O problema dos cromos


A reacção das pessoas foi, neste caso, muito negativa, o que deve dar uma indicação clara à produção e à SIC.


Instagram com filtro Amaro e autocolante em Photoshop

Não estou certa de quem disse que nos lembramos mais daqueles que um dia nos fizeram sentir mal, mas penso que existe uma verdade nesta frase. Esta recordação amarga tem efeitos diferentes na vida das pessoas. O mais comum é a neurose, ou o desvio da raiva a uma pessoa para outras ou mesmo para a restante humanidade. Outras querem vingança ou processos em tribunal por danos causados. Outras ainda, as mais afortunadas, esquecem o que um dia sentiram, bem como a existência da pessoa que as fez sentir assim. 

Acontece que o mundo variado que acabo de descrever é de adultos, e não de crianças ou adolescentes. Por muito que os miúdos de hoje em dia saibam mais do que gerações mais velhas quando tinham aquelas idades, não deixam de ser miúdos por isso. Tratar pessoas de 16, 17 ou mesmo 18 anos como adultos é um erro. A vida é, hoje em dia, bastante mais longa – continuando, no entanto, a ser “breve”, uma vez que pode ser abreviada inesperadamente – e, também por isso, não devemos exigir a miúdos que se comportem como crescidos. Devemos, sim, exigir mais dos adultos que lidam com crianças e jovens.

Vem isto a propósito da “polémica” do rapaz ridicularizado com umas orelhas no programa “Ídolos”, na famosa fase dos cromos. Se bem me lembro, esta fase do programa tinha a intenção de divertir os espectadores e os próprios cromos. À medida que o tempo foi passando, a intenção parece ter mudado. Há uma irritação generalizada com aqueles que não têm talento e que, mesmo assim, insistem em participar num programa que procura precisamente aquilo que lhes falta. “Os cromos” passaram a ser repreendidos pelos vários jurados, que os recebem com enfado e tratam mal, para depois serem usados como uma espécie de bombos de uma festa a que, afinal, nunca deviam ter ido. São castigados ou “educados” por pessoas estranhas ao núcleo familiar encarregado de o fazer. 

Talvez por causa do sucesso dos reality shows, que têm audiências porque vale tudo, os concursos de talentos como o “Ídolos” passaram a apostar nesta secção de caricatura, pensando que o público está interessado em ver o próximo a ser humilhado. Acontece que a reacção das pessoas foi, neste caso, muito negativa, o que deve dar uma indicação clara à produção e à SIC do que o público não quer ver.

É desadequado, além de megalómano, criticar “as redes sociais” por empolarem o caso. Em vez de remar contra a maré, há que perceber o que causou tanta impressão e agir sobre isso o mais depressa possível. A maioria das pessoas não gostou do que viu e isto tem um valor quando se trata de televisão e audiências. Por mim, que faço parte da maioria que não gostou do que viu, precisamente por se tratar de um miúdo que não tem a estrutura emocional de um adulto para suportar o gozo difundido a nível nacional, esperava um comportamento diferente de um programa que é de entretenimento, e não o circo romano.

A SIC demorou a reagir e decidiu mal na reacção. Acabou por pedir desculpa, o que pode ser uma precipitação, na medida em que é uma admissão de culpa e abre a porta ao processo judicial. Preferia que os jurados tivessem aparecido de orelhas grandes. Daqui envio um gesto de solidariedade ao concorrente. 

Escreve à segunda-feira 

O problema dos cromos


A reacção das pessoas foi, neste caso, muito negativa, o que deve dar uma indicação clara à produção e à SIC.


Instagram com filtro Amaro e autocolante em Photoshop

Não estou certa de quem disse que nos lembramos mais daqueles que um dia nos fizeram sentir mal, mas penso que existe uma verdade nesta frase. Esta recordação amarga tem efeitos diferentes na vida das pessoas. O mais comum é a neurose, ou o desvio da raiva a uma pessoa para outras ou mesmo para a restante humanidade. Outras querem vingança ou processos em tribunal por danos causados. Outras ainda, as mais afortunadas, esquecem o que um dia sentiram, bem como a existência da pessoa que as fez sentir assim. 

Acontece que o mundo variado que acabo de descrever é de adultos, e não de crianças ou adolescentes. Por muito que os miúdos de hoje em dia saibam mais do que gerações mais velhas quando tinham aquelas idades, não deixam de ser miúdos por isso. Tratar pessoas de 16, 17 ou mesmo 18 anos como adultos é um erro. A vida é, hoje em dia, bastante mais longa – continuando, no entanto, a ser “breve”, uma vez que pode ser abreviada inesperadamente – e, também por isso, não devemos exigir a miúdos que se comportem como crescidos. Devemos, sim, exigir mais dos adultos que lidam com crianças e jovens.

Vem isto a propósito da “polémica” do rapaz ridicularizado com umas orelhas no programa “Ídolos”, na famosa fase dos cromos. Se bem me lembro, esta fase do programa tinha a intenção de divertir os espectadores e os próprios cromos. À medida que o tempo foi passando, a intenção parece ter mudado. Há uma irritação generalizada com aqueles que não têm talento e que, mesmo assim, insistem em participar num programa que procura precisamente aquilo que lhes falta. “Os cromos” passaram a ser repreendidos pelos vários jurados, que os recebem com enfado e tratam mal, para depois serem usados como uma espécie de bombos de uma festa a que, afinal, nunca deviam ter ido. São castigados ou “educados” por pessoas estranhas ao núcleo familiar encarregado de o fazer. 

Talvez por causa do sucesso dos reality shows, que têm audiências porque vale tudo, os concursos de talentos como o “Ídolos” passaram a apostar nesta secção de caricatura, pensando que o público está interessado em ver o próximo a ser humilhado. Acontece que a reacção das pessoas foi, neste caso, muito negativa, o que deve dar uma indicação clara à produção e à SIC do que o público não quer ver.

É desadequado, além de megalómano, criticar “as redes sociais” por empolarem o caso. Em vez de remar contra a maré, há que perceber o que causou tanta impressão e agir sobre isso o mais depressa possível. A maioria das pessoas não gostou do que viu e isto tem um valor quando se trata de televisão e audiências. Por mim, que faço parte da maioria que não gostou do que viu, precisamente por se tratar de um miúdo que não tem a estrutura emocional de um adulto para suportar o gozo difundido a nível nacional, esperava um comportamento diferente de um programa que é de entretenimento, e não o circo romano.

A SIC demorou a reagir e decidiu mal na reacção. Acabou por pedir desculpa, o que pode ser uma precipitação, na medida em que é uma admissão de culpa e abre a porta ao processo judicial. Preferia que os jurados tivessem aparecido de orelhas grandes. Daqui envio um gesto de solidariedade ao concorrente. 

Escreve à segunda-feira