal –, os três estudantes responderam, ainda que com alguma hesitação, que o seu grande objectivo é conseguirem estar à altura dos desafios. Resta-lhes aguardar pelas aventuras no ensino superior e esperar que o mundo empresarial esteja enganado em relação a eles.