Os eleitores britânicos escolhem hoje o novo governo para os próximos cinco anos nas eleições mais renhidas ou imprevisíveis de sempre. Os analistas e a imprensa não conseguiram fazer previsões sobre o vencedor do escrutínio. Ao longo dos últimos meses, trabalhistas e conservadores estiveram colados nas sondagens. Nos primeiros três meses de 2015, a força liderada por Ed Miliband ganhou vantagem, mas Abril trouxe David Cameron para uma curta liderança. Os principais beneficiados do empate técnico são os três partidos que tentam chegar ao poder através de uma coligação com um dos dois grandes. O Partido Nacional Escocês, os liberais-democratas e o UKIP de Nigel Farage sentem que as suas ideias políticas terão influência no futuro do Reino Unido.
O sistema eleitoral britânico não garante a eleição de parlamentares consoante a percentagem da votação final. Ao contrário do que acontece nos países continentais, o modelo anglo-saxónico não é proporcional. Por exemplo, o UKIP tem 14%, mas só deverá eleger membros para a Câmara dos Comuns, enquanto os liberais-democratas, com 8%, podem garantir 28 lugares no parlamento. A diferença de um por cento entre conservadores e trabalhistas traduz-se em mais cinco parlamentares para o partido do governo. A Câmara dos Comuns tem 650 lugares, sendo necessários 326 para garantir a maioria absoluta. No entanto, como o Sinn Fein não costuma tomar posse, a maioria parlamentar fica em 323. O partido norte-irlandês, tal como o Partido Nacional Escocês (SNP), tem direito a ser representado no parlamento britânico se vencer as eleições na Irlanda do Norte.
O jornal “The Guardian” divulgou uma lista dos círculos eleitorais mais importantes. O diário entende que o futuro de David Cameron como primeiro-ministro depende dos resultados nos círculos de Swindon South, Amber Valley, High Peak, Croydon Central, Stockton South e Lincoln. Se os trabalhistas não conseguirem ganhar lugares aos conservadores em Bedford, Erewash, Weaver Vale, Enfield North, Bury North, o o primeiro-ministro pode ficar mais descansado. Por último, o círculo eleitoral de South Thanet define o futuro de Nigel Farage como líder do UKIP, bem como a sobrevivência do partido. No antigo círculo de Margaret Thatcher, os trabalhistas estão bem posicionados para conquistar oito lugares. Um dos rostos mais importantes dos liberais-democratas deve perder o lugar no próximo parlamento britânico em Inverness, Nairn, Badenoch e Strathspey. Danny Alexander ocupou as funções de parlamentar desde 2005, mas foi secretário principal do Tesouro do último governo britânico, que foi eleito em 2010.
FUTURO A realização de um referendo sobre a manutenção do Reino Unido na União Europeia vai determinar o sucesso do próximo governo. O professor da Universidade de Londres Robert Hazell, revelou ao i que “o referendo sobre a Europa será o principal tema da legislatura porque estabelece uma diferença ideológica entre conservadores e trabalhistas”. O docente entende que “os dois partidos não mostraram divergências durante a campanha”, tendo acrescentado que “ambos defendem a gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde”. O professor da Universidade do Exeter Richard Toye refere que “houve posições distintas em matéria de política externa”.
Os docentes britânicos põem nas mãos dos partidos a estabilidade governativa dos próximos cinco anos. A carga ideológica do novo parlamento britânico depende do jogo de bastidores, que começa a ser desvendado nos discursos dos líderes partidários nesta noite eleitoral. Contudo, a presença de mais partidos com possibilidade de influenciar a aprovação da legislação torna o debate mais abrangente. Robert Hazell considera que, “se for aprovado um referendo, as diferenças ideológicas vão ser mais nítidas”. Richard Toye entende que “o SNP é o único com capacidade para discutir as propostas dos conservadores e dos trabalhistas”. A situação de divisão parlamentar causa preocupação. O docente de Exeter afirma que “é difícil aceitar que este cenário seja bom para os interesses de todos, excluindo o SNP”.
CAMPANHA Os líderes partidários fizeram um último apelo ao voto. David Cameron mostrou confiança numa vitória. Ed Miliband acredita que o público vai fazer um julgamento justo e escolher as propostas do Partido Trabalhista. Nick Clegg reiterou a vontade de ter um papel importante nas negociações para a formação de uma futura maioria. Nathalie Bennett disse que queria os conservadores fora do poder. O UKIP não tem dúvidas que vai obter um resultado histórico. Nicola Sturgeon também realçou a mudança política no Reino Unido.
A imprensa britânica revelou o seu posicionamento neste acto eleitoral. O diário “The Sun” não quer um governo liderado por Ed Miliband com o apoio de Nicola Sturgeon. O “The Times” escreveu um editorial em que apoia a continuação do actual executivo composto por conservadores e liberais-democratas. O “The Express” acrescenta que o UKIP também pode estar ao lado dos partidos que formaram a maioria parlamentar na anterior legislatura. O “Daily Mail” considera que a maioria absoluta dos conservadores é a única forma de preservar a estabilidade governativa até 2020. O editor de política da BBC, Nick Robinson, preferiu fazer uma análise do que se passou na campanha eleitoral a anunciar publicamente a sua orientação. No seu entendimento, a líder do SNP ganhou o estatuto de estrela. Nick Robinson acredita que os liberais-democratas serão beneficiados devido às indefinições dos conservadores e dos trabalhistas. Na pesquisa efectuada não foi possível perceber as orientações do “The Guardian”, “The Telegraph” e “The Independent” para o escrutínio.
TRADIÇÃO A democracia britânica é conhecida pelos seus costumes e tradições parlamentares. As campanhas eleitorais são momentos que fazem inveja a muitos países devido ao contacto dos políticos com a população. As manifestações políticas não se resumem a comícios, jantares e acções de campanha de rua. Os candidatos costumam andar de porta em porta a falar com os seus eleitores, já que trabalham exclusivamente na sua área. No princípio da semana, David Cameron colocou uma fotografia na sua página oficial junto de dois britânicos. O momento seria igual a tantos outros se George Kirby, com 103 anos, e Doreen Luckie, de 91, não fossem os noivos mais velhos do mundo. Os dois idosos têm casamento marcado para o mês de Julho.
O dia da eleição também tem particularidades, que dignificam a mais velha democracia do mundo. Os candidatos reúnem-se todos num local do respectivo círculo eleitoral para serem notificados dos resultados finais. Após a leitura dos números é declarado o vencedor, que recebe os cumprimentos dos adversários e palmas do público presente. As urnas abrem nas primeiras horas do dia, em alguns círculos eleitorais de madrugada, e os resultados são conhecidos ao final da noite.